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Penhora de safra: efetividade na satisfação do crédito

Análise do acórdão proferido no AI 70080911522/RS, no qual foi firmado o entendimento de que a penhora de safra com a venda de grãos, possui maior efetividade na pretensão executiva. Tudo dependendo, claro, de cada situação fática.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Atualizado às 13:29

 (Imagem: Arte Migalhas.)

(Imagem: Arte Migalhas.)

Por certo que o artigo 805 do CPC1 garante o direito do executado de escolher a maneira mais branda de perseguição de seu patrimônio.

Esse direito, no entanto, não é absoluto, uma vez que resta garantido ao credor o direito de efetividade de obtenção de seu crédito.

A propósito, a Terceira Turma do STJ, no recurso especial 801.262/SP,2 decidiu que "ainda que se reconheça que a execução deve ser realizada de forma menos onerosa ao devedor, não se pode desprezar o interesse do credor e a eficácia da prestação jurisdicional".

Assim, restou firmado o entendimento, na 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do sul, no Agravo de Instrumento 70080911522,3 que o direito do devedor deve ser observado não só em consonância com a possibilidade de alteração na ordem de penhora prevista no artigo 835 do CPC,4 como também com o interesse do credor a satisfação do crédito exequível determinado no artigo 797 do CPC5. Isso, notoriamente, dependendo de cada situação concreta.

Quer com isso dizer que, de acordo com as circunstâncias do caso fático, poderá ser alterada a ordem de penhora estabelecida no artigo 835, em favor do credor, cujo intuito maior é conferir efetividade a atividade executiva.

Além disso, certo é que, nos moldes do artigo 797 do CPC, a execução realiza-se no interesse do exequente, cujo objetivo, assim como no artigo citado no parágrafo anterior, é a prestação da tutela executiva, dependendo, do mesmo modo, de cada caso concreto.

No agravo de instrumento já mencionado, objeto de análise do presente ensaio, foi deferida, ainda que houvesse garantia hipotecária de um bem imóvel estipulada na cédula de crédito bancária, a penhora de grãos de soja.6

Firmou-se, dessa maneira, o entendimento, nesse caso, no qual "a penhora do bem hipotecado deve ser preferencial, mas não exclusiva, podendo ser modificada a ordem de preferência dos bens a serem penhorados a fim de atingir o meio mais eficaz para a satisfação da obrigação".7

A penhora de safra, face o direito do devedor a execução menos gravosa e o direito do credor a eficácia da prestação executiva, deve recair sobre o bem, título ou direito, mais apto a satisfação do crédito. Isso, notadamente, sob a análise de cada situação fática levada a juízo.

Nas medidas de satisfação do crédito perseguido em execução, há a sobreposição do princípio da efetividade da execução ao credor em detrimento do princípio da menor onerosidade ao devedor.8

No agravo de instrumento exemplificado anteriormente, no qual ficou entendido que devem "ser ponderadas as particularidades da situação concreta para a avaliação do meio mais eficaz para a satisfação do crédito",9 tem-se a aplicação do princípio da efetividade da execução em favor do exequente e, portanto, o direito do credor a pretensão executiva.

Observa-se que, dentre as medidas de satisfação do crédito perseguido em execução, a da penhora de safra com a venda de grãos, possui uma fácil conversão em moeda, com a consequente extinção do processo.

Esse, inclusive, é o entendimento, da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, no agravo de instrumento 70080911522,10 objeto de análise do presente artigo, quando foi deferido o pedido de penhora de grãos de soja da lavoura, sob o fundamento de que a medida de constrição dos grãos de soja é mais eficaz que a penhora de bem imóvel. Isso, porque enquanto o bem hipotecado depende de registro da penhora, avaliação, eventual impugnação à avaliação e designação de leilão judicial; os grãos de soja podem ser vendidos a qualquer momento. 

A penhora de safra com a venda de grãos caracteriza (concordando com o entendimento da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, no agravo de instrumento 70080911522) medida executiva mais eficaz a satisfação do crédito, possibilitando, dessa forma, a extinção do processo. Lembrando, por fim, que, tudo, dependerá da análise de cada situação fática.

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1 "Art. 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.

"Parágrafo único. Ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados."

2 STJ, 3ª Turma. Recurso Especial Nº 801.262/SP, Ministro Relator: Humberto Gomes de Barros. Julgado em 06/04/2006. DJ 22/05/2006. p. 200.

3 TJ/RS, 12ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento Nº 70080911522. Desembargadora Relatora Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout. Julgado em 18/07/2019. Disponível em clique aqui. p. 6.

4 "Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:

"I - dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;

"II - títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado;

"III - títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;

"IV - veículos de via terrestre;

"V - bens imóveis;

"VI - bens móveis em geral;

"VII - semoventes;

"VIII - navios e aeronaves;

"IX - ações e quotas de sociedades simples e empresárias;

"X - percentual do faturamento de empresa devedora;

"XI - pedras e metais preciosos;

"XII - direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;

"XIII - outros direitos.

"§ 1º É prioritária a penhora em dinheiro, podendo o juiz, nas demais hipóteses, alterar a ordem prevista no caput de acordo com as circunstâncias do caso concreto.

"§ 2º Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento.

"§ 3º Na execução de crédito com garantia real, a penhora recairá sobre a coisa dada em garantia, e, se a coisa pertencer a terceiro garantidor, este também será intimado da penhora."

5 "Art. 797. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal, realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados."

6 TJ/RS, 12ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento Nº 70080911522. Desembargadora Relatora Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout. Julgado em 18/07/2019. Disponível em clique aqui. p. 6.

7 TJ/RS, 12ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento Nº 70080911522. Desembargadora Relatora Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout. Julgado em 18/07/2019. Disponível em clique aqui. p. 6.

8 Sob o Título, Prevalência do Princípio da Efetividade da Execução, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, assim, escrevem: "o princípio da menor onerosidade está subordinado ao princípio da eficiência da execução em favor do credor. Por isso, só se cogitará da menor onerosidade se houver mais de um meio identicamente idôneo a satisfazer o interesse do credor".

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Thomson Reuters, 2020. p. 941.

9 TJ/RS, 12ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento Nº 70080911522. Desembargadora Relatora Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout. Julgado em 18/07/2019. Disponível em clique aqui. p. 7.

 

10 TJ/RS, 12ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento Nº 70080911522. Desembargadora Relatora Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout. Julgado em 18/07/2019. Disponível em clique aqui. p. 6-7.

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MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Thomson Reuters, 2020.

STJ, 3ª Turma. Recurso Especial Nº 801.262/SP, Ministro Relator: Humberto Gomes de Barros. Julgado em 06/04/2006. Disponível em clique aqui. 

TJ/RS, 12ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento Nº 70080911522. Desembargadora Relatora Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout. Julgado em 18/07/2019. Disponível em clique aqui.

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Arnaldo Rizzardo Filho

Arnaldo Rizzardo Filho

Bacharel em Direito pela PUC-RS. Mestre em Direito Público pela Unisinos. Advogado, professor e autor.

Débora Minuzzi

VIP Débora Minuzzi

Advogada; Mestre em Direito pela PUCRS, Área de Concentração: Teoria Geral da Jurisdição e do Processo; Especialista em Direito Ambiental pela UFRGS; Especialista em Processo Civil pela UFRGS.

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