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A tabela de preços mínimos do frete e as incertezas jurídicas

Certo é que decisões acerca das questões inerentes à tabela de preços mínimos de frete deverão surgir apenas em 2019, de onde se espera que este cenário tenha uma luz positiva para todos os envolvidos na cadeia produtiva.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Atualizado em 7 de outubro de 2019 16:36

No início de maio de 2018 aconteceu a "Greve dos Caminhoneiros", sendo que dentre os objetivos do referido movimento se pautou a exigência por uma tabela de preços mínimos de frete.

Em decorrência da situação, o Poder Executivo editou a MP 832/18, a qual instituiu a "Política Nacional de Pisos Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas", determinando que a ANTT providenciasse a elaboração da dita "Tabela de Preços Mínimos de Frete".

Assim, tão logo instituída a MP 832/18, no dia 30 de maio de 2018, a ANTT por meio da resolução 5820/18, editou a "Tabela de Preços Mínimos do Frete", a qual restou revogada dias após, permanecendo vigente a anteriormente publicada, ou seja, convalidando o ato contido na resolução 5.820/18.

Após o período e trâmite legal, entre propostas de emenda e veto, o Poder Executivo editou a lei 13.703/18, a qual converteu a medida provisória 832/18 em lei.

A legislação é clara ao dispor condições para a validade da "Política Nacional de Pisos Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas", principalmente no que se refere ao disposto no art. 5º da lei 13.703/181, o qual dispôs acerca do método que deverá ser utilizado para a elaboração da Tabela dos Preços Mínimos de Frete, corroborando com o disposto no art. 6 da lei 13.703/18 .

Por sua vez, em 4 de setembro de 2018, a ANTT publicou a resolução 5.827/18, contendo as informações referentes à Tabela de Preços Mínimos do Frete, tendo sido publicada uma nova, por meio da resolução 5.835/18, datada de 5 de novembro de 20182.

Ocorre que nenhuma das tabelas de preços mínimos de frete elaboradas após a vigência da lei 13.703/18 estão de acordo com as normas que disciplinam o método para elaboração de dita tabela de preços mínimos de frete, porquanto não passou por "um processo ter ampla publicidade e contar com a participação dos representantes dos embarcadores, dos contratantes dos fretes, das cooperativas de transporte de cargas, dos sindicatos de empresas de transportes e de transportadores autônomos de cargas".

Além disso, há normas internas da própria ANTT que regulamentam a necessidade de audiência pública para tomada de decisões como as tais, isto por meio da resolução 5.624/17, tendo, portanto, o referido órgão deixado de observar suas próprias normas.

Assim, resta evidente que a ANTT não observou a norma ao instituir a resolução 5.835/18, com alterações na resolução 5820/18 da ANTT, haja vista que não precedeu a atenta leitura da lei, principalmente no que se refere à realização de atos pretéritos para a estipulação da tabela de preços mínimos de frete, contrariando diretamente princípios constitucionais, tais como: da legalidade e da segurança jurídica.

Em que pese toda a situação descrita, estando com uma tabela de preços mínimos de frete constituída em inobservância a própria legislação que determina sua elaboração; em decorrência da lei 13.703/18 tem-se, portanto, que o valor do frete é vinculativo à tabela, devendo este ser remunerado em patamar igual ou superior aos pisos mínimos de frete fixados com base na referida lei, nos termos do art. 4º da lei 13.703/18.

Por outro lado, há expressa vedação legal para a celebração de acordos para estipulação do valor do frete em montante inferior ao estabelecido na tabela de preços mínimos do frete, nos termos do art. 4º, § 2° da lei 13.703/18.

Além do mais, para piorar a situação, a ANTT editou a resolução 5.833, de 8 de novembro de 2018, para instituir sanções ao descumprimento da tabela nacional de preços mínimos do frete.

Logo, factível que se houver qualquer diferença dos valores de frete abaixo da tabela de preços mínimos do frete, toda a cadeia do transporte rodoviário de cargas estarão sujeitas a eventuais penalidades, nos termos da resolução 5.833/18.

