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Walter Ceneviva - conselheiro da AASP visto por um companheiro de Conselho

José Reynaldo Peixoto Souza

A lembrança que fica é do homem culto e simples, descomplicado, agradável, bondoso e amigo com quem tive o privilégio de conviver.

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Atualizado às 07:51

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Por ter convivido com Walter Ceneviva no Conselho da AASP, recebi o convite do presidente Antonio Ruiz para escrever algo a ser publicado nessa Revista do Advogado dedicada a Walter Ceneviva.

Concordei porque me sinto honrado em homenagear o amigo, e especialmente para prestar um testemunho carregado de boas recordações, a despeito de nossa convivência mais próxima ter durado apenas um ano.

Walter Ceneviva foi conselheiro nos triênios 1975-1977 e 1978-1980, e, no último ano do segundo mandato, ocupou a vice-presidência da Diretoria encabeçada por Miguel Reale Júnior.

Já eu vinha substituindo ocasionalmente no Conselho, desde 1974 a 1977, até ser eleito para o primeiro mandato iniciado em 1980, a que se seguiriam dois outros, até 1988, sendo o primeiro a ser alcançado pela salutar disposição estatutária que passou a limitar a permanência nesse órgão, garantindo a constante renovação da representação da advocacia militante, com preservação dos ideais que se perpetuam desde a sua fundação em janeiro de 1944.

Em 1980, o Conselho era integrado também por Alcyr de Toledo Leite, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, Arnaldo Malheiros Filho, Briand Collin Ferreira, Carlos Alberto Hernández, Flávio Flores da Cunha Bierrenbach, Jayme José Martos Cueva, Joaquim Pacheco Cyrillo, José Carlos da Silva Arouca, José Edmur Vianna Coutinho, Luiz Olavo Baptista, Márcio Fernandes, Maria Eugênia Raposo da Silva Telles, Miguel Reale Júnior, Rubens Ignacio de Souza Rodrigues, Ruy Homem de Melo Lacerda, Salim Arida e Sérgio Marques da Cruz.

Nas reuniões das quartas-feiras pela manhã, discutiam-se, principalmente, as propostas legislativas, nas esferas federal, estadual e municipal, que pudessem ter interesse imediato ou mediato para o exercício da advocacia ou aperfeiçoamento da ordem jurídica nacional, com vistas a oferecer manifestação ao órgão em que a iniciativa se encontrava em processamento.

O resultado, fundado no parecer ou pareceres dos membros do Conselho, consistia, como consiste até hoje, em manifestação da AASP, sem destaque ou menção do autor do parecer que a informa. Votada a matéria e deliberada a manifestação, não é o seu autor identificado ou destacado. A manifestação é da Casa. Apenas a instituição é que se manifesta, o que constitui uma marca importantíssima da AASP.

Todavia, internamente e sem conhecimento do público, cada conselheiro dá o melhor de seu conhecimento e experiência nas matérias objeto de debate, sempre observando os objetivos da associação.

As discussões versavam todos os ramos do Direito, além dos problemas relacionados com o exercício da profissão, sendo certo que o colegiado contava, como sempre contou e ainda conta, com advogados experientes em todos eles. Do elenco acima apontado, constavam importantes profissionais voltados para o Direito Público, Direito Privado, Penal, Trabalhista e Previdenciário, servindo nas diversas comissões.

Ceneviva, bacharel da Turma IV Centenário da São Francisco (1954), consultor geral da República em 1961 - na curta presidência de Jânio Quadros -, especialista, mestre em Direito Civil pela Faculdade Paulista de Direito da PUC (1978) e regente da Cadeira de Direito Civil na mesma faculdade, naturalmente brilhava nas discussões versando a sua especialidade, mas também em Direito Comercial, Direito Processual Civil, Direito Administrativo e Constitucional.

