Crucifixo no STF

21/7/2004
Renato Kleber Borba, advogado

"Causou-me espécie o texto de autoria do juiz gaúcho Roberto Arriada Lorea questionando a presença de um crucifixo no Plenário do STF, cujo trecho foi recentemente veiculado por Migalhas. Oportunas e esclarecedoras as notas dos doutores José Levi Mello do Amaral Júnior e Milton Córdova Júnior, rebatendo aquele primeiro. De fato, tanto o conjunto arquitetônico em que a peça sacra foi introduzida, quanto as leis do crucificado e sua inegável influência sobre a figura do julgador corroboram a tese da manutenção do crucifixo. Ocorre que a presença da discutida peça se faz não por uma razão de ecumenismo religioso, mas porque representa “o símbolo doloroso do erro judiciário”. Essa é a lição inserta no velho e sempre novo “Eles, os Juízes, vistos por um Advogado”, de Piero Calamandrei, adiante transcrita na íntegra:

“O crucifixo não compromete a austeridade das salas dos tribunais; eu só gostaria que não fosse colocado, como está, atrás das costas dos juízes. Desse modo, só pode vê-lo o réu, que, fitando os juízes no rosto, gostaria de ter fé na sua justiça; mas, percebendo depois atrás deles, na parede do fundo, o símbolo doloroso do erro judiciário, é levado a crer que ele o convida a abandonar qualquer esperança – símbolo não de fé, mas de desespero. Dir-se-ia até que foi deixado ali, às costas dos juízes, de propósito para impedir que estes o vejam. Em vez disso, deveria ser colocado bem diante deles, bem visível na parede em frente, para que o considerassem com humildade enquanto julgam e nunca esquecessem que paira sobre eles o terrível perigo de condenar um inocente.”

 

A meu ver, portanto, o símbolo, que não é de fé, mas de desesperança para com a atuação da justiça humana, dada falibilidade dos membros que a compõem, deve ser mantido como está, tanto no STF quanto nas diversas salas de audiência das capitais e do interior – confesso que não conheço uma em que não esteja – a cumprir sua função. Afinal de contas, de acordo com o mesmo mestre italiano, “os juízes são como membros de uma ordem religiosa: é preciso que cada um deles seja um exemplo de virtude, se não quiser que os crentes percam a fé”."

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