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Saída em Cartório

Matheus Carneiro Assunção

Como jazia escrito na frase de abertura das Migalhas nº. 1.528 (5.1.2007), há quem compare o casamento a uma fortaleza sitiada: os que estão do lado de fora querem entrar e os que estão dentro desejam sair. No plano jurídico, as portas de saída dessa fortaleza dantes eram controladas exclusivamente por uma senhora de olhos vendados, que costuma carregar consigo uma balança com pratos alinhados e andar lentamente: a Justiça brasileira. Por outro lado, o movimento das portas de entrada, largas e de acesso mais fácil, podia ser conduzido tanto pela autoridade judicial, quanto pela autoridade religiosa, desde que efetuada a habilitação prévia ou posterior perante o competente Cartório de Registro Civil, ficando a cargo dos interessados tal escolha.

quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Atualizado em 30 de janeiro de 2007 15:32


Saída em Cartório

Matheus Carneiro Assunção*

Como jazia escrito na frase de abertura das Migalhas n° 1.528 (5/1/07 - clique aqui), há quem compare o casamento a uma fortaleza sitiada: os que estão do lado de fora querem entrar e os que estão dentro desejam sair. No plano jurídico, as portas de saída dessa fortaleza dantes eram controladas exclusivamente por uma senhora de olhos vendados, que costuma carregar consigo uma balança com pratos alinhados e andar lentamente: a Justiça brasileira. Por outro lado, o movimento das portas de entrada, largas e de acesso mais fácil, podia ser conduzido tanto pela autoridade judicial, quanto pela autoridade religiosa, desde que efetuada a habilitação prévia ou posterior perante o competente Cartório de Registro Civil, ficando a cargo dos interessados tal escolha.

Em ambas as hipóteses de entrada, apenas há de passar pela porta quem for capaz e não possuir impedimentos legais (como a existência de outro vínculo matrimonial), nem causas suspensivas (como a pendência de homologação da partilha dos bens do casal no divórcio), circunstâncias cuja apuração deve passar pelo crivo do Ministério Público e do juiz. Contudo, se mesmo o controle da entrada - naturalmente rígido para evitar casamentos nulos ou anuláveis - pode ser acionado extrajudicialmente, por que somente através da autoridade judiciária ocorrer a saída, quando inexiste lide (pretensão resistida), interesses de filhos incapazes a serem tutelados, e as partes estão de pleno acordo quanto às condições da separação ou do divórcio?

A pergunta reverberava sem resposta até recentemente. Mas ano novo é sempre tempo de leis novas, e no dia 5 de janeiro de 2007 entrou em vigor a Lei nº. 11.441 (clique aqui), a qual permite a realização de separações e divórcios consensuais por meio de escritura pública. É a saída extra que faltava para aqueles que, além do insucesso do matrimônio, ainda precisavam enfrentar o trâmite de um processo judicial para consumar, no mundo jurídico, o que no mundo dos fatos consumado estava.

O redesenho dos procedimentos da separação e do divórcio consensuais se insere em um cenário de diversas reformas no Código de Processo Civil, tendentes a conferir maior celeridade à prática de atos comuns da vida cotidiana, como a cobrança de dívidas, a divisão de bens de pessoa falecida, e também o fim de relacionamentos conjugais.

Já era hora. Quando um casamento termina amigavelmente, tudo que se quer é rapidez no trâmite da papelada. E o recém-nascido artigo 1.124-A do Código de Processo Civil (clique aqui), acrescentado pela Lei nº. 11.441/2007, viabiliza essa celeridade, pondo fim à exclusividade da via judicial para condução do epílogo matrimonial. Não havendo filhos menores ou incapazes, e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão agora as separações e os divórcios consensuais ocorrer via Cartório, mediante escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e partilha dos bens comuns, à pensão alimentícia e ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro, ou manutenção do nome adotado quando se deu o casamento. A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis. Entretanto, o tabelião somente a lavrará se os interessados estiverem assistidos por advogado, cuja qualificação e assinatura deverão constar do ato notarial, o qual será gratuito aos que se declararem pobres sob as penas da lei.

A nova saída é muito bem vinda, e promete ser até mais procurada do que a sobrecarregada porta do Judiciário. Mas aconselha-se tentar evitá-la sempre que possível, preservando-se a fortaleza e os habitantes que dentro dela encontram felicidade.

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* Membro de Lima & Falcão Advogados, em Recife (PE), integrado a Demarest e Almeida Advogados










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