Operação Satiagraha

16/7/2008
Paulo Rodrigues Duarte Lima – advogado, OAB/CE Nº. 19.979 - Quixeramobim/CE

"Algumas breves considerações sobre a operação em tela:

1. A princípio, gostaria de elogiar as colocações de todos os colegas migalheiros/migalheiras que estão participando dos debates (a favor ou contra as decisões do 'ministro-presidente' do STF e sobre a operação), pois tenho a crença firme que: a) os magistrados de primeira instância terão preservadas suas autonomias e independências funcionais, mas passarão a concordar menos com tudo que vem da Polícia Federal ou do MP, pois, em alguns casos, parece-me que os magistrados agem como meros marionetes da Polícia, quase como se fosse um 'braço' avançado de um estado policialesco, ou seja, uma extensão do 'corpo' policial, mesmo sem intencionalidade para tal. Atitude desastrosa que deve ser combatida e alertada; b) as denominadas 'prisões processuais' e suas espécies do gênero, serão concedidas ou deferidas, após criteriosa avaliação, pois não se pode fazê-las de espetáculo nem querer substituir a 'prisão pena' antes do tempo devido; c) novas leis vão advir contra o abuso de autoridades, novas leis coibindo, explicitamente, atos abusivos e ilegais contra os advogados no seu mister, desempenho legal e constitucional, bem como um novo Código de Processo Penal alinhado ao vetor constitucional e ao norte do nosso Direito Constitucional e ao seu princípio cardeal: o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana - Fundamento da República; d) nova lei de interceptação telefônica acabará por vir ao mundo jurídico, já que a atual se tornou obsoleta e ultrapassada com novos tipos penais para quem desobedecê-la, ou para quem efetuar escutas ou interceptações ao largo da legislação; e) os magistrados, policiais/delegados/agentes e os membros do ministério público serão mais cautelosos no trato com a imprensa e menos 'midiáticos' e mais discretos; f) a própria imprensa, vide artigo do sempre ponderado e simpático Alberto Dines hoje no 'Observatório da Imprensa', que vi pela TV ontem à noite (clique aqui), debaterá e repensará seu papel importantíssimo em um estado democrático de direito e sua relação com os poderes constituídos; g) a utilização de algemas será, finalmente, regulamentada, pois já é tempo para isso; h) Os limites da atuação policial terão de ser bem delineados, bem como sua formação acadêmica e profissional deverão revistas. Não podemos por causa de poucos, colocar a perder trabalhos tão bem elaborados por dignos componentes da nossa Polícia Federal. Não podemos ter uma polícia de governo, mas sim uma polícia de Estado. Nem podemos facções rivais dentro da própria Polícia Federal se digladiando pelo poder. Enfim, não vejo com visão negativa esses acontecimentos, mas com visão prospectiva, mas com pés no chão, no sentido de esperar o aperfeiçoamento das legislações e instituições. Não haverá um golpe de estado, nada disso... O fato é que do jeito que estão as coisas não se pode continuar, mas elas mudarão na nossa incipiente democracia dentro das próprias normas do jogo democrático. Eleições se avizinham, votemos, então, em candidatos íntegros e honestos, não mais naqueles com uma ficha criminal com condenações transitadas em julgado extensa! Parabenizo, especialmente, aos que fizeram colocações às quais pessoalmente alinho-me, como Democrata, Advogado Criminalista e Professor de Direito Constitucional que sou. Dou meus parabéns, em especial, àqueles que são desejosos de ver a Justiça Brasileira funcionando, e bem, no Brasil, mas com respeito às mais sagradas garantias constitucionais (conseguidas com muito sacrifício, suor, lágrimas e sangue), pois a 'lei maior' e as outras hierarquicamente inferiores, não foram feitas para proteger Daniel Dantas, ou outro ser humano especificamente escolhido, mas para proteger os cidadãos comuns das possíveis, ou eventuais, arbitrariedades do Estado detentor da mão pesada do jus persequendi e jus puniendi que pode, injustamente, impedir a sonhada/desejada 'liberdade humana' tão necessária a uma vida digna. Deve-se e pode-se restringi-la (a liberdade) nos casos realmente necessários e, somente, após um processo constitucional, legal e justo, do início ao fim, e para um bem maior da coletividade;

