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Acordo de não persecução penal: Direito subjetivo do inculpado (?)

O "acordo de não persecução penal" dispôs que não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal.

quinta-feira, 28 de maio de 2020

Atualizado em 29 de maio de 2020 09:59

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Nos idos de 1995, o Direito Penal e processual penal brasileiro foi varrido por novos ventos ante a introdução, no universo jurídico nacional, da possibilidade de resolução de algumas contendas de ordem penal antes de sua propositura1, assim como, após o oferecimento da denúncia, a interrupção de seu curso, sem admissão da culpa, mediante o cumprimento de condições2.

Mas a novel lei 13.964, de dezembro de 2019, trouxe ao universo penal e processual pátrio um novo instituto, semelhante ao existente nos países da common law3, estranho à filosofia autoritária, de origem fascista, na qual foi concebido o Código de Processo Penal brasileiro4, e que avança consideravelmente em comparação aos institutos da conciliação, da transação penal e da suspensão condicional do processo.

O "acordo de não persecução penal" - ANPP - estabeleceu suas diretrizes no art. 3º do referido normativo legal, onde acrescentou à redação do art. 28 do CPP, o art. 28-A, dispondo que não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, estabelecendo a necessidade de se verificar que a medida se mostra como necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Nos seus incisos de I a V, estabelece as condições que podem ser aplicadas cumulativa ou alternativamente.

Prevê ainda, em seu parágrafo 2º, em quais hipóteses afasta-se a possibilidade de concessão.

O significado prático disto é que na iminência da denúncia, e não se tratando de situações onde os benefícios gestados na Lei dos Juizados Especiais possam ser aplicados, resta alternativa a quem está por ser alvo de acusação formalizada, sem a necessidade de submissão ao penoso processo penal.

Como se discorrerá na sequência, reconhecida a autoria/participação ematividade criminosa, admitindo-se o ilícito penal e aceitas as demais condições propostas pelo MP, será prolatada sentença homologatória pelo Juiz, passando-se à fase de execução do acordo, ao encargo do Ministério Público perante o juízo e execução penal5. Contudo, a nova regulamentação não ensejou análise interpretativa tão pacífica, já se observando diversas celeumas a resolver6.

Todavia, o enfoque deste artigo não é análise dessas diferentes correntes ou mesmo de sua aplicação no direito intertemporal (quanto a isso já existe vasta produção acadêmica), e sim a intenção de examinar e buscar os adequados efeitos da afirmação de ser possível ao MP propor o acordo.

Afinal, trata-se de uma faculdade do Promotor de Justiça ou de um Direito subjetivo do inculpado?

O raciocínio inicial deve considerar quais os requisitos estabelecidos pela lei para se cogitar do benefício.

Eles partem do pressuposto de que não se trata de caso que enseje arquivamento, isto é, existem condições de oferecimento da denúncia, uma vez que há a presença de prova material (em se tratando de crime material), indícios suficientes de autoria (ou participação), aparência de ilícito penal, não se verificando a presença de causas extintivas da punibilidade, circunstâncias eximentes de pena ou excludentes de ilicitude.

Para ler o artigo na íntegra clique aqui.

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1 Art. 72 a 74, que tratam da conciliação, e art. 76 e §§, que tratam da transação penal, todos da lei. 9.099/26.09.95

2 Art. 89 e §§ do mesmo diploma legal.

3 "O plea bargaining é instituto de origem na common law e consiste numa negociação feita entre o representante do Ministério Público e o acusado: o acusado apresenta importantes informações e o Ministério Público pode até deixar de acusá-lo formalmente". (GOMES, Luiz Flávio. O que se entende por plea bargaining. JusBrasil. Disponível clicando aqui. Acesso em 23 de maio de 2020.

4 "O Código de Processo Penal de 1941 deita raízes notoriamente autoritárias, pois foi inspirado na legislação processual penal italiana (Código Rocco) que vigia nos anos de 1930, época do regime fascista liderado por Benito Mussolini. Com efeito, tal texto normativo " [.] foi parido sob a égide de um outro momento sociopolítico e de estrutura altamente autoritária, além de mal construído tecnicamente", cfe. CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 5, citado por KNOPFHOLZ, Alexandre. A necessária - e já tardia - constitucionalização do processo penal. Artigos Direito Criminal (Escritório Professor René Dotti). Disponível clicando aqui. Acesso em 23 de maio de 2020.

5 Art. 28-A, § 6º do CPP, com a redação da lei 13.964/19.

6 Aury Lopes Júnior e Higyna Josita deixaram isto bastante claro no artigo Questões polêmicas do acordo de não persecução penal (ConsultorJurídico), acesso em 23 de maio de 2020, ao elencar os seguintes questionamentos: 1ª) Cabe ANPP para processos em curso na data da entrada em vigor da lei 13.964/19, com denúncias já recebidas, mas sem sentença prolatada? 2ª) Cabe ANPP aos processos de ação privada? 3º) Quando a fração da causa de aumento ou de diminuição a incidir sobre o mínimo da pena em abstrato for variável, aplica-se a maior ou a menor fração para aferir se o agente faz jus ao ANPP? 4º) Em caso de descumprimento do ANPP, a confissão feita pelo investigado poderá ser usada contra ele durante o curso do processo que a caso venha a surgir?

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t*Jorge Henrique Schaefer Martins é advogado pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal, mestre em Ciência Jurídica, ex-desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, sócio do escritório Ferreira & Schaefer Martins Advogados.





t*Jorge Henrique Goulart Schaefer Martins
é advogado pós-graduado em Direito Processual Civil, sócio do escritório Ferreira & Schaefer Martins Advogados.

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