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Telecomunicações e inovação - O que esperar em 2020?

2019 foi para o setor um ano muito menos apático do que 2018. Prevemos que 2020 será ainda mais movimentado

sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Atualizado às 11:11

No final de 2018, publicamos no Migalhas um breve diagnóstico do setor de telecomunicações naquele ano e apresentamos as perspectivas para 20191. Agora, nos últimos dias de 2019, olhando para trás, vemos que muito do que se esperava para este ano de fato aconteceu. O PL 79 finalmente foi aprovado e, com a sanção da lei 13.879/19, a Lei Geral de Telecomunicações foi substancialmente alterada. A implementação da lei 13.879/19 depende, em grande parte, de regulamentação. O Plano Nacional de IoT também foi publicado (decreto 9.854/19) e trouxe definições importantes para os agentes deste setor. Na última reunião do Conselho Diretor do ano, a ANATEL aprovou um novo Regulamento de Qualidade, mais adequado à realidade e focado na percepção dos usuários.

A nosso ver, 2019 foi para o setor um ano muito menos apático do que 2018. Prevemos que 2020 será ainda mais movimentado - só a regulamentação da lei 13.879/19 já deve ocupar boa parte das agendas de reguladores, prestadoras, membros da sociedade civil, consultores e advogados, além da realização do tão esperado leilão do espectro 5G. E, para não perder a tradição, apresentamos nosso balanço de 2019 e as perspectivas para 2020.

Balanço 2019

1. Publicação da lei 13.879/19, que altera a Lei Geral de Telecomunicações (lei 9.472/97) para:

(i) possibilitar a migração das concessões de serviço fixo (STFC) para o regime de autorização, com maior flexibilidade nos negócios e clareza quanto à reversibilidade de bens - o saldo decorrente da migração deverá ser aplicado em projetos de banda larga;

(ii) possibilitar a prorrogação sucessiva do direito de uso de radiofrequências e de uso de posição orbital para exploração de satélite brasileiro;

(iii) criar um mercado secundário de espectro, possibilitando a transferência de outorga entre prestadoras;

(iv) eliminar a obrigação de recolhimento de FUST por empresas de radiodifusão.

2. Aprovação do Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações - PERT, contendo:

(i) diagnóstico geral da infraestrutura de telecomunicações do país, com destaque para as deficiências estruturais nas redes de transporte e de acesso que suportam a oferta de acesso à internet em banda larga; e

(ii) relação de projetos capazes de suprir as deficiências identificadas, bem como as possíveis fontes de financiamento para sua realização (saldo da revisão do modelo de concessão do STFC, TACs, editais de licitação de venda e renovação de radiofrequência, desonerações tributárias e FUST).

3. Publicação do decreto 9.854/19, que instituiu o Plano Nacional de Internet das Coisas (IoT). O Plano definiu IoT como a "infraestrutura que integra a prestação de serviços de valor adicionado com capacidades de conexão física ou virtual de coisas com dispositivos baseados em tecnologias da informação e comunicação [...]" e afastou a confusão de IoT com serviço de telecomunicações.

Dentre outras importantes provisões, o decreto ampliou a definição de sistemas de comunicação máquina a máquina (M2M) que podem se valer da desoneração fiscal trazida pela lei 12.715/12, agora estando abarcados pela desoneração tanto os sistemas M2M sem intervenção humana quanto aqueles com intervenção humana. Além disso, a definição foi ampliada de modo a se referir à rede de telecomunicações como um todo, incluindo os dispositivos de acesso. Outrossim, o decreto excluiu da definição de M2M os equipamentos de máquinas de cartão de débito e/ou crédito. Sobre o tema, vale mencionar que, apesar da ampliação do conceito de M2M, as estações de serviços fixos ainda permanecem não alcançadas, já que referência expressa às estações móveis é feita pela lei.

4. Avanço, no Congresso Nacional, do debate sobre a liberação dos recursos do FUST (Fundo de Universalização de Telecomunicações, que arrecada em torno de R$ 1 bilhão anualmente) para diferentes finalidades setoriais, retirando as amarras para seu uso exclusivo na tradicional telefonia fixa, serviço em declínio e fora das expectativas da sociedade. Nos termos da proposta aprovada no último mês do ano pela Câmara dos Deputados, os recursos do FUST poderão ser aplicados na expansão, uso e melhoria da qualidade das redes e dos serviços de telecomunicações para reduzir desigualdades regionais, bem como no uso e desenvolvimento de novas tecnologias de conectividade objetivando o avanço econômico e social. A proposta retorna agora para o Senado para nova votação.

5. Aprovação de uma nova regulamentação de qualidade para os serviços de telecomunicações, mais moderna e focada na percepção dos usuários. Alguns dos indicadores de qualidade, considerados obsoletos ou criticados pelo setor por serem de impossível cumprimento, foram substituídos por indicadores distintos. Diante da convergência das redes de telecomunicações, os indicadores de qualidade deixaram de ser específicos para cada serviço, de modo que uma regulamentação única com os mesmos indicadores possa avaliar a qualidade de todos os serviços de telecomunicações.

6. Discussão de um novo marco de fiscalização regulatória, não mais baseado em regulação de comando e controle - já que os anos nos mostraram que só a imposição de sanções pelo descumprimento de obrigações, particularmente de expressivas multas, não se reverte em benefício do serviço ou dos consumidores, gerando, ao contrário, um ambiente de falta de confiança e alta judicialização -, e mais no diálogo e persuasão (modelo de regulação responsiva), com a consideração de uma gama de estímulos, de modo que diversas questões possam ser resolvidas sem a necessidade de intervenção regulatória, com a caracterização de infrações e a aplicação de sanções sendo realmente medidas de última instância. A proposta ainda segue em debate no âmbito da ANATEL.

