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A individualização das medições de consumo hídrico e o direito do consumidor

A lei 14.026/20 impacta nas relações consumeristas ao confirmar a obrigação da individualização por unidade em edificações condominiais, e o dever do usuário de realizar a instalação desses medidores.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Atualizado às 10:12

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

A lei 14.026, de 15.7.2020, que alterou o Marco Legal do Saneamento Básico ("lei 14.026/20"), apresenta inovações que impactam as relações consumeristas, especialmente no tocante à lei 11.445/07 ("Lei de Diretrizes Nacionais de Saneamento Básico"). 

Tendo em vista já ter sido pacificada pelo STJ a aplicação do CDC a tais relações de prestação de serviço público, e que essa nova lei reforça a importância da prestação adequada e universal desses serviços, alguns dispositivos incluídos na lei 11.445/2007 eventualmente poderão ser objeto de questionamentos judiciais, como o art. 29, §§3º e 5º, e o art. 45, §12º, que confirmam e detalham a obrigação de individualização da medição do consumo hídrico por unidade, nos casos de edificações condominiais, e do dever do usuário de realizar a instalação desses medidores. 

Especificamente, o mencionado §5º trata da possibilidade de alguns prédios, edifícios e condomínios não cumprirem esse procedimento por terem sido construídos antes da entrada em vigor da lei 13.312/16, ou por ser inviável, seja em virtude de onerosidade ou razão técnica, de modo que deverá ser tratado diretamente com os prestadores de serviços para estabelecimento de responsabilidades, critérios de rateio e forma de cobrança em cada caso. 

A previsão dessas exceções pelo §5º possivelmente levará à manutenção das discussões que há tempos vêm sendo submetidas ao poder judiciário: a cobrança do custo da instalação desses medidores do consumidor e o cabimento da realização de cobrança de tarifas sem medição precisa. Inobstante a lei 14.026/20 defina como dever do usuário a instalação do medidor, o §5º, como visto, poderá ser utilizado como justificativa para relativizar essa obrigação e o eventual custo vinculado a ela, tendo em vista a maneira ampla com que definiu as exceções. 

As previsões em referência reforçam os riscos de confirmação dos atuais precedentes relacionados a casos envolvendo tais temas, pelos quais os Tribunais brasileiros na maioria das vezes consideram abusiva a cobrança pela prestadora de serviços de saneamento básico de (i) instalação de medidores, por configurar venda casada, prática vedada pelo art. 39, I, do CDC, e pelo fato de o art. 40, III, da lei 11.445/2007 prever a possibilidade de interrupção dos serviços por "negativa do usuário em permitir a instalação de dispositivo de leitura de água consumida", pelo que se subentende ser obrigação da concessionária a instalação, independentemente de pagamento, e (ii) tarifas por consumo hídrico com base em estimativa quando não há hidrômetro instalado por inércia da concessionária (sendo cabível apenas a cobrança de tarifa mínima do consumidor). 

À luz dessas considerações, em razão da possibilidade concreta de discussões judiciais relacionadas a dispositivos legais incluídos ou alterados pela lei 14.026/20, é recomendável a observância à legislação consumerista, bem como aos precedentes jurisprudenciais sobre o tema, a fim de mitigar os riscos de responsabilização da prestadora de serviços por eventuais danos, inclusive morais, porventura reclamados pelos consumidores.

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 *Raquel Mansanaro é sócia da área de Contencioso e Arbitragem do escritório BMA - Barbosa, Müssnich, Aragão.






 *Renan Frediani Torres Peres é advogado sênior da área de Contencioso e Arbitragem do escritório BMA - Barbosa, Müssnich, Aragão.

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