2. Ao migalheiro José Donizeti Sampaio, respondo que a Polícia Federal, não se sabe por qual motivo, resolveu alcunhar a operação em comento em 'Satiagraha' cuja etimologia, ou origem e evolução do vocábulo vem do termo que foi usado pelo pacifista indiano Mahatma Gandhi durante sua campanha pela independência da Índia em relação ao Reino Unido. Em sânscrito (língua indo-européia do ramo indo-ariano na qual foram escritos os quatro Vedas (c. 1200-900 a.C.), e que, entre os séculos VI a.C. E XI d.C., se tornou a língua da literatura e da ciência hindus; é mantida, ainda hoje, por razões culturais, como língua constitucional da Índia), Satya significa 'verdade'. Agora, agraha quer dizer 'firmeza'. Assim, Satiagraha é a 'firmeza na verdade', ou 'firmeza da verdade'. Satiagraha significa o princípio da não-agressão, ou uma forma não-violenta de protesto, como um meio de se fazer uma revolução. Satiagraha é traduzido do sânscrito, também, como 'caminho da verdade' ou 'busca da verdade'. Assim pode-se entender, também, satyagraha como a 'busca da verdade', o 'insistir pela verdade'.

3. São frases de Martin Luther King: 'O que me preocupa não é o grito dos maus. É O silêncio dos bons.'; 'É melhor tentar e falhar, que preocupar-se e ver a vida passar. É Melhor tentar, ainda que em vão que sentar-se, fazendo nada até o final. Eu prefiro na chuva caminhar, que em dias frios em casa me esconder. Prefiro ser feliz embora louco, que em conformidade viver'; e 'É errôneo servir-se de meios imorais para alcançar objetivos morais.' Assim, cara colega, estagiária e acadêmica de Direito (por enquanto, tão somente por enquanto - já que nesses dias será advogada, delegada, juíza, promotora de justiça, ou outra profissão de sua escolha) Ana Cláudia Medeiros Teixeira (UFMG), eu posso testemunhar que já passei pelo sentimento que lhe aflige, pois quando era acadêmico de Direito na UFRJ em 1998, e, após isso, em 2000 já na UFRN, eu, quase, desisti de lutar por um mundo mais justo e abandonar o meu curso de Direito, por causa de um acontecimento jurídico que abalou a vida de centenas de pessoas no Rio de Janeiro/RJ e chocou o país à época, e que, hoje, passados mais de dez anos, ainda se arrasta na Justiça Brasileira, refiro-me ao 'Caso do Edifício Palace'. Que fiz eu para não desistir? Estudei muito para fazer a minha parte na mudança de um mundo melhor, não perfeito, mas melhor. No meu caso, não poderia deixar de aproveitar para expressar meu preito de gratidão ao meu ex-professor de Direito Tributário Adilson Gurgel na UFRN (ex-presidente da OAB/RN e, hoje, Conselheiro Federal, que me disse: '... Venha para a OAB e faça sua parte! Não desista e nem se acomode...' E eu para lá me encaminhei, fui para a Comissão de Direitos Humanos da seccional potiguar para: brigar; defender; ajudar necessitados; interagir, em prol do bem comum, com outros segmentos da sociedade; lutar contra as injustiças... À época, ainda, acadêmico de Direito e ainda permaneci por mais dois anos como advogado naquela comissão... Assim, cara Ana Cláudia, digo-lhe como advogado que se formou apenas alguns anos antes do que você vai se formar, e professor que sou: não esmoreça, persevere, entenda que as novas gerações sempre irão renovar, oxigenar e aperfeiçoar o atual estado de coisas. Não existe 'cachorros grandes' eternos, eles se vão um dia, existem, isso sim, exemplos bons e de honestidade a serem seguidos e homenageados, bem como exemplos de condutas desonrosas a serem rechaçadas e guardadas na sua memória para, jamais, cair no mesmo erro. Saiba que se sua crença no 'justo' for verdadeira, ela não passará após a formatura. Muito menos o ego substituirá o justo... Isso só acontece, na maioria das vezes, com aqueles que sempre tiveram seus egos inflados, desde os tempos dos bancos escolares... Estude, estude, e estude!! Você e seus amigos e colegas são a Esperança do país mais justo no amanhã! Esperança essa, que nos dizeres do Escritor e Religioso Católico, Padre Antonio Vieira, é a mais doce companheira da alma!

4. Em arremate final, convido a todos que façam suas anotações, enviem suas sugestões construtivas aos órgãos pertinentes, mas não deixem de comparecer em Natal-RN em outubro próximo, na XX Conferência Nacional de Advogados com Tema: 'Estado Democrático de Direito X Estado Policial. Dilemas e desafios em duas décadas da Constituição.' Programação disponível em (clique aqui).

Saudações humanísticas e cordiais,"

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