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Seguro de responsabilidade civil profissional médica

Quais são os limites, vantagens e desvantagens do seguro de responsabilidade civil profissional médica?

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Atualizado em 20 de outubro de 2020 08:16

 Imagem: Arte Migalhas

Considerando que o médico pode ser responsabilizado pela ação ou omissão em ato médico nas seguintes esferas, autônomas e independentes:

1. Esfera civil, no Poder judiciário.

2. Esfera Criminal, igualmente no Poder Judiciário.

3. Esfera administrativa e ética, nos órgãos de classe, Conselhos Regionais e Federal de Medicina, em caso de incorrer em eventual infração ética, poderá ser investigado, em sindicância e /ou processo ético profissional.

4. Ainda existe a possibilidade do profissional da medicina, ser servidor público, neste caso, responderá por processo administrativo interno.

Entretanto, observa-se que a contratação do seguro de responsabilidade civil profissional médica, como a própria nomenclatura dispõe, refere-se à cobertura apenas na esfera civil.

Neste sentido, caso seja necessário acionar o seguro, em eventual demanda judicial, dependendo da seguradora, poderá ter cobertura de uma defesa por um advogado que represente o profissional judicialmente, através de uma defesa técnica processual e se o médico for condenado (civilmente), poderá ter uma cobertura em até determinado valor em dinheiro, o qual foi acordado na contratação do seguro, à título de reparação judicial, por danos materiais, neste sentido, vale um parênteses a respeito dos danos passíveis de cobertura no eventual dano causado pelo médico, a seguir.

Neste contexto, o erro médico pode causar as seguintes espécies de dano:

1. Dano Material - Prejuízos ou perdas patrimoniais do paciente, os quais encontramos validade no art. 402, do Código Civil, referem-se aos danos emergentes (aquilo que efetivamente se perdeu - gastos com os medicamentos e tratamentos em razão do erro médico) e aos lucros cessantes (o que se deixou de lucrar no período em que ficou sem trabalhar, em razão do erro médico).

2. Dano Extrapatrimonial - Dano moral, dano existencial e ainda pode causar o dano estético.

Dano existencial, o qual a lesão se perpetua no tempo, afetando o modo de ser da pessoa, considerado por alguns autores um dano imprescritível.

O dano estético, decorrente de erro médico, caracteriza-se pela lesão e deformidade física na pessoa, deve ser duradouro ou permanente e não precisa ser aparente, à vista de terceiros, bastando, apenas, existir no corpo, o dano estético agride a pessoa em sua autoestima, causando-lhe humilhação, tristeza, constrangimento e também pode ter reflexos na sua saúde e integridade física.

Além da previsão legal, disposta nos artigos, 186, 949, 950 e 951, do Código Civil. A súmula 387, do STJ, estabelece que "É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral"

É pacífico o entendimento de que é permitido cumular valores autônomos à título de indenização, um fixado a título de dano moral, nesse caso, o dano moral é considerado "in re ipsa", ou seja, não precisa ser provado. É um dano presumido, e o outro a título de dano estético, decorrente de deformidade física permanente, não devendo haver confusão entre os dois tipos de dano, e sendo cumuláveis as indenizações.

Por consequência, o médico que comprovadamente pratica um erro médico está sujeito a reparar o dano estético, além do dano material e moral que causou ao paciente.

O renomado autor Genival Veloso de França, em sua obra,1 cita algumas vantagens e desvantagens do seguro de responsabilidade civil.

"Vantagens do seguro de responsabilidade civil do médico:

1. Melhor modalidade de liquidação do dano.

2. Melhor condição de liberdade e segurança no trabalho.

3. Assegura o equilíbrio social e a ordem pública.

4. Melhor forma de justiça social.

5. Melhor forma de previdência propriamente dita.

6. Livra médico e paciente de processos penosos e demorados.

7. Evita explorações e ruínas, injustiças e iniquidades.

8. Independe da situação econômica do causador do dano.

9. Corrige o aviltamento patrimonial da vítima.

10. Contribui com o superávit do sistema em programas de prevenção do dano.

11. Estimula a solidariedade social.

12. Apresenta falhas, mas tem o maior número de benefícios e vantagens.

13. Corrige o fato de o paciente ser totalmente esquecido e o médico falsamente lembrado.

Desvantagens do seguro de responsabilidade civil do médico:

1. Interfere negativamente na relação médico-paciente.

2. Estimula os processos contra os médicos.

3. Eleva os custos dos serviços médicos.

4. Pode facilitar o erro médico.

5. Facilita a indústria das indenizações.

6. Fornece uma proteção aparente para o profissional.

7. Cria um cenário cativo para o médico.

8. Não cobre o dano moral."

Contudo, mesmo com a demonstração de mais benefícios e vantagens acerca da contratação do seguro de responsabilidade civil, o médico não se isenta de responder nas demais esferas de responsabilidades, tendo em vista que ainda poderá responder nas esferas administrativa, nos órgãos de classe, CREMESP e CFM e na esfera penal.

