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A reforma tributária e o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI

Fabiola Cassiano Keramidas

Muito se tem comentado acerca da Reforma Tributária introduzida pela Emenda Constitucional nº 42/03 ("EC 42/03") e as efetivas mudanças por ela trazidas. As alterações mais comentadas relativas ao ICMS e à criação de novas contribuições acabaram ficando pelo caminho, entre um acordo e outro dos representantes do povo.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2004

Atualizado às 07:41

A reforma tributária e o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI

 

Fabiola Cassiano Keramidas*

 

Muito se tem comentado acerca da Reforma Tributária introduzida pela Emenda Constitucional nº 42/03 ("EC 42/03") e as efetivas mudanças por ela trazidas. As alterações mais comentadas relativas ao ICMS e à criação de novas contribuições acabaram ficando pelo caminho, entre um acordo e outro dos representantes do povo.

 

Contudo, outros tributos, que não foram muito comentados, nos quais não se previam grandes alterações, foram surpreendentemente modificados, o que causou grande surpresa. Dentre estes está o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, que é de competência federal.

 

É sabido que o IPI é imposto extrafiscal, ou seja, utilizado para fins de controle da economia. Neste sentido, assim como outros tributos - Imposto de Importação (II), Imposto de Exportação (IE), Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) - o IPI tem função de incentivar ou desestimular a economia nacional, o que acontece por meio do aumento ou diminuição de alíquotas.

 

Em razão desta condição específica, até antes da Emenda Constitucional nº 42/03, estes tributos poderiam ser alterados pelo Executivo, configurando-se exceção aos princípios constitucionais da legalidade e anterioridade.

 

De acordo com o princípio da legalidade - artigo 150, I da CF/88 - é vedado à União, aos Estados e aos Municípios, exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça. Contudo, a União Federal, no tocante aos tributos extrafiscais acima mencionados, não precisa cumprir esta determinação, o que significa que apenas nestes casos a instituição ou majoração de tributo poderá ocorrer por mero Decreto.

 

O princípio da anterioridade, por sua vez, impede a cobrança do tributo no mesmo ano em que este tenha sido instituído ou aumentado. Por este princípio, o tributo somente pode ser exigido no primeiro dia do exercício seguinte à sua modificação. Esta observação temporal não é necessária em relação aos tributos extrafiscais, que podem ser exigidos no dia seguinte em que forem instituídos ou aumentados.

 

Isto é, todos os tributos extrafiscais, nos termos da Constituição Federal/88, poderiam ser instituídos ou majorados sem qualquer preocupação com o veículo formal pelo qual era feita a alteração e sem respeitar prazo mínimo para que esta entrasse em vigor. A Constituição Federal garantia este tratamento diferenciado na intenção de possibilitar ao governante, o controle da economia. Entretanto, a Emenda Constitucional nº 42/03 alterou a extrafiscalidade do IPI.

 

A nova redação da Constituição modificou o citado princípio da anterioridade. A modificação foi favorável ao contribuinte e determinou que, além de a exigência ocorrer no ano seguinte, também deverá respeitar o lapso de 90 (noventa) dias entre a instituição/majoração do tributo e a cobrança. Ou seja, o tributo somente poderá ser exigido no ano seguinte e passados noventa dias da publicação da norma que o aumentou ou instituiu.

 

Como não poderia deixar de ser, os tributos considerados extrafiscais foram excluídos desta determinação, até porque não há razão para um tributo que foi criado em vista de situações emergenciais e de controle da economia, ficar limitado a prazo para cobrança. A exceção foi feita em relação ao IPI, que teve a si aplicado o dispositivo que prevê a necessidade de aguardar-se 90 (noventa) dias da publicação da lei para a exigência do tributo.

 

Todavia, neste ponto, o § 1º, do artigo 150 da Constituição Federal, consiste em verdadeiro contra-senso. Isto porque o IPI, por ser tributo extrafiscal, também não está sujeito ao princípio da legalidade. Logo, pode ter suas alíquotas alteradas por simples ato do Poder Executivo, do que se conclui que as alíquotas do IPI poderão não ser aumentadas por Lei, mas por Decreto.

 

Nestes termos, existem três hipóteses possíveis ao caso (i) se a alíquota for majorada por lei somente poderá ser exigida após 90 dias de sua majoração; (ii) se a alíquota for alterada por decreto, poderá ser exigida imediatamente ou (iii) independentemente de ser instituída por lei ou decreto, somente poderá ser exigida após 90 dias da publicação da norma, seguindo a máxima que determina "quem pode o mais, pode o menos".

 

A questão acaba por gerar grandes possibilidades de discussão, pois caso as alíquotas do IPI sejam majoradas e imediatamente exigidas por ato do Poder Executivo, poderão ser contestadas em face da anterioridade nonagesimal trazida pela Reforma Tributária. Até porque, se não houve menção expressa retirando o IPI dentre o rol daqueles que devem obedecer a anterioridade nonagesimal, assim como foi realizado com os demais tributos extrafiscais, e sendo a Lei instrumento normativo de maior complexidade hierárquica que o Decreto, de acordo com a interpretação sistêmica da Constituição Federal, a aplicação dos mencionados 90 (noventa) dias mostra-se inevitável.

 

Ademais, não há discrímen que justifique a diferenciação do tratamento constitucional simplesmente em razão de a majoração ou instituição do IPI ser realizada por meio de Decreto e não Lei.

 

Conclui-se, portanto, que, o IPI transformou-se no primeiro imposto submetido unicamente à anterioridade nonagesimal, uma vez que até então esta característica limitava-se às contribuições sociais.

 

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*Advogada do escritório Stuber - Advogados Associados

 

 

 

 

 

 

 

 

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