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Mediação de família: aplicabilidade e benefícios - Da solução da lide e a preservação dos vínculos familiares

Pedro S. F. Martins e Camilla Arruda

A mediação de família, além da solução da lide, visa propiciar que as mudanças nas relações afetivas tenham um desfecho menos doloroso para cônjuges, e sobretudo, preservando os menores, a medida em que devolve aos envolvidos o poder de decisão sobre suas próprias vidas e rotinas, através dos acordos celebrados.

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Atualizado em 8 de agosto de 2019 14:21

É inegável que os métodos adequados de solução de conflitos - MASCs - têm sido tema cada vez mais frequente de diálogos e debates acadêmicos, com vistas a propagar estes instrumentos e sua utilização por toda sociedade civil. Estes métodos, em especial a conciliação e a mediação, foram utilizados no Brasil com alguma visibilidade a partir da década de noventa, passando estes a ter uso e reconhecimento pelo Judiciário a partir dos anos 2000.

Um marco significativo foi o Movimento pela Conciliação, implementado pelo Conselho Nacional de Justiça em agosto de 2006. Este movimento teve por objetivo alterar a cultura da litigiosidade ante a realidade do Poder Judiciário brasileiro, promovendo a busca de soluções para os conflitos mediante a construção de acordos. Como resultado do movimento, dos encontros e debates promovidos resultou no lançamento da Semana Nacional da Conciliação, evento anual que abrange todos os tribunais do país.

Os MASCs são regulamentados por leis e normas, estendo as principais contidas na resolução 125/10 do Conselho Nacional de Justiça, no Novo Código de Processo Civil e na Nova Lei de Mediação, lei 13.140/15. O primeiro dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses. Com esse ato normativo, o CNJ atribuiu ao judiciário a organização de mecanismos consensuais de solução de conflitos como a mediação e a conciliação. O NCPC traz como uma de suas diretrizes a valorização dos MASCs, como sua promoção pelo Estado, e que estes métodos sejam estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive, no curso do processo judicial. Finalmente, a lei 13.140/15 regulamenta a mediação privada como meio de resolução de controvérsias e a mediação no âmbito da administração pública como autocomposição de conflitos.

É de ciência que o Judiciário está em muito sobrecarregado, com resultados apurados pelo CNJ - relatório Justiça em Números - que indica a marca de 110 milhões de processos em tramitação. Não bastante, especificamente para as questões familiares, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE - indicam a proporção de três casamentos para cada divórcio. Aponta-se o divórcio, pois a partir dele devem-se observar as possíveis (e prováveis) ações independentes que podem ser impetradas, como o divórcio em si, alimentos, guarda, e posteriores revisões e exonerações. Todas estas questões podem receber o tratamento pela mediação.

A mediação e a conciliação são ferramentas que podem se expandir a diversos ramos do direito, segundo o Anexo I da resolução 125 do CNJ, que prevê o seu estudo e prática nas diretrizes curriculares nas áreas de direito empresarial, trabalhista, previdenciário, penal (justiça restaurativa) e cível, e dentro deste ao direito de família. Frisa-se neste ponto compreender o porquê da mediação aos conflitos familiares. Conrado Paulino da Rosa nos traz uma explicação de forma bastante clara:

"As disputas familiares, por definição, envolvem relacionamentos que precisam perdurar. A síndrome do perde-ganha dos tribunais provoca um verdadeiro desastre numa família que se desfaz. Sabe-se que o ajuizamento da petição inicial toma a forma de uma autêntica 'declaração de guerra', e o vínculo do ódio, da vingança e da perseguição pode arrastar-se durante anos, dificultando a ambos o refazer da vida em ouras direções, perpetuando a ligação numa estranha forma de fidelidade".

A indicação da mediação se mostra adequada às relações de família pela preservação do vínculo entre os participantes. O mediador visa conduzir para o acordo através das técnicas aplicáveis, escolhidas por este, conforme qual metodologia é mais indicada em cada momento, para possibilitar maior eficiência no alcance dos resultados esperados, sensível com aspectos religiosos, culturais e filosofias de cada um dos envolvidos.

A Mediação de família é um procedimento no qual o mediador, uma terceira pessoa neutra e imparcial, facilita a resolução de conflitos familiares. O condutor da sessão emprega ferramentas específicas da negociação e da mediação para promover e facilitar o diálogo entre as partes, visando então obter um acordo voluntário. O mediador familiar auxilia a comunicação, incentiva as partes a perceber e compreender os possíveis interesses que tenham em comum, e então, trabalha para explorar opções, resolver os pontos controvertidos e impasses.

Importante observar que a mediação de família não é uma forma de aconselhamento ou terapia, ou ser vista com esta finalidade, uma vez que não é apropriado para todas as famílias que enfrentam conflitos. Certas demandas pessoais, mais profundas, são melhores tratadas por outros profissionais especializados, como psicólogos e terapeutas.

No tocante a mediação é importante destacar que trata-se de um procedimento jurídico, que pode dar fim a uma lide (judicializada ou não), sendo uma ferramenta reconhecida como forma de acesso à justiça, e é regida por princípios específicos, tais como a confidencialidade, competência, imparcialidade, neutralidade, independência e autonomia e respeito à ordem pública e às leis vigentes, trazidos no Código de Ética dos Conciliadores e Mediadores.

A sessão de mediação possibilita as partes, além do essencial - comunicação - algumas ferramentas facilitadoras: Os envolvidos podem refletir sobre propostas apresentadas e buscar aconselhamento para tomada de decisões, com o auxílio jurídico e com demais familiares ou pessoas de sua confiança, se assim o desejar; podem interromper a sessão por algum período; também, é possível solicitar uma conversa privada (a critério do mediador ou interessados); e claro, são informados que a mediação é um procedimento voluntário e que não há obrigatoriedade de se chegar a um acordo. Importante observar que, caso o acordo seja obtido, este será submetido ao juízo para homologação.

Por ser um procedimento informal, trabalhado em oralidade, o alcance de uma solução em conjunto percebe-se como empoderador as partes, que se entendem como capazes de resolver suas questões, e consequentemente, se põem mais dispostos em cumprir o acordo estabelecido.

Dessa forma, a mediação de família como método adequado de solução de conflitos oferece vantagens significativas: para o Judiciário, o alívio da judicialização excessiva, e para as partes, uma solução com melhor enquadramento sobre o caso concreto, com melhor analise e elaboração, portanto, mais justa e agradável, e com maior celeridade em relação a um processo judicial. A mediação de família, além da solução da lide, visa propiciar que as mudanças nas relações afetivas tenham um desfecho menos doloroso para cônjuges, e sobretudo, preservando os menores, a medida em que devolve aos envolvidos o poder de decisão sobre suas próprias vidas e rotinas, através dos acordos celebrados.

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*Pedro S. F. Martins é advogado, gestor, conciliador e mediador Judicial Cível e de Família junto ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios - TJDFT. 

*Camilla Arruda é advogada e mediadora Judicial Cível e de Família junto ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios - TJDFT. 

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