Recordo-me das discussões sobre Direito de Família, em que esgrimia com Walter Maria Laudísio e Sérgio Marques da Cruz; sobre Locação, dialogando com Muca (José Edmur Vianna Coutinho) e Rubens Ignacio de Souza Rodrigues; ou ainda em matéria Comercial, hoje Empresarial, com Jayme Cueva, Joaquim Pacheco Cyrillo, Márcio Fernandes, Briand Collin Ferreira e também Sérgio Marques da Cruz. Sobre Direito Constitucional e Administrativo, dialogava com Ruy Homem de Melo Lacerda, Maria Eugênia Silva Telles e Flávio Bierrenbach. Não deixava de abordar temas de Direito Penal, em que pontificavam Miguel Reale, Antônio Cláudio, Flávio Bierrenbach e Salim Arida; ou Trabalhista e Previdenciário, que tinha como representantes Arouca e Alcyr de Toledo Leite. As questões atinentes à advocacia (nelas compreendidas as discussões de Direito Processual Civil, Penal e do Trabalho) e valorização profissional envolviam todo o Conselho.

Suas intervenções, fundadas em boa doutrina e fruto da prática da advocacia e da docência, eram sempre precisas e agradáveis, porque, além do conteúdo jurídico, eram acompanhadas de pitadas de fino humor, sempre procurando destacar algo bom, sem deixar de fazer juízo crítico sobre a matéria em exame.

A dicção perfeita do antigo locutor de rádio (speaker) da BBC e da Rádio Gazeta, a par da clareza de raciocínio, objetividade e simplicidade - ou melhor - descomplicada linguagem, afastada do juridiquês, fluente e envolvente, provocava e provoca nossa admiração.

Se o anonimato imposto pela regra de ouro da Associação impedia que o público pudesse conhecer o brilho do conselheiro no exercício de sua atividade no colegiado, é certo que há uma colaboração pública que corrobora o que digo sobre o nosso homenageado.

Exatamente em 1980 foi criada a Revista do Advogado e todos os conselheiros integravam o seu Conselho Editorial.

O propósito era e é de dar aos associados, por meio de uma revista temática, uma contribuição prática e de qualidade sobre as matérias tratadas pelos colaboradores convidados.

E o primeiro Conselho de Redação da Revista foi integrado por Luiz Olavo Batista, Miguel Reale Júnior, Márcio Fernandes e Walter Ceneviva, que, mesmo depois de findo seu mandato, continuou a colaborar por meio de artigos oportunos e de conteúdo prático, sem perda da qualidade técnica doutrinária.

Pesquisando os primeiros números da revista, constata-se a versatilidade do nosso homenageado.

Exemplificando citam-se: "Negócio imobiliário e suas cautelas básicas" no número 4 (janeiro a março de 1981); "O modelo jurídico para a empresa no Direito Societário brasileiro . As sociedade de pessoas e as de capital" no número 5 (abril a junho de 1981); "O casamento e os registros públicos" no número 6 (julho a setembro de 1981); "Obrigações do acionista controlador - Direitos e deveres" no número 8 (janeiro a março de 1982) e "Introdução aos contratos comerciais" no número 9 (abril a junho de 1982).

Nesses artigos encontramos o mesmo estilo da sua obra mais conhecida e de uso obrigatório por quantos tenham de enfrentar as questões de matéria registral: Lei dos Registros Públicos Comentada, cuja primeira edição data de 1979 e que já passa da 20ª edição.

Embora posterior ao período a que me refiro, não é possível deixar de lembrar o seu Direito Constitucional Brasileiro, de 1991, em que enfrenta os temas, como me disse ele na época, daqui e de agora, atento às peculiaridades de nossas instituições e nossa sociedade, sem remissões a direitos de outros povos.

Outros certamente falarão melhor e com mais propriedade.

A lembrança que fica é do homem culto e simples, descomplicado, agradável, bondoso e amigo com quem tive o privilégio de conviver.

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tO artigo foi publicado na Revista do Advogado, da AASP, ano XXXX, nº 145, de abril de 2020.

 

 

 

 

 

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*José Reynaldo Peixoto Souza é advogado. Desembargador aposentado do TJ/SP. Ex-conselheiro da AASP.

Associacao dos Advogados de Sao Paulo

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