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Inspeção veicular e terceirização

Tema interessante, que tem com freqüência sido alvo da curiosidade dos Administrativistas, diz respeito à possibilidade de execução, de forma terceirizada, dos trabalhos de vistoria e inspeção de veículos usados. De logo cabe assinalar que a inspeção veicular constitui a avaliação técnica periódica das condições de segurança e funcionamento dos veículos automotores (automóveis, ônibus, caminhões etc), com o objetivo de reduzir o elevadíssimo número de acidentes - um dos maiores do mundo - que levam ao óbito, no país, milhares de pessoas por ano.

sexta-feira, 30 de abril de 2004

Atualizado em 29 de abril de 2004 09:36

Inspeção veicular e terceirização

 

Sérgio Guerra

Valmir Pontes Filho*

Tema interessante, que tem com freqüência sido alvo da curiosidade dos Administrativistas, diz respeito à possibilidade de execução, de forma terceirizada, dos trabalhos de vistoria e inspeção de veículos usados. De logo cabe assinalar que a inspeção veicular constitui a avaliação técnica periódica das condições de segurança e funcionamento dos veículos automotores (automóveis, ônibus, caminhões etc), com o objetivo de reduzir o elevadíssimo número de acidentes - um dos maiores do mundo - que levam ao óbito, no país, milhares de pessoas por ano.

Acrescente-se, ainda, o fato de que, segundo o Código de Trânsito Brasileiro, ao licenciar seu veículo o proprietário deverá comprovar sua aprovação nas inspeções de segurança veicular e de controle de emissões de gases poluentes e de ruído. Em vista dessa exigência legal, em março de 1998 a Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT publicou a NBR 14.040, que estabeleceu as diretrizes básicas para a inspeção veicular.

Desde então, uma série de questionamentos tem impedido, aqui e acolá, a efetividade da inspeção veicular no Brasil, principalmente no que tange à discussão em torno da competência para a prestação desse serviço, ou seja, se tal competência seria da União ou dos Estados-membros e, até mesmo, dos Municípios.

 

É de lembrar que a Constituição de 1988 definiu competir privativamente à União legislar sobre determinadas matérias, ressalvando, porém, a possibilidade de, mediante autorização de lei complementar federal, poderem os Estados-membros editar normas sobre questões específicas das matérias relacionadas no aludido artigo, a exemplo do trânsito e transporte.

 

Importa destacar, nesse contexto, que a Lei Suprema cuidou de entregar a todos os entes federados as denominadas competências comuns, de índole politico-administrativa, indicadas no art. 23. Conforme dispõe o inciso XII dessa normativa, os Estados-membros possuem competência para estabelecer e implantar a política de educação para a segurança do trânsito.

 

Nesse contexto, pelo conduto da Lei Federal nº 9.503 de 23 de setembro de 1997 foi instituído o Código Nacional de Trânsito, que atribuiu a todos os cidadãos brasileiros o direito à segurança no trânsito, cabendo aos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito o dever de adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito.

 

Cumpre mencionar que, conforme o art. 5º da referida norma, o Sistema Nacional de Trânsito é composto pelos órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, os quais têm por finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalidades.

 

Acrescente-se, ainda, que conforme o prescrito no art. 8º da Lei sob análise, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão os respectivos órgãos e entidades executivas de trânsito, estabelecendo os limites circunscricionais de suas atuações. Vale notar que o inciso III, do art. 22 da Lei em comento estabeleceu a competência dos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal para as atividades de inspeção quanto às condições de segurança veicular, registro, emplacamento e selo de emplacamento, mediante delegação do órgão federal competente.

 

Entretanto, é de superlativa importância relembrar que a inspeção veicular "de segurança" ainda se encontra pendente de regulamentação pelo CONTRAN. Isso porque a Resolução nº 84/1998, expedida pelo mencionado Conselho, teve sua eficácia suspensa por outra norma exarada pelo mesmo Conselho de Trânsito - a Resolução nº 107/1999.

 

No que respeita, entretanto, à inspeção de segurança, é certo afirmar-se que se trata de uma atividade de polícia administrativa de competência originária federal, delegável aos Estados (e ao Distrito Federal). E, mesmo que ainda pendente de regulamentação, pode e deve essa inspeção ser exercida, de forma que se empreste plena eficácia aos parágrafos 2º e 3º do artigo 131 do Código de Trânsito Brasileiro. Que se trata, essa atividade, de uma daqueles denominadas de polícia administrativa (ou que envolvem o exercício do "poder de polícia"), não há dúvida.

 

Igualmente induvidoso é que, já na Resolução nº 84/1998, do CONTRAN - cuja eficácia restou suspensa pela Resolução nº 107/1999 - se previa o exercício de tal atividade por concessionário, mediante prévia licitação. Hipótese questionável, de vez que não se está, como dito, diante de um serviço público, mas do exercício do comumente chamado "poder de polícia". Mas, independentemente disto, parece fora de dúvida o fato de que ela, a atividade de inspeção (de segurança) veicular, tem natureza tipicamente estatal.

 

Isto, porém, não exclui a possibilidade de que as atividades auxiliares da fiscalização ou inspeção veicular sejam exercidas por terceiros, particulares, de modo a atender às exigências legais e regulamentares pertinentes a essa mesma inspeção.

 

Cabe, então distinguir entre o reconhecimento ou certificação oficial de que o veículo atende aos requisitos de segurança, estando em condições de trafegar, e a atividade técnica destinada a verificar se esse atestado pode ou não ser conferido. Esta última, de caráter instrumental, pode ser delegada; a primeira, não, já que só pode ser exercida por órgão dotado de prerrogativas inerentes ao Poder Público.

 

Nada impede, pois, a atribuição a particulares dessas atividades técnicas, auxiliares ou instrumentais, de simples verificação, com base nas quais a entidade pública emitirá a declaração de conformidade (habilitando ao exercício de um direito) ou aplicará alguma sanção, no caso de desconformidade.

 

Possível, assim, parece ser a contratação, pelo Poder Público, de terceiros para realizar essa atividade auxiliar, ou instrumental, prévia à certificação, pelos órgãos estaduais de trânsito, da segurança de veículos usados.

 

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* Advogados do escritório Siqueira Castro Advogados

 

 

 

 

 

 

 

 

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