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Morador de condomínio fechado não associado à associação de moradores é obrigado a pagar taxas de manutenção?

O STF decide sobre tema polêmico referente à cobrança de taxas de conservação e manutenção feita por associação de moradores a proprietários não associados.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Atualizado às 08:40

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

A cobrança de taxa de associação de moradores em condomínio fechado é tema polêmico no Direito brasileiro tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 assegura o direito de não se associar no rol de direitos fundamentais, ou seja, são direitos constitutivos do próprio princípio democrático, inerentes ao Estado Democrático de Direito. Trata-se, como o próprio nome sugere, do poder do indivíduo de decidir se quer ou não fazer parte de uma associação. Assim, o artigo 5º, inciso XX da Constituição Federal dispõe: "ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado."

O Direito brasileiro ainda traz em seu bojo jurídico o Princípio da Livre Associação sindical tratado no art. 8º da Constituição Federal que textualmente, pontua, em seu "caput", que "é livre a associação profissional ou sindical", esclarecendo, no inciso III, que "ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas".

Nesse mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça já havia se posicionado em meados de 2015, através do Tema 882 em recurso repetitivo (REsp nº 1.280.871/SP e REsp nº 1.439.163/SP), culminando na seguinte tese firmada: "As taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram."

Contudo, dois anos depois, em meados de 2017, a lei 13.465/2017 disciplinou em sentido diverso tendo em vista que afirmou que as atividades desenvolvidas pelas associações de moradores sujeira seus titulares aos pagamentos de suas taxas, desde que não tenham fins lucrativos. A lei 13.465/2017 introduziu o artigo 36-A e seu parágrafo único alterando a lei 6.766/1976, que dispõe: "as atividades desenvolvidas pelas associações de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos ou empreendimentos assemelhados, desde que não tenham fins lucrativos, sujeita seus titulares à normatização e a disciplina constantes de seus atos constitutivos, cotizando-se na forma desses atos para suportar a consecução dos seus objetivos."

Percebe-se, portanto, que houve uma divergência entre a lei de 13.465 de 2017 e o Tema 882 do Superior Tribunal de Justiça de 2015 quando ambas disciplinaram em sentido contrário sobre a obrigatoriedade do pagamento de taxas de manutenção e conservação à associação de moradores por não associados, o que aumentou ainda mais a polêmica sobre o tema.

De um lado, temos o princípio da livre associação e de outro o locupletamento ilícito, haja vista que o interesse comum dos moradores de implementarem infraestrutura e serviços que venham a beneficiar a todos os moradores ainda que ele não seja associado.

Assim, para solucionar essa questão, o litígio foi levado ao Supremo Tribunal Federal, por meio do recurso extraordinário (RE 695.911), Tema 492 da lista da repercussão geral. No dia 18 de dezembro  de 2020 é  Julgado o mérito de tema com repercussão geral pelo Tribunal Pleno decidindo o seguinte: "O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 492 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário e fixou a seguinte tese: "É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da lei 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis", nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Roberto Barroso e Gilmar Mendes, que negavam provimento ao recurso. O Ministro Marco Aurélio deu provimento ao recurso e fixava tese nos termos de seu voto. Falaram: pela recorrente, os Drs. Robson Cavalieri e Mauro Simeoni; pela recorrida, o Dr. Flávio Henrique Unes Pereira; pelo amicus curiae Associação Nacional de Vítimas de Falsos Condomínios - ANVIFALCON, o Dr. Carlos Alberto Garbi; e, pelo amicus curiae FAMRIO - Federação das Associação de Moradores do Município do Rio de Janeiro, o Dr. Alexandre Simões Lindoso. Plenário, Sessão Virtual de 4/12/2020 a 14/12/2020."

Portanto, a decisão do Tribunal estabeleceu um marco temporal para a cobrança de taxa associativa, definindo a inconstitucionalidade da cobrança até o advento da lei 13.465/17 ou de lei municipal anterior que discipline a questão. Decidiu-se que não é razoável que prevaleça o interesse particular daquele que se recusa a partilhar das despesas, se locupletando do esforço alheia.

Constatou-se que a negativa de alguns moradores de custearem as despesas comuns afronta o princípio constitucional da solidariedade, que impõe a todos um dever jurídico de respeito coletivo, que visa beneficiar a sociedade como um todo.

A decisão impacta principalmente os loteamentos fechados que carecem de legislação específica e são definidos pela doutrina como sendo aqueles constituídos, inicialmente, sob a forma da lei 6.766/79, mas que se afastam do loteamento tradicional por terem suas vias e logradouros acesso limitado ao trânsito de moradores e visitantes, mediante permissão ou cessão de uso pela municipalidade.

A decisão final é benéfica para as associações de moradores em loteamento com acesso controlado "fechado" que terão maior segurança para realizar eleger administradores, contratar funcionários, fechar ruas, construir portarias com vigilância e cobrar pelas despesas decorrentes dos serviços prestados.

Sendo assim, quem não quiser arcar com taxa associativa em loteamentos com acesso controlado (condomínio fechado), ou mesmo com o rateio condominial em condomínios edilícios, deve procurar constituir sua residência em imóvel localizado em loteamento aberto.

Fiama Vitória de Souza Assis

Fiama Vitória de Souza Assis

Advogada, bacharel em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto, pós-graduada em Direito Imobiliário Aplicado pela Escola Paulista de Direito. Professora.

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