Operação Satiagraha

15/7/2008
Alexandre Pires dos Santos - funcionário público, São Paulo/SP

"Não li a Folha de sábado (12/7/2008), mas pela manhã, ao acordar, indignado com tão gritante e vergonhosa situação, escrevi para meus amigos o e-mail que ora encaminho, inclusive com erros gramaticais que o calor da minha revolta não me permitiram corrigir. Somente agora, lendo este rotativo, tive notícia de que alguém apontou o fato de nossa Constituição ter sido rasgada pelo digno Ministro Gilmar Mendes e atirada ao lixo. Justo ele, que deveria ser o guardião máximo da nossa Carta Maior. Pergunto-me até quando calaremos.

'Caros amigos, bom dia!

Sempre fui um relapso estudante de direito. Quem me conheceu na época da faculdade sabe bem disso. Por isso sinto-me afligido por angustiantes dúvidas quando assisto a alguns fatos que se desenrolam de forma tão singela neste nosso lindo País.

A Constituição Federal determina que o Supremo julgará originariamente o HC  quando o paciente for o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros, Procurador –Geral da República, Ministros de Estado, Comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica, membros dos Tribunais Superiores, Tribunal de Contas da União e chefes de missão diplomática (art. 102, I, d).

Daniel Dantas exerce alguma das funções acima descritas?  Perdi essa.

Em todo caso, O Exmo. Sr. Dr. Min. Gilmar Mendes conheceu dois HC impetrados em favor de Daniel Dantas.

Em 27/6/2008, a Min. Ellen Gracie assim decidiu:

DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO STJ. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. 1. O Superior Tribunal de Justiça não tratou da questão referente ao regime inicial de cumprimento da pena, considerando inclusive a circunstância do regime fechado ter sido estabelecido na sentença. 2. Falece competência ao Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar habeas corpus contra ato de juiz de 1º grau, sob pena de supressão de instância, em completo desvirtuamento do ordenamento jurídico brasileiro em tema relativo à competência dos órgãos do Poder Judiciário, notadamente da Suprema Corte. 3. Habeas corpus não conhecido. (HC 93462 / DF - DISTRITO FEDERAL HABEAS CORPUS Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE)

Peço-vos, então, que iluminem minha ignorância, porque na minha parca compreensão dos fatos, perdi alguma coisa. Deve ter sido por conta da provas que entreguei em branco, repletas de poesia. Ou das cervejadas do D.A e das rodas de violão.

Será que a conta bancária de Dantas e o fato de ter meio Congresso no bolso ajudou nesse tipo de situação?

Tava aqui lembrando daquela garota de 15 anos que ficou presa, por umas duas semanas,  numa cela com mais 20 marmanjos e foi violentada e tudo mais. Será que ela não conseguiu um HC do Min Gilmar Mendes porque não tinha saldo suficiente para pagar um advogado com escritório nos Jardins ou na Av. Paulista? Ou porque era nordestina e pobre?

Não, não deve ser isso. Em nosso país esse tipo de coisa não é levado em conta. Não existem cidadãos de primeira e segunda categoria. Não existe preconceito. Não existe discriminação de classes. Não, eu devo estar bêbado e talvez eu continue assim porque assim consigo me olhar no espelho.

'No Caminho, com Maiakóvski

 

Eduardo Alves da Costa

 

Assim como a criança

humildemente afaga

a imagem do herói,

assim me aproximo de ti, Maiakóvski.

Não importa o que me possa acontecer

por andar ombro a ombro

com um poeta soviético.

Lendo teus versos,

aprendi a ter coragem.

 

Tu sabes,

conheces melhor do que eu

a velha história.

Na primeira noite eles se aproximam

e roubam uma flor

do nosso jardim.

E não dizemos nada.

Na segunda noite, já não se escondem:

pisam as flores,

matam nosso cão,

e não dizemos nada.

Até que um dia,

o mais frágil deles

entra sozinho em nossa casa,

rouba-nos a luz, e,

conhecendo nosso medo,

arranca-nos a voz da garganta.

E já não podemos dizer nada.

 

Nos dias que correm

a ninguém é dado

repousar a cabeça

alheia ao terror.

Os humildes baixam a cerviz;

e nós, que não temos pacto algum

com os senhores do mundo,

por temor nos calamos.

No silêncio de meu quarto

a ousadia me afogueia as faces

e eu fantasio um levante;

mas amanhã,

diante do juiz,

talvez meus lábios

calem a verdade

como um foco de germes

capaz de me destruir.
 

Olho ao redor

e o que vejo

e acabo por repetir

são mentiras.

Mal sabe a criança dizer mãe

e a propaganda lhe destrói a consciência.

A mim, quase me arrastam

pela gola do paletó

à porta do templo

e me pedem que aguarde

até que a Democracia

se digne aparecer no balcão.

Mas eu sei,

porque não estou amedrontado

a ponto de cegar, que ela tem uma espada

a lhe espetar as costelas

e o riso que nos mostra

é uma tênue cortina

lançada sobre os arsenais.

 

Vamos ao campo

e não os vemos ao nosso lado,

no plantio.

Mas ao tempo da colheita

lá estão

e acabam por nos roubar

até o último grão de trigo.

Dizem-nos que de nós emana o poder

mas sempre o temos contra nós.

Dizem-nos que é preciso

defender nossos lares

mas se nos rebelamos contra a opressão

é sobre nós que marcham os soldados.
 

E por temor eu me calo,

por temor aceito a condição

de falso democrata

e rotulo meus gestos

com a palavra liberdade,

procurando, num sorriso,

esconder minha dor

diante de meus superiores.

Mas dentro de mim,

com a potência de um milhão de vozes,

o coração grita - Mentira!'
 

Abraços.'"

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