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A privacidade em tempos de pandemia

O desafio é entender que sempre quando se está diante de direitos e garantias fundamentais, seja a vida de um lado e a privacidade de outro, deve-se ter cautela ao fazer o juízo de proporcionalidade, já que nenhum princípio deve ser suprimido totalmente.

segunda-feira, 23 de março de 2020

Atualizado às 15:30

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A Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou pandemia de Covid-19 na quarta-feira (11/3), em virtude do crescente número de atingidos e mortes em diversos países. Assistimos a partir daí a evolução mundial da pandemia, ao passo que na segunda-feira (16/3), a OMS voltou a se pronunciar recomendando que se isolem os infectados e que, apesar de não haver evidências claras sobre a manifestação do vírus em crianças, já houve mortes.

Desde o escalonamento de infectados, os governos dos países mais afetados entraram em uma verdadeira corrida contra o tempo para conter o contágio, e consequentemente, as mortes, adotando medidas de contenção e mitigação cada vez mais drásticas.

Nesta corrida, segundo o El País, empiricamente se constatou que a Coreia do Sul, o segundo grande foco mundial da pandemia, agiu rápido ao adotar medidas de controle que até o momento se demonstraram aptas a reverter a tendência de infecções do Covid-19 e é, por isso, um modelo para as demais nações¹.

Para que fosse alcançado este resultado, além de medidas administrativas como a realização de aproximadamente 15 mil testes por dia, totalmente gratuitos e postos de testes "drive-thru", o governo também se utilizou das novas tecnologias para rastrear os casos de pessoas infectadas, a partir da coleda de dados pessoais de geolocalização, histórico de crédito e detecção de sinais do telemóvel, inclusive para monitorar os pacientes ordenados a ficar em quarentena.

No Brasil, vive-se um amplo debate sobre a privacidade de informações pessoais, inclusive no que diz respeito aos impactos da lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), especialmente quanto aos novos procedimentos obrigatórios para resguardar a privacidade e a proteger as informações pessoais. Isto em virtude do grande prejuízo individual e comunitário que pode ser causado pelo tratamento incorreto de dados pessoais para fins ilícitos e discriminatórios.

O desafio é entender que sempre quando se está diante de direitos e garantias fundamentais, seja a vida de um lado e a privacidade de outro, deve-se ter cautela ao fazer o juízo de proporcionalidade, já que nenhum princípio deve ser suprimido totalmente.

Assim, diante da pandemia do Covid-19, cabem às autoridades públicas, ao propor medidas de contenção, especialmente àquelas que fazem uso das novas tecnologias, combinar o resultado útil à menor exposição de informação pessoais dos cidadãos e vigilância governamental indesejada.

No caso da Coreia, por exemplo, segundo a The Wired, as autoridades compartilharam informações sobre os movimentos de pessoas infectadas de modo a identificá-las, provocando linchamentos, fofocas e exposição desnecessária. Além disso, um aplicativo de smartphone tem como finalidade garantir que as pessoas ordenadas à quarentena não saiam de suas casas.

Ainda segundo o The Wired, os aplicativos chineses WeChat e AliPay foram utilizados para atribuir às pessoas marcações para determinar se devem ser colocadas em quarentena ou se movimentar livremente. O problema dessas aplicações é que algumas pessoas alegam que os códigos foram aplicados arbitrariamente ou com base no local de residência².

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1 Espanha e Coreia do Sul, exemplos opostos de controle epidemiológico do coronavírus.

2 Phones Could Track the Spread of Covid-19. Is It a Good Idea?

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*Lucas Souza dos Anjos é acadêmico de Direito na Universidade São Judas Tadeu/SP e colaborador do escritório Cerveira, Bloch, Goettems, Hansen & Longo Advogados Associados.

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