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A não incidência de IR e CSLL sobre juros de mora e correção monetária de depósitos judiciais e de tributos restituídos ou compensados

Celia Murphy

A discussão é extremamente relevante e versa sobre a definição do conceito de renda.

quarta-feira, 13 de março de 2019

Atualizado em 12 de março de 2019 11:14

A Justiça Federal de São Paulo concedeu liminar para uma rede de cinemas, impedindo a cobrança de Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas - IRPJ e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL sobre juros de mora e correção monetária na devolução de depósitos judiciais e na restituição ou compensação de tributos federais.

Em sua decisão, o juiz considerou que os juros de mora correspondem a uma indenização, que não acarreta acréscimo patrimonial. Também a correção monetária, segundo o Magistrado, nada acresce ao patrimônio; apenas evita uma perda patrimonial. Por esse motivo, nem os juros de mora nem a correção monetária podem sujeitar-se ao IRPJ e à CSLL.

A decisão contraria entendimento de 2013 da 1ª seção do Superior Tribunal de Justiça - STJ, proferida em recurso repetitivo (REsp 1.138.695), de que os juros incidentes na repetição do indébito tributário têm natureza de lucros cessantes e, por isso, não escapam à tributação pelo IRPJ e pela CSLL.  

Em contrapartida, a decisão do Juízo paulista está afinada com anterior posicionamento manifestado pela própria 1ª seção do STJ, em 2007, no REsp 436.302, de que "a correção monetária não traduz acréscimo patrimonial. Sua aplicação não gera qualquer incremento no capital, mas tão-somente o restaura dos efeitos corrosivos da inflação". Desse modo, "não há como fazer incidir, sobre a mera atualização monetária, Imposto de Renda, sob pena de tributar-se o próprio capital".

A discussão é extremamente relevante e versa sobre a definição do conceito de renda.

Para nós, o conceito de renda é constitucional e pode ser construído a partir do artigo 153, inciso III, da Carta da República, que estabelece que compete à União instituir imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza. O legislador infraconstitucional não pode definir como renda aquilo que renda não é.

Tanto a "renda" quanto os "proventos de qualquer natureza" têm natureza idêntica, que é de riqueza nova, incorporada ao patrimônio do seu titular, ao cabo de um período de tempo, depois de deduzidos os gastos necessários para a sua produção.

Na presente hipótese, portanto, é preciso verificar se os juros de mora e a correção monetária se enquadram ou não como renda ou proventos de qualquer natureza. Mas a questão é bastante controversa.

Os juros de mora consistem na indenização pelo retardamento da execução de uma dívida1. O titular só os recebe porque se viu privado de seu capital, e, por essa razão, perdeu oportunidades e prazos, deixando de cumprir obrigações porventura existentes. Os juros de mora vêm, portanto, repor uma perda e, por esse motivo, representam uma indenização por dano emergente. Não podem ser classificados como riqueza nova, eis que nada agregam ao patrimônio do titular. 

O mesmo se pode afirmar quanto à correção monetária, que tem por função evitar a perda patrimonial decorrente da inflação porventura ocorrida durante um determinado período de tempo. Sua obtenção apenas compensa a perda do valor real do principal, corroído pela inflação. Por esse motivo, também não pode ser caracterizada como uma riqueza nova.

Sendo assim, nem a correção monetária nem os juros de mora podem ser considerados renda, porque nada acrescem ao patrimônio do seu titular. Também não podem ser classificados como proventos de qualquer natureza, haja vista que estes têm a mesma natureza da renda, qual seja, a de riqueza nova.

Não obstante, tanto para as pessoas físicas quanto para as pessoas jurídicas, existe legislação passível de respaldar a tributação dos juros de mora. Essa legislação tem sido invocada para fundamentar decisões favoráveis à tributação. No entanto, há que se questionar se esses dispositivos, anteriores à Constituição de 1988, foram por ela recepcionados.

A questão deverá ser objeto de decisão definitiva, a ser proferida pelo STF, em repercussão geral (com efeitos para todos os contribuintes), nos RE 855.091 (IRPF); 1.063.187 (IRPJ e CSLL).

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1 Cf. DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico, v. 3, p. 30.

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t*Celia Murphy é advogada do escritório Fogaça, Moreti Advogados.

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