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A importância da adequação terminológica: Home office e teletrabalho

Nas relações trabalhistas e no direito é de extrema relevância que o termo utilizado não seja ambíguo nem vago sob pena de dar significado diverso à figura jurídica a que se refere e, consequentemente, produzir efeitos jurídicos não pretendidos ou, pelo menos, informar o interlocutor de forma equivocada.

quarta-feira, 15 de julho de 2020

Atualizado às 08:06

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A professora Fabiana Del Padre Tomé, em seu verbete sobre a Linguagem no Direito, esclarece que existem fatores comuns que retardam a comunicação: a ambiguidade (existem mais significados para a mesma palavra) e a vaguidade (imprecisão no significado de uma palavra).

Embora os problemas não obstem a comunicação cotidiana, nas palavras da professora "dificultam o desenvolvimento de discurso rigorosamente científico".

Nas relações trabalhistas e no direito é de extrema relevância que o termo utilizado não seja ambíguo nem vago sob pena de dar significado diverso à figura jurídica a que se refere e, consequentemente, produzir efeitos jurídicos não pretendidos ou, pelo menos, informar o interlocutor de forma equivocada.

É o caso das expressões home office e teletrabalho, frequentemente utilizadas como sinônimas, mas que identificam conteúdos fático e jurídico diversos.

Antecipando o futuro, devido ao isolamento social trazido pela pandemia do novo coronavírus, o trabalho remoto, tabu para muitas empresas e rotina de outras, foi impulsionado e se tornou extremamente popular e necessário em questão de semanas. Afinal, trata-se de teletrabalho ou de home office e qual o sentido jurídico das expressões.

O caminho para a continuidade de empregos e de empresas teve que ser tomado às pressas como se o mundo passasse por um terremoto. A prática, chamada de novo normal do Direito do Trabalho, foi adotada por empresas que ainda tinham resistência de aceitar que a prestação de serviços pudesse ser efetiva mesmo que o empregado não estivesse presente fisicamente. A necessidade de se reinventar e vencer os preconceitos tecnológicos demonstrou a maleabilidade e a forte acomodação de sobrevivência das relações de trabalho.

Mas em meio a adaptação tecnológica, às reuniões pelas plataformas digitais usando camisa e calça de moletom com pantufas, ao som de latidos, desenhos animados e liquidificador, também houve e ainda há muita confusão na identificação jurídica dos institutos do teletrabalho e do home office, expressões que se revezam inadequadamente como se representassem juridicamente o mesmo conteúdo.

Contrato de emprego por meio de teletrabalho não é sinônimo de prática de home office e vice-versa. Isto pode parecer preciosismo, mas em direito é importante que a situação jurídica a que se faz referência seja exatamente a que se enquadra ao fenômeno tratado, conforme observado nas primeiras linhas. No caso, apesar de ambos identificarem a prestação de serviços remota, o teletrabalho é modalidade de contrato, enquanto o home office é a forma de cumprimento de jornada de trabalho.

No home office adotado por empresas, bem antes da pandemia, como forma de flexibilizar o cumprimento da jornada de trabalho, enquadra-se desde o empregado, como o autônomo, o profissional liberal e até mesmo o empresário.

No cumprimento de jornada por home office o empregado se ajusta em horários em que permanece parte no estabelecimento do empregador e parte, de forma não obrigatória, em lugar de sua escolha.

De outro lado, no contrato de teletrabalho, em que a realização do trabalho fora das dependências da empresa é a regra preponderante, o empregado utiliza tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza.

A referência correta ao fato jurídico que se pretende qualificar é extremamente relevante em razão das consequências decorrentes de forma e de direitos e até mesmo para aspectos relacionados à saúde e segurança no trabalho.

O empregado sujeito ao contrato de teletrabalho não está sob controle de jornada. O motivo não é a impossibilidade de controle, mas sim a presunção legal do afastamento do controle por opção do legislador e, por consequência não há o pagamento de horas extras e adicional noturno. Neste caso, ser firmado por acordo individual escrito, bem como é necessário o prévio ajuste sobre a responsabilidade pela infraestrutura necessária para tanto, sendo que na alteração para presencial, necessário respeito ao prazo legal de 15 dias.

Ao empregado que tem parte da jornada de trabalho flexibilizada em home office, por sua vez, não se aplicam as mesmas regras, devendo ser observadas as normas de controle de jornada aplicáveis ao trabalho presencial.

Mais importante ainda que se defina a qual modalidade se refere o intérprete, porque para o contrato de teletrabalho há expressa previsão legal no sentido de o empregador ter o dever de instruir os empregados quanto às precauções a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho. O empregado também se compromete mediante termo de responsabilidade a seguir as instruções do empregador.

A consequência prática devido à confusão de utilização das expressões entre os institutos parece saltar aos olhos porque, de um lado, há a flexibilização do cumprimento da jornada de trabalho ("home office") em que se aplica o controle de jornada e eventual direito a horas extraordinárias. De outro lado, o contrato de teletrabalho, que não se altera na natureza jurídica em nenhum momento, em que há obrigatoriedade de formalização contratual para o teletrabalho e é excludente do direito a horas extraordinárias.

É muito importante qualificar e dar significado às expressões no limite dos direitos que se pretende sejam reconhecidos sob pena de serem colhidos resultados diversos ao esperado.

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t*Paulo Sergio João é advogado. Professor de Direito do Trabalho no curso de Pós-graduação da PUC/SP e FGV. Sócio fundador do escritório Paulo Sergio João Advogados.








t*Natalia Biondi Gaggini
é advogada do escritório Peixoto & Cury Advogados. Professora de Direito do Trabalho. Pós-graduanda no Núcleo de Pesquisa em Direito do Trabalho na PUC/SP.

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