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Miel Gibson e os limites de uso do nome próprio

Por mais que o uso do nome "Mel Gibson" tenha sido feito sem intenção de aproveitamento, ou, ainda que o produto esteja sendo comercializado em um território restrito, sem autorização do proprietário do nome, o uso do mesmo se torna indevido e poderia, inclusive, impactar outros contratos celebrados por ele, gerando a possibilidade de prejuízos morais e financeiros.

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Atualizado em 28 de agosto de 2020 10:40

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Mel Gibson virou um dos assuntos mais comentados da semana, por um motivo um tanto inusitado: uma produtora de mel chilena batizou um de seus produtos de "MIEL GIBSON", fazendo alusão ao nome do ator, além de incluir na embalagem uma foto dele no famoso filme "Coração Valente".1

À princípio, Mel Gibson não aprovou o uso de seu nome nos potes de mel e seus advogados logo enviaram uma notificação à apicultora, solicitando que o nome do produto fosse alterado, sob pena de apresentar um processo judicial contra a mesma.

A questão nos leva a refletir sobre os direitos econômicos que envolvem o nome, tanto o de grandes artistas, a exemplo do Mel Gibson, quanto o nosso, escolhido carinhosamente pelos nossos pais.

O nome é um direito personalíssimo, previsto no Código Civil Brasileiro, e não pode ser transferido nem renunciado.2 No entanto, em alguns casos, o nome deixa de ser apenas um elemento identificador da pessoa, passando a ser também um direito econômico. Quem se lembra dos famosos brinquedos da Eliana ou do tênis da Sandy?

No Brasil, a Lei de Propriedade Industrial permite que o nome (ou apelido) seja registrado como marca, o que garante o direito de exclusividade de uso desse em todo o território nacional3. Isso só é possível se o titular do registro for o próprio "dono" do nome ou quem tenha autorização desse, como na hipótese da criação de uma holding para gerenciamento dos direitos do titular, ou quando se trata de pessoa falecida, cujo direito sobre o nome pode ser de titularidade de seus herdeiros ou sucessores. Artistas como BEYONCE4, JUSTIN BIEBER5 e a brasileira IVETE SANGALO6 possuem seus nomes registrados como marcas.

A possibilidade de registro de nome é limitada, pois, ainda que um indivíduo se chame NEYMAR JUNIOR, provavelmente será impedido de obter o registro desse nome, considerando que NEYMAR JR® já é marca registrada e conhecida como sendo do famoso jogador de futebol.

A identificação de produtos pelo nome de personalidades famosas muitas vezes motiva a compra pelo consumidor, já que os produtos têm valor e desejo agregado em decorrência da fama e do reconhecimento daquelas pessoas.

Todavia, o uso de nomes próprios em produtos não é tão simples quanto parece, já que, no geral, esta finalidade envolve contratos de licença de uso, que preveem diversas determinações a respeito de como o uso pode ser feito, o período pelo qual será permitido, os produtos que podem ser identificados, etc. Tais contratos, via de regra, envolvem o pagamento de uma determinada quantia ao titular do nome que está sendo utilizado.

Assim, embora o posicionamento inicial do ator Mel Gibson, em um primeiro olhar, possa ter parecido um tanto antipático, o mesmo tem direito de zelar pela integridade do seu nome, principalmente considerando que ele é um artista reconhecido no mundo inteiro e sua imagem e nome, provavelmente, lhe rendem muitos proventos econômicos.

Por mais que o uso do nome "Mel Gibson" tenha sido feito sem intenção de aproveitamento, ou, ainda que o produto esteja sendo comercializado em um território restrito, sem autorização do proprietário do nome, o uso do mesmo se torna indevido e poderia, inclusive, impactar outros contratos celebrados por ele, gerando a possibilidade de prejuízos morais e financeiros.

Se de um lado havia um ator incomodado com o uso não autorizado de seu nome, do outro existiu uma legião de pessoas que, simpatizando com a história da apicultora, saíram na defesa do movimento "Autoriza Mel Gibson".

O final dessa história, que tinha tudo para dar errado, é feliz. Após a repercussão do caso, o clamor do público foi ouvido: a apicultora e o ator entraram em um acordo que envolve a retirada somente da imagem do rótulo do produto, que poderá continuar sendo comercializado sob a divertida denominação "Miel Gibson".

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2 Art. 16 do Código Civil Brasileiro. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.

3 Art. 124 da LPI: Art. 129. A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148.

4 Reg. N. 830165045

5 Reg. N. 831297115

6 Reg. N. 910535116

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t*Carolina Bandiera Caetano é advogada especialista em marcas do escritório Kasznar Leonardos | Propriedade Intelectual.






t*Larissa Nunes Pietoso é advogada especialista em marcas do escritório Kasznar Leonardos | Propriedade Intelectual.


 

 

 

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