Quanto à esfera administrativa, o médico recebe uma notificação por eventual infração ética às Resoluções do Conselho Federal de Medicina, bem como ao Código de Ética Médica, significa que foi instaurada uma Sindicância para apuração e investigação de indícios de infração ética profissional, pode ser por uma denúncia de algum paciente, ou ex officio, ou seja, instaurada de ofício, pelo próprio Conselho.

Entretanto, é importante apresentar defesa técnica nesta fase de sindicância, com o objetivo de arquivamento da mesma, requerer ainda, a tentativa de conciliação, ou a depender da suposta infração a tentativa do TAC, Termo de Ajustamento de Conduta, o qual é proposto pelo próprio Conselho, caso contrário, poderá ser aberto um Processo Ético Profissional, esse processo segue de forma autônoma e independente das demais esferas, civil e criminal.

Vale mencionar, que se o médico for condenado na esfera administrativa, em Processo Ético Profissional, poderá incorrer por uma dessas sanções:

Penas dispostas no artigo 22, da lei 3.268/57, quer sejam:2

a) Advertência confidencial em aviso reservado;

b) Censura confidencial em aviso reservado;

c) Censura pública em publicação oficial;

d) Suspensão do exercício profissional até 30 (trinta) dias;

e) Cassação do exercício profissional

As 3 últimas são publicadas no Diário Oficial e no Jornal do Cremesp.

Desta forma, observamos que o seguro de responsabilidade civil profissional médica, demonstra benefícios e vantagens para o médico, entretanto, limita-se na esfera civil e na seara da reparação material de danos causados ao paciente lesado e as indenizações serão pagas apenas até o limite contratado.

Desta forma, se o médico for condenado à reparação por danos morais, estéticos e ainda mesmo existenciais ao paciente, não terá cobertura do seguro civil, nestes casos, terá de arcar com seus próprios recursos financeiros.

Além disso, caso o dano causado pelo médico ao paciente, se estenda na seara criminal, poderá ser condenado em esfera penal, em caso, por exemplo, de lesão corporal ou homicídio.

Neste sentido, independente do médico contratar o seguro de responsabilidade civil, o profissional deve manter uma relação médico-paciente eticamente adequada, visando sempre o bem estar integral do paciente, agir com uma conduta diligente, prudente e ética e ficar atento ao preenchimento adequado dos documentos inerentes ao atendimento e procedimentos, dentre outros, atestados, laudos, prontuário do paciente, termo de consentimento informado, mantendo sempre a informação e cientificação ao paciente quanto aos benefícios e riscos inerentes aos tratamentos e procedimentos ofertados, visando sempre proporcionar mecanismos que venham a tornar a prestação dos serviços médicos segura, sob o ponto de vista jurídico.

Considerando que as companhias seguradoras possuam apólices específicas em relação ao seguro de responsabilidade civil profissional médica, contendo cláusulas de obrigações, coberturas, exclusões e análise de riscos extensas e por vezes passíveis de rasa compreensão, é recomendável, que ao decidir pela contratação do seguro em questão, o profissional da saúde procure aconselhamento jurídico, com a finalidade de auxilia-lo na avaliação das cláusulas contratuais e implicações jurídicas, de forma que o profissional da saúde obtenha vantagens com o serviço de seguro, caso venha a acioná-lo e usufruí-lo de fato.

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1 FRANÇA, Genival Veloso de, Direito Médico. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 285-286.

2 Código de Processo Ético Profissional, Resolução do Conselho Federal de Medicina 2.145/16

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 *Erika Pastorelli Trentin é advogada, fundadora do escritório Pastorelli Advocacia. Especialista em Direito da Medicina, Direito Médico e da Saúde e em Direito Tributário pela PUC, São Paulo.

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