7. Reestruturação do mercado de telefonia móvel com a compra da Nextel pela Claro. Diante do aumento do cap de radiofrequências por grupo econômico e waiver quanto às restrições que impediam a transferência das autorizações de uso de radiofrequências entre operadoras, era esperada e natural a movimentação do mercado para uma consolidação. Tanto ANATEL quanto CADE já aprovaram a operação.

8. Edição de um novo Regulamento de Avaliação da Conformidade e de Homologação de Produtos para Telecomunicações, essencial para que o desenvolvimento de novas tecnologias seja realizado com segurança aos usuários e com qualidade para a infraestrutura de telecomunicações do país. Diante das estimativas de que bilhões de novos dispositivos estarão conectados até 2021, especialmente de IoT e M2M, o que deve levar a um aumento significativo na demanda de certificação de produtos de telecomunicações, a ANATEL procurou conferir maior flexibilidade e celeridade ao respectivo processo de avaliação de conformidade.

Perspectivas 2020

1. Regulamentação da lei 13.879/19, com a definição de questões importantes: condições para adaptação das concessões de STFC em autorizações, preço da adaptação e da indenização por bens reversíveis; aplicação da nova lei a contratos vigentes, com a possibilidade de prorrogação das atuais concessões, direitos de uso de radiofrequências, direitos de uso de exploração satelital; dentre outras. A ANATEL divulgou que realizará reunião extraordinária já em janeiro para aprovar os primeiros documentos para consulta pública.

2. Aprovação do Edital do 5G e, quem sabe, realização da licitação ainda em 2020. A ANATEL precisará definir a forma de divisão do espectro, as participações que quer estimular, a infraestrutura que quer ver construída e os investimentos que quer atrair. A definição de como resolver a interferência do 5G nos sistemas satelitais (em outras palavras, quem pagará a conta e quanto custará) também é crucial para a aprovação do Edital.

3. Integração de atividades de telecomunicações e audiovisual, contemporaneidade da lei do SeAC e contornos de ofertas OTT continuam na pauta da ANATEL e do Poder Legislativo. Com o crescimento de ofertas OTT, intensifica-se o debate sobre a necessidade de alteração da lei do SeAC, mediante a desregulamentação dos serviços de TV paga ou a imposição de restrições às ofertas OTT.

4. Celebração dos primeiros Termos de Ajustamento de Conduta - TAC possivelmente com TIM e Algar, com a substituição da obrigação de pagamento de multas administrativas aplicadas pela ANATEL por compromissos de ajustamento das condutas sancionadas e investimentos adicionais para melhoria do serviço prestado.

5. Aprovação da nova lei do FUST pelo Senado, em continuidade à conclusão do seu trâmite na Câmara dos Deputados, finalmente permitindo o uso dos seus recursos para investimentos em redes e serviços de telecomunicações alinhados às necessidades e anseios do País.

6. Aprovação de lei para desoneração tributária das soluções de IoT, principalmente mediante redução ou, quem sabe, isenção do FISTEL sobre dispositivos M2M.

7. Definição da Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial. Diante da abertura de consulta pública pelo MCTIC no último dia 12 de dezembro, com prazo para recebimento de contribuições até 31 de janeiro de 2020, cria-se a expectativa de que seja definida uma política brasileira de Inteligência Artificial (IA). Espera-se que os benefícios da IA possam ser verificados no aumento da competitividade e produtividade, na prestação de serviços públicos, na qualidade de vida da população e na redução das desigualdades sociais.

8. Definição da política nacional de cibersegurança das comunicações, especialmente voltada para a implantação do 5G no país. De acordo com notícias publicadas em novembro, representantes do MCTIC e do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI) trabalham em conjunto na elaboração dessa política, que deverá ser divulgada já no início de 2020.

9. Maior engajamento do governo com vistas a propiciar uso mais eficiente de elementos de infraestrutura passiva (especialmente postes, dutos e torres), indispensáveis no contexto de implantação das redes 5G.

10. Extensão do prazo para conclusão da RJ da Oi: o prazo de 2 anos contados da homologação do Plano de Recuperação se encerra em 4 de fevereiro de 2020, mas a companhia já informou que requereu o não encerramento da RJ. Notícias quanto a uma possível reconfiguração das atividades do Grupo Oi devem continuar surgindo ao longo do ano.

11. Implementação do decreto 10.139/19, que determina a revisão e consolidação dos atos normativos inferiores a decreto, no âmbito da ANATEL e demais órgãos e entidades da administração pública federal. Mesmo antes da edição do decreto 10.139/19, que entrará em vigor em 3 de fevereiro de 2020, a ANATEL já vinha adotando medidas relacionadas à revisão de atos administrativo editados pela Agência, notadamente com vistas à simplificação regulatória (caso da Consulta Pública 49/19, conhecida como a CP da guilhotina regulatória).

12. Discussões quanto à privatização da Telebrás, incluída oficialmente pelo governo no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) para possibilitar a realização de estudos e a avaliação de alternativas de parceria com a iniciativa privada que tragam ganhos de eficiência e resultados para a empresa, com vistas a garantir sua sustentabilidade econômico-financeira.

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t*Ana Claudia Beppu é advogada do escritório Mundie e Advogados, especializada em telecomunicações, mídia, tecnologia e proteção de dados.

 

 

 

t*Beatriz França é advogada do escritório Mundie e Advogados, especializada em telecomunicações, mídia, tecnologia e proteção de dados.

 

 

 

t*Francisco Sampaio é advogado do escritório Mundie e Advogados, especializado em telecomunicações, mídia, tecnologia e proteção de dados.

 

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