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Da impossibilidade do cancelamento do precatório ou das RPV

Inaplicabilidade da lei 13.463/17 e recomposição do saldo.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Atualizado às 08:23

 (Imagem: Arte Migalhas.)

(Imagem: Arte Migalhas.)

Em julho de 2017, foi promulgada a lei 13.463 tratando sobre a sistemática de pagamento de precatórios e Requisições de Pequenos Valores (RPVs) federais. Nela, foi inserida a possibilidade de cancelamento dessas requisições depois de ultrapassado o prazo de dois anos sem resgate do valor, contados do efetivo depósito. 

Ocorre que, durante o processo de execução contra a Fazenda Pública, corriqueiramente, o precatório ou a RPV é expedido com restrição de pagamento, ou seja, os valores são depositados e ficam na conta bancária bloqueados, impossibilitando o levantamento pelo credor.  

Tal situação ocorre, em especial, quando surgem novas questões durante a fase de cumprimento de sentença, em geral, como formas de postergar o pagamento pelos Entes Públicos. 

Entretanto, desconsiderando o bloqueio dos valores, os precatórios ou as Requisições de Pequenos Valores são devolvidos aos cofres públicos por força do artigo 2º da lei 13.463/17, acarretando grave prejuízo aos credores, diante de latente ilegalidade cometida pelas instituições financeiras. 

O início da contagem do prazo para ocorrer a devolução da quantia depositada somente se inicia quando efetivamente o valor estiver à disposição do credor para saque. É preciso aguardar a resolução dos embaraços jurídicos que deram causa aos bloqueios, momento este em que o crédito se tornará realmente disponível para resgate. 

Foi justamente essa a intenção do legislador na acertada disposição dos enunciados publicados no DOU de 7 de março de 2019 pela Corregedoria Geral da Justiça Federal (CGF/STJ), no Provimento 3/18. 

Da leitura do regulamento, nota-se que fato que tem como consequência a devolução de valores é a inércia do credor. Caso o beneficiário esteja impossibilitado de levantar o crédito, não é possível imputar a ele o não levantamento dos valores. Assim, esses deverão permanecer depositados até que o motivo impeditivo seja solucionado1, para só então iniciar o prazo de dois anos para a devolução das quantias aos cofres públicos. 

Baseado no mencionado Provimento do STJ, os Tribunais Federais proferem acórdãos reafirmando a perspectiva narrada. O TRF da 1ª Região, por exemplo, proferiu decisão considerando excluídos do cancelamento de que trata o artigo 2° da lei 13.463/17, os depósitos sobre os quais existam ordem judicial suspendendo ou sustando a liberação dos respectivos valores a qualquer título. 

Porém, o que fazer se o cancelamento foi efetivado erroneamente e as quantias foram devolvidas aos cofres públicos? Via de regra, cancelado o requisitório, ele só poderá ser depositado novamente após a sua reexpedição e inserção no orçamento financeiro, conforme prevê a norma constitucional.2 

Ou seja, para receber um valor referente a um precatório ou uma RPV cancelado, este deve ser reexpedido mediante ordem judicial, e só será depositado após os prazos constitucionais, que poderá ser no ano seguinte ou subsequente, na hipótese de precatório. 

Para sanar situações dessa natureza, sem precisar aguardar nova inscrição em precatório, é possível requerer a recomposição da conta bancária do requisitório, haja vista inexistência de desídia do credor que, por sua vez, não deve ser prejudicado por circunstâncias diversas à sua vontade. 

É justamente assim que vêm decidindo os Tribunais Federais, a exemplo do TRF da 4ª Região, que reconhece a ilegalidade desses cancelamentos e determina a intimação da instituição financeira responsável para que promova a recomposição do saldo da conta judicial que fora erroneamente devolvido para a conta do Tesouro Nacional. 

Importante frisar que estando impossibilitada a instituição financeira de proceder com a recomposição do valor na conta bancária, a Secretaria do Tesouro Nacional deve ser acionada para realizar o procedimento, com os devidos acréscimos legais. 

Assim, conclui-se que, quando não configurada sua desídia, o beneficiário de requisitório cujo valor se encontra bloqueado, não poderá ser penalizado com a devolução de seu crédito aos cofres públicos por força da lei 13.463/17, conforme exceção do artigo 1º, Provimento 3/18, da CGJF, devendo ser acionado o judiciário com máxima brevidade para que seja recomposto o saldo da conta judicial vinculado ao precatório/RPV indevidamente cancelado.

Ana Lydia de Almeida Seabra

Ana Lydia de Almeida Seabra

Advogada da unidade de Direito Administrativo de Martorelli Advogados.

Pedro Becker Calheiros Correia de Melo

Pedro Becker Calheiros Correia de Melo

Advogado da área de Direito Administrativo de Martorelli Advogados.

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