Destaque-se que órgãos vinculados ao Governo Federal estão realizando contratações de transporte rodoviário de cargas abaixo da tabela dos preços mínimos de frete, impondo aos contratantes os riscos e ônus inerentes as obrigações assumidas3.

Além de todo o cenário disposto alhures, é evidente que também há discussões acerca da constitucionalidade da MP 832/18, ao argumento de infringência a diversos princípios constitucionais, como os da livre iniciativa, livre concorrência, razoabilidade, proporcionalidade e isonomia, tendo entidades interessadas no assunto promovido ações diretas de Inconstitucionalidade, as quais receberam os 5956 e 5959, cujas estão em tramitação junto ao STF, sob a relatoria do ministro Luiz Fux.

Aqui cabe ressalvar que o ministro Luiz Fux determinou a suspensão de todas as ações que discutiam a eventual constitucionalidade da MP 832/2018, porém, matérias afeitas a observância ao princípio da legalidade ao elaborar as Tabelas de Preços Mínimos de Frete não estão no bojo de discussão das ADI's 5956 e 5959, sendo que alguns Magistrados estão analisando a matéria no que se refere a legalidade da elaboração da dita tabela4.

Acontece que com diante de todo o exposto, o ministro Luiz Fux, por meio de decisão datada de 6 de dezembro de 2018, deferiu medida cautelar para "suspender a aplicação das medidas administrativas, coercitivas e punitivas previstas no § 6º do artigo 5º da lei 13.703/18, por consequência, os efeitos da Resolução da Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) nº 5.833/2018 (DOU 09/11/2018), que estabelece a aplicação de multas em caso de inobservância da tabela vinculativa instituída pela Resolução ANTT 5.820/18, bem como das indenizações respectivas".

Entretanto, passada uma semana de sua decisão, na data de 12 de dezembro de 2018, o próprio ministro Luiz Fux revogou a decisão, retornando a partir de então a eficácia das eventuais sanções a serem aplicadas aos que utilizam do serviço de transporte rodoviário de cargas.

Assim, se vislumbra nitidamente um cenário de incertezas e total insegurança jurídica, trazendo inúmeras consequências, obrigações e eventuais prejuízos para todos os envolvidos na cadeia do transporte rodoviário de cargas, inclusive para a própria economia do país.

Além do mais, o agronegócio que é um dos setores mais importantes para o país e tido como quiçá a força motriz do PIB nacional também está sendo atingindo sobremaneira, inclusive impactando na importação dos produtos.

Logo, evidente que a ausência de segurança nas relações entre os setores produtivo e do transporte rodoviário de cargas já está impactando diretamente no valor dos produtos, vindo a causar impacto também ao consumidor final, por óbvio.

Chegado neste momento, oportunidade que se inicia o recesso forense; certo é que decisões acerca das questões inerentes à tabela de preços mínimos de frete deverão surgir apenas em 2019, de onde se espera que este cenário tenha uma luz positiva para todos os envolvidos na cadeia produtiva.

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1 Art. 5º Para a execução da Política Nacional de Pisos Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas, a ANTT publicará norma com os pisos mínimos referentes ao quilômetro rodado na realização de fretes, por eixo carregado, consideradas as distâncias e as especificidades das cargas definidas no art. 3º desta lei, bem como planilha de cálculos utilizada para a obtenção dos respectivos pisos mínimos.

2 Art. 6º O processo de fixação dos pisos mínimos deverá ser técnico, ter ampla publicidade e contar com a participação dos representantes dos embarcadores, dos contratantes dos fretes, das cooperativas de transporte de cargas, dos sindicatos de empresas de transportes e de transportadores autônomos de cargas.

3 Órgão do governo faz leilão com frete 31% abaixo da tabela da ANTT

4 Decisões dispensam empresas de cumprir tabela de frete.

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*Rafael Vicente Gonçalves Tobias é advogado em Mato Grosso, com atuação nas áreas empresarial e tributária.

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