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O Supremo Tribunal Federal e a ADIn 5.529: Os rumos da inovação

O legislador brasileiro inseriu na Lei da Propriedade Industrial um mecanismo de prazo mínimo de vigência, que é acionado quando o Instituto demora mais do que 10 anos para conceder uma patente.

terça-feira, 13 de outubro de 2020

Atualizado às 08:17

O Supremo Tribunal Federal (STF), órgão de cúpula do Judiciário brasileiro e responsável pela defesa da Constituição, decidirá se é constitucional ou não o prazo mínimo de vigência das patentes no Brasil (10 anos para patentes de invenção e sete anos para modelos de utilidade), previsto no parágrafo único do artigo 40 da Lei da Propriedade Industrial (lei 9.279/96).

Essa discussão está sendo travada no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADIn 5.529/DF, proposta pelo procurador-geral da República em 20151, e é de extrema importância para todo e qualquer titular, seja de patente já concedida no Brasil seja de pedido de patente depositado, independentemente do setor da indústria.

Caso o prazo mínimo de vigência seja tido por inconstitucional, para além do risco de serem atingidas as patentes já concedidas, bem como os pedidos de patente pendentes, há também um risco para o ciclo de inovação da indústria brasileira.

Durante muito tempo, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI mostrou-se incapaz de examinar, dentro de um prazo razoável, os pedidos de patentes pendentes. Estudos apontam que, em 2015, foi maior do que 11 anos o tempo médio até o final do processamento administrativo. Em determinadas áreas tecnológicas (e.g: smartphones), foi de 14 anos o tempo médio de espera para a concessão de uma patente2. Em alguns casos extremos, o INPI demorou mais de 20 anos para conceder uma patente. Essa demora na concessão de uma patente por conta do estoque de pedidos depositados é conhecida como backlog, porém, atualmente, em um esforço louvável do INPI, está sendo executado um plano de combate ao atraso, que levou a uma redução no tempo médio para a concessão de uma patente para aproximadamente oito anos.

Por conta da histórica dificuldade do INPI de fazer frente ao estoque de pedidos de patente, o legislador brasileiro inseriu na Lei da Propriedade Industrial um mecanismo de prazo mínimo de vigência, que é acionado quando o Instituto demora mais do que 10 anos para conceder uma patente.

Esse mecanismo é importante para garantir que as patentes vigorem por um prazo - razoável - de 10 anos. Em outros países (e.g Estados Unidos, China, Austrália e Coreia do Sul), em que as patentes são concedidas em um tempo médio inferior a quatro anos3, os titulares de patente gozam de mais de 16 (dezesseis) anos de exclusividade no mercado.

À luz da realidade brasileira, esse prazo mínimo de vigência impede que as patentes sejam concedidas com prazo já expirado - as chamadas patentes natimortas - ou então muito próximas do vencimento, o que inviabilizaria o retorno dos investimentos empregados na invenção. Sem um prazo razoável, não haverá estímulo para novas invenções e a sociedade ficará abraçada a tecnologias defasadas. E esta será provavelmente a pior consequência caso o STF julgue inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei da Propriedade Industrial.

É evidente, porém, que o prazo mínimo de vigência não afronta a Constituição brasileira. Pelo contrário, ele garante, efetivamente, que os inventores gozarão de um privilégio temporário, como garantido expressamente pelo art. 5º, XXIX, do texto constitucional. Afinal, uma patente desprovida de um prazo razoável e que, por isso, não seja capaz de recompensar o inventor, não tem qualquer valor econômico.

A constitucionalidade do prazo mínimo de vigência é defendida por juristas como a ex-ministra do STF Ellen Gracie e pelo diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo prof. Floriano Azevedo Marques4. Também é importante lembrar que a Lei da Propriedade Industrial - contendo o parágrafo único do art. 40 - foi subscrita pelo ex-ministro do STF Nelson Jobim, à época ministro da Justiça do presidente Fernando Henrique Cardoso5.

Como o Supremo Tribunal Federal até hoje não se pronunciou sobre a juridicidade do parágrafo único do art. 40 da Lei da Propriedade Industrial, é possível, em tese, que este dispositivo venha a ser declarado inconstitucional. Mas, nessa hipótese, deverá o STF modular os efeitos de sua decisão, em função do princípio da segurança jurídica, para que o prazo mínimo de vigência das patentes incida sobre as patentes já concedidas e os pedidos de patente que tenham sido depositados até a data da prolação da decisão.

A constitucionalidade do referido dispositivo é importante não apenas para a iniciativa privada, mas também para as empresas e universidade públicas. A Petrobrás, por exemplo, tem mais de 200 (duzentas) patentes concedidas com vigência fixada com base no parágrafo único do art. 40. A Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade de Campinas (Unicamp), somadas, detêm mais de 400 (quatrocentas) patentes na mesma situação.

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1 Essa discussão teve início em 2013, quando uma associação de laboratórios fabricantes de medicamentos genéricos ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade para tratar da mesma questão. Porém, o STF decidiu que aquela associação não tem legitimidade para propor ADI (a Constituição confere tal legitimidade a algumas poucas pessoas).

2 Schultz, M.; Madigan, Kevin, 2016. Disponível clicando aqui. Acesso em 25 set 2020.

3 Schultz, M.; Madigan, Kevin, 2016. Disponível clicando aqui. Acesso em 25 set 2020.

4 Ambos os juristas apresentaram parecer favorável à constitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da Lei da Propriedade Industrial nos autos da ADI 5.529/DF.

5 O que equivale dizer que dois ex-ministros do STF endossam a constitucionalidade da norma impugnada.

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 *Luiz Augusto Lopes Paulino é sócio do escritório Dannemann Siemsen. Conselheiro do Instituto Dannemann Siemsen (IDS).





 *Willian Lecciolli é advogado do escritório Dannemann Siemsen. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP.

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