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Obstáculos para se aposentar

Quando for promulgada e publicada a nova EC, cada trabalhador terá de verificar em qual dos muitos dispositivos está enquadrado, o que não será nada fácil. Primeiro, precisará saber em que sistema está enquadrado (passado, presente ou futuro); depois em que regra de transição posiciona-se, se detém direito adquirido ou se jaz na nova previdência.

segunda-feira, 18 de março de 2019

Atualizado em 15 de março de 2019 14:29

Constituição Federal de 1988 apresentava uma menção previdenciária ao professor; agora esse emérito educador comparece oito vezes. A previdência social era cuidada, então, em dois momentos (arts. 40 e 201) e serão cerca de 40 artigos! Com uma média de seis preceitos (caput, parágrafos, incisos, alíneas e números)!

A maioria dos principais benefícios aparece umas seis vezes num labirinto de Creta impenetrável e inescrutável pelo próprio Dédalo.

Segundo o secretário da Previdência Social do Ministério da Economia nenhum país do mundo tem regras sobre aposentadorias contidas na Carta Magna ("Secretário defende tirar da Constituição regras de benefícios", in Estadão de 28.2.19 - Caderno de Economia p. B-5).

Com as EC 19/9820/9841/0347/0572/13 e 88/15 sucessivas alterações em leis complementares e ordinárias, além de mais de 1000 súmulas e outro tanto de entendimentos administrativos, se as coisas não eram simples para os beneficiários, agora, pelo visto, agora vão complicar bastante.

Quando for promulgada e publicada a nova EC, cada trabalhador terá de verificar em qual dos muitos dispositivos está enquadrado, o que não será nada fácil. Primeiro, precisará saber em que sistema está enquadrado (passado, presente ou futuro); depois em que regra de transição posiciona-se, se detém direito adquirido ou se jaz na nova previdência. Aí, decidir se ainda pode usar a Fórmula 95 e o fator previdenciário e aferir o seu "pedágio".

Todos sabem que calcular o tempo de contribuição, dia a dia, é intrincadíssimo.

Temos um problema à vista; os consultores em previdência social agradecem ao legislador. O Governo Federal deveria publicar uma bem elaborada cartilha a principiantes, em linguagem acessível.

Também tomar conhecimento de coisas distintas:

a) alterações promovidas no texto na Constituição Federal (arts. 40, 42, 201 usque 201-A); e

b) texto da EC (algo como 40 artigos).

A falta de educação previdenciária, a ausência de informações claras e o desconhecimento dos beneficiários deflagram enormes prejuízos.

Dá-se um exemplo concreto desse triste imbroglio, na vigência da legislação atual.

Um segurado teve deferida uma aposentadoria por tempo de contribuição no dia 10 de outubro de 2017.  Antes, trabalhou e contribuiu até a data de entrada do requerimento por 35 anos, atendendo plenamente os demais requisitos legais. Naquele então, não havia exigência de idade mínima para o trabalhador da iniciativa privada (art. 201, § 7º, I).

Durante o período básico de cálculo (que começa em julho de 1994!) sopesado pelo INSS e constante do CNIS da autarquia, sempre recolheu pelo limite da Previdência Social, atualmente de R$ 5.839,45. Entrementes, teve sua renda mensal inicial fixada em R$ 3.329,64 (sic).

Agindo em conformidade com a lei, a instrução do cálculo expurgou os 20% menores salários de contribuição do referido período básico de cálculo (art. 29, I, da lei 8.213/91).

O INSS corrigiu monetariamente os salários de contribuição desse mesmo lapso de tempo (23 anos e 4 meses) e obteve uma média mensal de R$ 4.611,06, significando uma primeira perda em relação aos indexadores utilizados na atualização monetária. 

A partir desse valor médio foi estimado o salário de benefício, e aplicando um fator previdenciário de 0,7221, que refletiu a idade do requerente na data de entrada do requerimento e o seu tempo de contribuição, bem como a sua expectativa de sobrevida.

Daí chegou à mencionada renda mensal inicial, a ser comparação com a base de cálculo das contribuições.

Aplicação da formula 85/95

Com 57 anos de idade e 35 anos de serviço não se beneficiou da lei 13.183/15, que disciplinou a fórmula 85/95.

Somando-se os 57 com 35 obteve 92 pontos e, portanto, não poderia usar esse notável instituto técnico do Regime Geral.

Mas, note-se, apenas um ano e meio depois de 10.10.17 ele teria 58,5 + 36,5 = 95 pontos e receberia 100% do salário de benefício! Mas, possivelmente, ele não sabia disso nem ninguém que tivesse consultado e olha que vige o Prejulgado CRPS 1 obrigando o INSS a orientar o segurado (portaria MTPS  3.286/73).

Redução da renda inicial                                    

A causa da redução da renda mensal inicial que explica uma perda de 27,79% foi devido ao seu fator previdenciário.

Atualmente, nestas condições, pouco poderá ser providenciado para melhorar o valor do seu benefício. Se a correção aplicada estiver certa, e assim tem sido usualmente, ele poderia tentar uma ação judicial, mas receia-se que seja infrutífera. As tentativas de terceiros não frutificam quando a Agência da Previdência Social não comete erro material numérico.

Na verdade, o que sucede há muito tempo é que o limite da Previdência Social (atualmente de R$ 5.839,45) tem sido majorado acima dos níveis da inflação e daí sobrevir a perda aludida que, se ressalte ad nauseam, será um pouco compensada com o fato de que o interessado receberá a renda mensal atual por muito mais anos. E, destarte, não poderá alegar enriquecimento sem causa do INSS.

O fator previdenciário de 0,7221 aplicado a média salarial deveu-se a data de nascimento do titular, conforme fórmula legal da lei 9.876/99, que o classificou como segurado jovem e com alta expectativa de sobrevida (cerca de 31 anos, segundo os dados da Fundação IBGE).

Enfatize-se a filosofia técnica do indigitado fator previdenciário: quem contribui por mais tempo ou tem mais idade recebe mensalidade maior; entretanto, viverá menos o seu otium cum dignitate, de Cícero.

Em suma, realmente o prejuízo havido se deveu em boa parte a um fator previdenciário baixo. Operando com a atual legislação vigente, às portas de grandes modificações, tendo em vista que o STF não acolheu desaposentação, somente lhe restaria a reaposentação.

Ela consiste em requerer uma aposentadoria bem adiante (conforme Proposta de Emenda Constitucional - PEC 6/19), tramitando no Congresso Nacional, nas regras de transição,  incorporando as contribuições vertidas após a aposentação em 2017 e recalculando para mais a renda mensal inicial.

Alertamos para o fato que o INSS não reconhece administrativamente essa pretensão jurídica, mas boa parte da Justiça Federal e da doutrina nacional vem acolhendo a pretensão que, declaradamente não ofende o princípio constitucional do equilíbrio financeiro e atuarial (CF, caput do art. 201).

Será preciso entrar com ação, mas como isso somente seria possível adiante, espera-se que o Supremo Tribunal Federal tenha se debruçado sobre a aludida reaposentação.

E, é bom saber, que para os atuais segurados da "velha previdência", a fórmula 95 e o fator previdenciário serão preservados.

Moral desta história: trabalhar, contribuir, tentar entender a legislação e acompanhar as mudanças que vêm por aí.

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*Wladimir Novaes Martinez é advogado especialista em Direito Previdenciário.

 

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