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Guarda compartilhada, a regra legal do duplo domicílio dos filhos

O legislador infraconstitucional, buscando reforçar a proteção especial que as famílias devem ter do Estado, em 2010, inseriu em nosso ordenamento a guarda compartilha, passando esta, em 2014, a ser a regra legal vigente.

quarta-feira, 24 de junho de 2020

Atualizado às 08:26

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Desde sua promulgação, a Constituição Federal consagrou as famílias como base da sociedade1, outorgando a elas especial proteção do Estado, determinando a criação de mecanismos para coibir a violência no âmbito das relações familiares2.

Para não deixar dúvidas a respeito de suas intenções, a Carta Magna, em observância aos seus fundamentos3 e objetivos4, expressamente reconheceu como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descentes5, ressaltando que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar e comunitária, colocando-os a salvo de toda forma de discriminação e violência6.

Em linha com as determinações constitucionais, buscando a elas dar efetividade, notadamente no que toca à proteção das famílias, o Código Civil de 20027 8 prevê que a separação judicial, o divórcio, a dissolução da união estável ou o fim de qualquer espécie de relacionamento, não tem o condão de modificar os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos, muito menos o direito destes à convivência familiar saudável9 com ambos os genitores e respectivas famílias extensas.

Tal inalterabilidade de direitos e deveres encontra razão de ser na, digamos, poética previsão constitucional que faz com que a lágrima produzida pelo fim da família tradicional ou nuclear, da conjugalidade, irrigue a semente do afeto paterno-filial, fazendo brotar do caos duas ou mais famílias monoparentais, que, de igual forma, também contam com a proteção especial do Estado.

O legislador infraconstitucional, buscando reforçar a proteção especial que as famílias devem ter do Estado, em 2010, inseriu em nosso ordenamento a guarda compartilha, passando esta, em 2014, a ser a regra legal vigente10.

Conforme definição legal, a guarda compartilhada é a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres dos pais e das mães que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns11, devendo, sempre que possível, tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos, o tempo de convivência destes com os seus genitores ser dividido de forma equilibrada12.

Ocorre que alguns operadores do direito, apesar da clareza gramatical inserta no §3°, do art. 1.583, do Código Civil, no sentido de que " na guarda compartilhada, a cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos", vêm buscando ou determinando a fixação de residência base ou lar de referência, o que, além de desvirtuar a determinação legal, não se amolda ao real espírito do compartilhamento da guarda, que busca o equilíbrio de direitos e deveres entre os genitores.

Na guarda compartilhada, a integralidade do poder familiar é partilhada conjuntamente por todos os genitores, notadamente no que tange à representação e assistência dos filhos, o que atrai a regra contida no art. 76, parágrafo único, do Código Civil, que afirma que o domicílio necessário do incapaz é o dos seus representantes legais.

Desta forma, na guarda compartilhada, as crianças ou adolescentes terão sempre dupla residência, considerando ser seus domicílios qualquer uma delas13, ainda que localizadas em cidades distintas.

Para ler o artigo da íntegra clique aqui.

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1 Constituição, art. 226, caput.

2 Constituição, art. 226, §8°.

3 Constituição, art. 1°, III.

4 Constituição, art. 3°, IV.

5 Constituição, art. 226, §4°.

6 Constituição, art. 227, caput.

7 Código Civil, art. 1.579, caput e parágrafo único.

8 Código Civil, art. 1.632.

9 Lei 8.069/90, art. 19, caput e §3°.

10 Código civil, art. 1.584, §2°.

11 Código Civil, art. 1.583, §1°.

12 Código Civil, art. 1.582, §2°.

13 Código Civil, art. 71.

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*Fernando Salzer e Silva é advogado familiarista e procurador do Estado de Minas Gerais.

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