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Proteção às mulheres contra a violência doméstica na pandemia

No Brasil, mulheres vítimas de violência doméstica podem, desde o começo de abril, registrar boletins de ocorrências pela internet em estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Distrito Federal.

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Atualizado às 10:50

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Forma mais responsável de impedir a contaminação pelo coronavírus, o isolamento social tem seus efeitos colaterais não apenas na economia, mas também na segurança pública. O local mais perigoso para mulheres que sofrem com a agressividade de seus parceiros é o lar.

Um levantamento divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2019, apontou que 16 milhões de mulheres com mais de 16 anos sofreram algum tipo de violência no Brasil, a maioria delas em casa. Durante a quarentena, o problema da violência doméstica se agravou.

Segundo informações da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, os pedidos de socorro vindo de dentro de casa aumentaram 20% entre dos dias 20 de março e 13 de abril.  No Rio de Janeiro, houve um crescimento de 50% no número de casos registrados no plantão judiciário da cidade no primeiro fim de semana de isolamento. As informações preliminares do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos constatou alta de quase 9% nas denúncias realizadas no Disque 180.

O aumento da violência doméstica não aconteceu somente no Brasil. A Organização das Nações Unidas denunciou um "crescimento horrível da violência doméstica em nível global" durante a quarentena e pediu aos governantes proteção às mulheres em seus planos de combate à covid-19. Do Vaticano vieram apelos semelhantes.

A Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e Empoderamento da Mulher noticiou, no dia 7 de abril, que autoridades, ativistas e membros  da sociedade civil da Argentina, Canadá, França, Alemanha, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos têm reportado aumento na demanda por abrigos de emergência e nas denúncias de agressões contra mulheres. Por sua vez, Singapura e Chipre, vivem um crescimento de 30% em chamadas na linha de apoio às vítimas. Na Austrália, a procura por socorro foi elevada em 40%, o que comprova que a violência contra a mulher como uma questão generalizada.

Os dados são alarmantes e não temos previsão do afrouxamento no distanciamento social, única ação eficaz contra o coronavírus. Advogados e operadores jurídicos devem manter-se alertas para atuarem como protetores dos direitos das mulheres. É imperioso que governos, institutos da sociedade civil e iniciativa privada encontrem alternativas para prestar ajuda às vítimas e conter os casos.

Na Argentina, uma ação entre a Confederação Farmacêutica e o governo criou um código para cidadãs pedirem ajuda na hora de ligar para a farmácia. A mulher deve fazer por telefone um pedido de uma máscara vermelha, essa será uma senha para que o atendente preste ajuda. A orientação é que ele diga que o produto não está disponível e pegue os dados da mulher que ligou, para repassá-los a "Linha 144", número do governo que presta atendimento em casos de agressão doméstica.

A França anunciou no começo do mês de abril que pagará quartos de hotel para vítimas de violência doméstica e abrirá centro de aconselhamentos. Na primeira semana de quarentena, o acréscimo foi de 30% em Paris e 32% no resto do país.

Na Itália, a alternativa foi um aplicativo que funciona 24 horas. Em Portugal, foi criado um SMS apenas para casos de violência doméstica durante a pandemia e, em 5 dias, o canal recebeu 41 pedidos de ajuda.

No Brasil, mulheres vítimas de violência doméstica podem, desde o começo de abril, registrar boletins de ocorrências pela internet em estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Distrito Federal.

Os boletins de ocorrência de violência doméstica passam por uma triagem e são encaminhados à Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) da região onde ocorreu o fato, assim como os demais casos registrados pelas delegacias eletrônicas. Nas cidades que não contam com uma DDM, a ocorrência será direcionada a uma delegacia territorial correspondente à residência da vítima. Ficam os delegados e delegadas responsáveis por providenciar as diligências e perícias necessárias.

No começo do mês de abril, o Governo Federal lançou nova plataforma de violência doméstica. O aplicativo Direitos Humanos BR servirá como alternativa ao "Ligue 180", voltado para mulheres em situação de violência, e ao "Ligue 100", para casos de violações de direitos humanos.

Existem ainda canais não oficiais de denúncias, como o Mapa de Acolhimento, um site que oferece ajuda psicológica ou jurídica de profissionais voluntários. Ou o aplicativo PenhaS, criado pelo Instituto AzMina, onde é possível acionar um "botão de pânico", que avisa até 5 pessoas conhecidas sobre um caso de emergência, via mensagem SMS. Essas vítimas podem também dialogar de modo anônimo, com outras usuárias.

Lançado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, o projeto "Carta de Mulheres" auxilia as vítimas de violência doméstica ou qualquer pessoa que queira ajudar uma mulher vítima de violência através de um formulário on line. Quem responderá as questões são profissionais na Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário (Comesp). O projeto foi inspirado em ação semelhante da Justiça peruana, que tem o mesmo nome - Carta de Mujeres.

Os especialistas orientam também sobre o atendimento adequado com delegacias, casas de acolhimento, Defensoria Pública, Ministério Público e diversos programas de ajuda de instituições públicas ou organizações não governamentais.

Também durante a pandemia, o Instituto Avon lançou a campanha #IsoladasSimSozinhasNão. A iniciativa, endossada por todos os países da América Latina onde o grupo Natura opera (do qual a Avon faz parte), tem como objetivo mobilizar a sociedade para enfrentar a violência doméstica contra as mulheres, meninas e crianças e ampliar a mensagem de prevenção.

Nas redes sociais da Avon e da Natura, a hashtag #IsoladasSim SozinhasNão virá acompanhada de materiais sobre saúde mental, prevenção, rede de apoio e canal de denúncias. Além disso, o Instituto Avon tem articulado organizações da sociedade civil, empresas públicas e privadas e órgãos públicos no Brasil para apoiar as mulheres durante a crise, oferecendo alimentação, apoio psicológico e jurídico, abrigo e outras medidas.

Num momento tão trágico como esse, é necessário divulgar e apoiar iniciativas como as citadas acima. Além disso, devemos seguir cobrando as autoridades por mais ações e investimentos que protejam a mulher. Precisamos que nos mantenhamos unidos e solidários para combater não apenas essa pandemia, mas a violência persistente conta as mulheres.

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*Renata Mariz de Oliveira é advogada da Advocacia Mariz de Oliveira.

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