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Dispute Board: uma forma alternativa de resolução de disputas

A resolução de demandas fora do âmbito judicial e arbitral deve ganhar vez e voz, seja pela maior velocidade de resposta ou pela possibilidade de se chegar a soluções mais equânimes, permeadas por uma relação ganha-ganha.

terça-feira, 28 de abril de 2020

Atualizado às 11:53

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Seguindo uma tendência decorrente do processo de transformação social provocado pela Quarta Revolução Industrial e potencializado pela recente pandemia do coronavírus, a resolução de demandas fora do âmbito judicial e arbitral deve ganhar vez e voz, seja pela maior velocidade de resposta ou pela possibilidade de se chegar a soluções mais equânimes, permeadas por uma relação ganha-ganha.

Em meio a este cenário, mediação, conciliação e Dispute Boards passam a ter maior destaque, pois são formas alternativas de solução de controvérsias, devendo inclusive ter seu uso incentivado pelo Judiciário, conforme o §3º do art. 3º do CPC: "§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial".

Especificamente sobre o Dispute Board, ele nada mais é do que um mecanismo extrajudicial de resolução de disputas utilizado em contratos de prestação continuada, de média e longa duração, instrumentalizado por um Comitê de profissionais imparciais que emitirão recomendações e/ou decisões sobre dada matéria e com base nos fatos e documentos apresentados.

Originalmente e no Brasil, sua utilização foi difundida em contratos públicos, especialmente nos de concessão e parcerias público-privadas, cujas leis preveem o emprego de mecanismos privados para endereçamento de disputas decorrentes ou relacionadas ao documento firmado.

Em âmbito federal não existe uma regulamentação específica sobre Dispute Boards, sendo que tramitam os PLs: (i) 9.883/18, na câmara dos Deputados, que trata sobre o uso dos Comitês de Resolução de Disputas em contratos administrativos; e (ii) o PLS 206/18 no Senado Federal, cujo regulamenta o uso de Dispute Boards em contratos administrativos continuados e celebrados pela União. Especificamente no município de SP foi editada a lei 16.873/18, que reconhece e regulamenta a instalação de Comitês de Prevenção e Solução de Disputas em contratos administrativos continuados e celebrados pela prefeitura de SP.

Contudo, nada inibe que tais Comitês sejam utilizados em contratos privados. Pelo contrário, o CC garante a autonomia da vontade, devendo o instrumento contratual dispor e regrar sobre a implementação, funcionamento e poder vinculante das deliberações que forem tomadas pelo Dispute Board.

A propósito, o Comitê pode ser formado ad hoc, ou seja, apenas para definição de uma questão em caráter pontual, desfazendo-se na sequência; ou ter existência permanente ao longo de toda a vigência negocial, acompanhando-a, inclusive com a realização de reuniões periódicas e recepção de documentos, permitindo que os componentes da Comissão monitorem o andamento da avença. Como dito, vale a autonomia da vontade privada (art. 425, CC), obviamente regida pela boa-fé contratual, devendo o contrato fixar as diretrizes de funcionamento de tal órgão.

Ademais, é importante que a avença defina o regramento aplicável aos processos em trâmite no Comitê, seja valendo-se de Regulamentos das Câmaras de Mediação e Arbitragem que atuam com Dispute Boards; ou então dispondo sobre a operacionalização e funcionamento da Comissão, fixando, além da periodicidade do funcionamento, o número de membros e a forma de substituição destes, o cronograma de trabalho, a forma e as condições de instalação, o meio de deliberação sobre os conflitos instaurados, bem como os prazos para respostas a questionamentos ou disputas e o caráter cogente ou não do que for decidido. O ideal é não deixar cláusulas abertas que deem margem a dúvidas, pois isso pode prejudicar o enforcement desta forma alternativa de solução de contendas.

Além disso, necessário definir o papel do Dispute Board em dado relacionamento contratual, existindo três hipóteses:

a) Comitê de Revisão (Dispute Review Board), o qual emite recomendações não vinculantes;

b) Comitê de Adjudicação (Dispute Adjudication Board), que exara decisões obrigatórias e de cumprimento imediato; ou

c) Comitê híbrido (Combined Dispute Board), que pode tanto lançar recomendações, como comandos.

Com efeito, cada relação contratual é única e tem as suas particularidades, onde deve ser avaliado o papel do Dispute Board como meio de resolução de conflitos, que deve ser um aliado na economia de tempo e recursos, e não apenas uma obrigação prévia a ser cumprida antes da judicialização, pois dessa maneira perde sua razão de existir.

Portanto, regras claras e objetivas dão o tom da utilização desta possibilidade legal e contratual.

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*Paolla Ouriques Cruz é advogada no escritório Ouriques Cruz Advocacia Empresarial.

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