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Sociedades empresárias X sociedades uniprofissionais

Marcelo Trussardi Paolini e Renata Correia

A Constituição Federal de 1988 outorgou aos Municípios a competência para, observada a disciplina de lei complementar com índole nacional, instituir o Imposto sobre Serviços (ISS).

quinta-feira, 19 de agosto de 2004

Atualizado em 18 de agosto de 2004 12:39

Sociedades empresárias X sociedades uniprofissionais


Marcelo Trussardi Paolini,

Renata Correia*


A Constituição Federal de 1988 outorgou aos Municípios a competência para, observada a disciplina de lei complementar com índole nacional, instituir o Imposto sobre Serviços (ISS). Sensível à constatação de que certos serviços podem ser explorados tanto de forma pessoal, como mediante a organização do capital, o legislador, quando disciplinou o ISS, por meio da Lei Complementar nº 58/87, tratou de modos distintos as sociedades "de trabalho" - sociedades em que os sócios, empregados ou não, efetivamente contribuem com o exercício de uma atividade única (sendo, portanto, chamadas de uniprofissionais) - das sociedades de pessoas, comuns, e, sem dúvida, daquelas de capital, em que os sócios se limitam à contribuição de uma parcela do capital.

O regime geral de tributação consiste na aplicação de uma alíquota variável, de 2% a 5%, sobre a receita bruta efetivamente auferida com a prestação dos serviços, enquanto que o regime especial se caracteriza, como regra geral, pelo recolhimento com base em um valor fixo por profissional habilitado da sociedade.

O Município de SP, ao regulamentar, por meio da Lei nº 13.701/03, a Lei Complementar n.º 116/03, que disciplina o ISS em âmbito nacional, manteve a tributação diferenciada para as chamadas sociedades uniprofissionais, limitadas aos seguintes serviços, ora genericamente citados: medicina, análises clínicas, enfermagem, terapia ocupacional, psicologia, fisioterapia, fonoaudiologia, obstetrícia, odontologia, medicina veterinária e zootecnia, engenharia, agronomia, arquitetura, advocacia, auditoria e contabilidade.

Não basta, todavia, que a sociedade desempenhe um dos referidos serviços. É necessário, além disso, para manutenção do caráter pessoal da atividade, conforme decisões sacramentadas em diversos julgados do STF, que todos os sócios estejam profissionalmente habilitados para a consecução do objeto social (RE nº 82.724-CE) e que a sociedade não esteja organizada sob forma empresarial (RE 104.204-SP, AgRg/AI 94.654-SP, AI 90.410-SP, RE 99.266-9-RS).

Vale dizer, ainda, que o Município de SP, ao disciplinar a matéria, estabeleceu uma série de requisitos para que a sociedade possa ser considerada uniprofissional e se sujeite ao regime especial em questão, quais sejam: (i) não tenha como sócio pessoa jurídica; (ii) não seja sócia de outra sociedade; (iii) não desenvolva atividade diversa daquela a que estejam habilitados profissionalmente os sócios; (iv) não tenha sócio que dela participe tão-somente para aportar capital ou administrar; (v) não explore mais de uma atividade de prestação de serviços.

Por outro lado, é mister relembrar que, com o advento do novo Código Civil (NCC), o Direito Privado brasileiro passou a formalmente adotar a teoria da empresa do Direito italiano, em contraposição à teoria dos atos de comércio do Direito francês. Segundo a teoria da empresa, referida nos arts. 966 e 982 do NCC, a sociedade não mais se classifica segundo a natureza de sua atividade (prestação de serviços versus compra e venda), mas sim, de acordo com a existência ou não de organização empresarial para a produção ou circulação de bens ou serviços.

Assim, uma sociedade uniprofissional, no regime anterior, deveria necessariamente ser considerada como prestadora de serviços e, como tal, sujeita a registro perante o Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, ou perante órgão de classe específico, como no caso das sociedades de advogados. No entanto, de acordo com o regime atual, a sociedade prestadora de serviços deve ser classificada como empresária, caso sua estrutura se sobreponha à prestação de cada sócio, ou como simples, caso a sua organização empresarial não seja relevante.

A importância de tal discussão reside no fato de que a exploração dos serviços sob a forma empresarial exclui o caráter pessoal, que é característica marcante e pré-requisito das sociedades uniprofissionais; por via de conseqüência, pode eliminar a possibilidade de aplicação da forma especial de apuração do ISS, conforme determinações das normas regulamentares da atividade e da legislação local aplicável.

Com efeito, visto que o prazo de adaptação das sociedades às normas do NCC foi prorrogado pela Lei 10.838/04, para janeiro/05, quando se tratar de prestadora de serviços, passível de ser enquadrada como uniprofissional, convém aos sócios, concomitantemente à análise do viés empresarial da sociedade, atentar para o fato de que o conceito societário de sociedade empresária, derivado do Código Civil italiano de 1942, é antagônico à conceituação fiscal e ao regime especial de tributação pelo ISS, reservados à sociedade uniprofissional.
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* Advogados do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados





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