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Flexibilizar normas e exigências ambientais é mesmo o melhor caminho?

Para quem precisa de tranquilidade e segurança jurídica para crescer, a sensação que se tem é que estamos pegando um caminho bastante esburacado e longo. E mesmo que tiremos todos os radares de velocidade, as condições do asfalto não vão nos dar muita autonomia e rapidez.

segunda-feira, 3 de junho de 2019

Atualizado em 31 de maio de 2019 15:33

O início do novo governo acontece em meio a enormes desafios na área econômica, na geração de emprego e nas inúmeras discussões e polarizações diárias com as quais nos deparamos nas mais diversas áreas.

Na área ambiental não é diferente. O caminho parece ter mudado de direção. Premissas com as quais os órgãos ambientais federais trabalharam ao longo das últimas décadas estão sendo redirecionadas, modificadas. Há uma forte queda de braço entre a cúpula do Ministério do Meio Ambiente e a base dos agentes ambientais federais.

Será que é esse mesmo o caminho?

Eis a pergunta que vale milhões. Duvido que tenhamos essa resposta instantânea.

Primeiro, é preciso frisar que essa modesta reflexão não tem qualquer pretensão de crítica aos novos rumos. Segundo, é preciso reconhecer que havia alguns exageros e visões pouco producentes na busca do desenvolvimento sustentável. No entanto, aqui se pretende uma breve análise que não deixará de ter um olhar globalizado, por mais que isso também pareça não estar na pauta do novo governo.

É preciso compreender que a proteção do meio ambiente no Brasil vai muito além daquela que é promovida pelos órgãos ambientais federais ou de qualquer outra esfera de governo. Há todo um aparato além do Poder Executivo, o qual passa, obrigatoriamente pela atuação do Ministério Público, do Judiciário e, gostem ou não, das organizações não governamentais que se envolvem com o assunto, representando setores da sociedade civil organizada.

Nesse ponto, ao que parece, é que teremos enormes obstáculos para a implementação de uma política ambiental que abandone as premissas das últimas décadas, criadas desde a edição da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981.

A jurisprudência de nossos Tribunais, notadamente do STJ, mas também do STF, há muito consagrou a proteção ambiental como cláusula pétrea constitucional, sempre com interpretações voltadas à preservação do ambiente e fora de sintonia, na maioria das vezes, com os interesses da atividade econômica.

O Ministério Público, então, tem uma visão ainda mais fechada com os princípios de proteção ambiental. E isso se acirra fortemente quando mergulhamos no universo das ONGs.

Então, o que teremos pela frente serão muitos conflitos. Esse aparato vai se opor contra a flexibilização das políticas de proteção ambiental que parecem estar no horizonte. Alguns setores econômicos, inclusive, não estão seguros de que esse é um bom caminho. Até porque ele pode conduzir a instabilidades e a insegurança jurídica: o governo sinaliza um rumo, o Judiciário outro, o Ministério Público outro e as ONGs, muitas vezes, virão na contramão de tudo isso.

Para um País que precisa apaziguar seus ânimos e que necessita de segurança jurídica para destravar o crescimento e abandonar cenários de recessão econômica, essa não parece ser uma boa estrada a seguir.

Até porque, quando se pensa com a cabeça do comprador ou do investidor estrangeiro, certamente, haverá pressão sobre os nossos produtos, imposição de barreiras ambientais em mercados de interesse do Brasil, construção de uma imagem internacional de desrespeito ao meio ambiente, entre outros.

Um exemplo claro disso é o novo dilema que vai se instaurar com relação às reservas legais. O novo Código Florestal chegou em 2012 fazendo concessões justas e importantes nesse tema. Ficamos até 2018 discutindo a constitucionalidade do código, o que foi resolvido ano passado pelo STF. E, agora, quando tudo parecia ter apaziguado a questão, eis que surge no Congresso um novo projeto de lei propondo o fim das reservas ou, ao menos, alterações profundas nesse instituto jurídico.

Para quem precisa de tranquilidade e segurança jurídica para crescer, a sensação que se tem é que estamos pegando um caminho bastante esburacado e longo. E mesmo que tiremos todos os radares de velocidade, as condições do asfalto não vão nos dar muita autonomia e rapidez.

Aqui, na torcida, para que a sensatez impere e as inseguranças minguem.

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t*Evandro A. S. Grili é advogado, sócio de Brasil Salomão e Matthes Advocacia e diretor da Área de Direito Ambiental do Escritório.

 

 

 

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