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Senado Federal aprova projeto de lei que põe fim ao voto de qualidade

Daniel Vitor Bellan e Felipe Carreira Barbosa

Texto, que já havia sido aprovado pela Câmara dos Deputados, segue para Sanção Presidencial.

quinta-feira, 2 de abril de 2020

Atualizado às 12:03

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Em sessão virtual realizada no dia 24/3/2020, terça-feira, o plenário do Senado Federal aprovou o Projeto de Lei de Conversão 02/2020, que altera o texto da MP 899/2019 (MP do Contribuinte do Bem) para passar a prever o fim da aplicação do voto de qualidade nos julgamentos realizados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). Segundo o texto aprovado, que já havia tramitado pela Câmara dos Deputados e que, agora, segue para sansão presidencial, o empate de votos nos julgamentos administrativos implicará decisão definitiva favorável ao contribuinte. 

Como se sabe, o CARF, na condição de órgão responsável por julgar, em segunda instância, os processos administrativos tributários federais, possui uma composição paritária entre conselheiros representantes fazendários e conselheiros representantes dos contribuintes. É dizer, todas as suas turmas são formadas por representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes, em igual número. 

Assim, como não haveria de ser diferente, é comum que julgamentos de processos administrativos tributários terminem com empate de votos entre os Conselheiros - especialmente em relação aos temas mais polêmicos no direito tributário. Nestes casos, o artigo 25, §9º do Decreto 70.235/1972 determina, atualmente, que o voto de desempate será proferido pelo Presidente da Turma Julgadora - no caso, sempre um representante da Fazenda Nacional, por determinação do mesmo dispositivo citado. Essa prerrogativa de desempate concedida aos presidentes das Turmas Julgadoras é denominada de voto de qualidade.

Naturalmente, por conta da vivência profissional dos conselheiros representantes da Fazenda Nacional - profissionais cujas carreiras foram dedicadas à defesa dos interesses fazendários - o que se verifica, na prática, é que, na grande maioria dos julgamentos resolvidos pelo voto de qualidade, o resultado da decisão alcançada é contrário aos contribuintes.

Inclusive, é justamente essa prevalência de decisões tomadas pelo voto de qualidade em favor da Fazenda Pública que coloca em cheque a constitucionalidade e a legalidade do mencionado instituto, haja vista macular a igualdade processual que deveria haver entre as partes litigantes. Tanto é assim, que, atualmente, são comuns ações propostas para questionar, judicialmente, o instituto do voto de qualidade - muitas delas, ressalta-se, já com decisões favoráveis aos interesses dos contribuintes.

É este contexto de intenso questionamento do voto de qualidade que alça o Projeto de Lei de Conversão 02/2020 à condição de uma possível grande mudança de paradigma no âmbito do contencioso administrativo tributário federal. Afinal, caso o texto aprovado pela Câmara dos Deputados venha a entrar em vigor, o voto de qualidade deixará de ser aplicado, de modo que a decisão proferida após o empate de votos será favorável ao contribuinte.

Vale pontuar, ainda, que, recentemente, a Câmara dos Deputados já analisou outro Projeto de Lei que pretendia extinguir o voto de qualidade (PL 6064/16). De todo modo, naquele caso, o texto discutido ainda previa a possibilidade de a PGFN levar ao judiciário as decisões favoráveis aos contribuintes decorrentes do empate de votos - medida esta que foi bastante criticada por diversos advogados e contribuintes, não avançando em suas tramitações legislativas.

Ocorre que, de forma diversa do que previa a PL 6064/16, no texto do Projeto de Lei de Conversão 02/2020, não há qualquer menção à possibilidade de a Fazenda Pública questionar, em juízo, as decisões que lhe forem contrárias no âmbito do CARF, o que, evidentemente, leva à conclusão de que virão a ser definitivas as decisões que, por conta do empate de votos, venham a ser favoráveis aos contribuintes.

Assim, após a aprovação do Projeto de Lei de Conversão 02/2020 no Senado Federal, o texto proposto seguirá para eventual sanção presidencial. Cumpre, então, aguardar apenas mais essa etapa do trâmite legislativo para que se possa verificar uma verdadeira mudança de paradigma no contencioso administrativo tributário pátrio.

Segue, no que interessa, o texto da proposta:

Art. 2º A Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, passa a vigorar com a seguinte alteração:
"Art. 19-E. Em caso de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, não se aplica o voto de qualidade a que se refere o § 9º do artigo 25 do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte." (NR) 

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*Daniel Vitor Bellan é sócio da área de Contencioso Administrativo Tributário do Escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri Advogados. Mestre e Doutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Professor no Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBDT. 

*Felipe Carreira Barbosa é advogado da área de Contencioso Administrativo Tributário do Escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri Advogados. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP.

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