MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. As cotas preferenciais, sem direito a voto, nas sociedades limitadas

As cotas preferenciais, sem direito a voto, nas sociedades limitadas

A IN 81/2020, do Departamento de Registro Empresarial e Integração pôs o fim à discussão: é possível fixar cotas preferenciais, sem direito a voto, nas Sociedades Limitadas.

sexta-feira, 19 de junho de 2020

Atualizado às 08:09

t

Inicialmente, a IN 38/2017, do Departamento de Registro Empresarial e Integração permitiu às Sociedades Limitadas a emissão de cotas preferencias - Anexo II, item 1.4, II, alínea "b", do Manual de Registro de Sociedades Limitadas:

1.4 REGENCIA SUPLETIVA DA LEI 6.404/76 (LEI DAS SOCIEDADES ANO^NIMAS)

O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima, conforme art. 1053, parágrafo único do Código Civil.

Para fins de registro na Junta Comercial, a regência supletiva:

I - poderá ser prevista de forma expressa; ou

II - presumir-se-á pela adoção de qualquer instituto próprio das sociedades anônimas, desde que compatível com a natureza da sociedade limitada, tais com:

a) Quotas em tesouraria;

b) Quotas preferenciais;

c) Conselho de Administração; e

d) Conselho Fiscal.

Todavia, sempre houve muita discussão quanto a essas quotas preferenciais na Sociedade Limitada, especialmente quanto à questão do direito ao voto, pois apesar do Código Civil admitir a existência de quotas desiguais (art. 1.055), parte da doutrina entendia que essa desigualdade dizia respeito apenas ao valor das quotas, no sentido de não ser possível restringir o direito a voto ao cotista da Sociedade Limitada.

Todavia, para dirimir a controvérsia, foi recentemente editada a IN 81, de 10 de junho de 2020, na qual o Departamento de Registro Empresarial e Integração previu expressamente, no item 5.3.1 do Anexo IV - Manual de Registro de Sociedade Limitada, a possibilidade de quotas preferenciais (sem direito a voto) nas Sociedades Limitadas:

5.3.1. Quotas preferenciais

São admitidas quotas de classes distintas, nas proporções e condições definidas no contrato social, que atribuam a seus titulares direitos econômicos e políticos diversos, podendo ser suprimido ou limitado o direito de voto pelo sócio titular da quota preferencial respectiva, observados os limites da lei 6.404, de 1976, aplicada supletivamente.

Havendo quotas preferenciais sem direito a voto, para efeito de cálculo dos quoruns de instalação e deliberação previstos no Código Civil consideram-se apenas as quotas com direito a voto.

Dessa forma, agora é expressa a autorização para que os sócios de uma Sociedade Limitada estipulem quotas distintas, podendo suprimir ou limitar o direito a voto, mas respeitando os limites da Lei das S.A.'s (lei 6.404/76).

Em regra, as quotas preferenciais são aquelas que conferem aos seus titulares vantagens patrimoniais e/ou privilégios especiais não atribuídos às demais quotas, acompanhadas, na maioria das vezes, de restrições ao direito de voto.

A nova IN também deixou claro o efeito da quota preferencial nos quóruns de votação da Sociedade Limitada: em havendo quotas preferenciais sem direito a voto, deve-se considerar apenas o capital votante, tanto para a instalação quanto para a deliberação, a exemplo do que já determina a lei 6.404/76.

A evolução normativa vem ao encontro da Lei da Liberdade Econômica (lei 13.874/2019) que prevê, em seu art. 3º, inciso VIII:

Art. 3º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal: (...)

VIII - ter a garantia de que os negócios jurídicos empresariais paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública;

De igual modo, a IN 81/2020 também está em consonância com o art. 4º, inciso VII, da referida Lei da Liberdade Econômica, que prevê o dever da Administração de evitar o abuso do poder regulatório em relação às sociedades empresariais:

Art. 4º  É dever da administração pública e das demais entidades que se vinculam a esta Lei, no exercício de regulamentação de norma pública pertencente à legislação sobre a qual esta Lei versa, exceto se em estrito cumprimento a previsão explícita em lei, evitar o abuso do poder regulatório de maneira a, indevidamente: (...)

VII - introduzir limites à livre formação de sociedades empresariais ou de atividades econômicas;

Pela sistemática atual, portanto, o uso de novas tecnologias e modelagens societárias tende a ser estimulado, e não impedido por entraves burocráticos ou regulatórios.

Essa mudança deve favorecer a estruturação de novos negócios e garantir às Sociedades Limitadas, especialmente as empresas menores ou que estejam iniciando, novas modalidades de investimento e financiamento, o que tende a ampliar a preferência pela utilização desse tipo societário.

Afinal, a possibilidade de se criarem, nas Sociedades Limitadas, quotas preferenciais, sem direito a voto, tende a facilitar a captação de recursos, no sentido de atrair investidores que não tem o objetivo de participar das deliberações e do dia-a-dia da empresa.

___________

*Daniel Petrarca é advogado e sócio do escritório Petrarca Advogados.

*Rafael Lobato é advogado colaborador do escritório Petrarca Advogados.

 

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca