Lei do Abate

17/10/2004

"Prezados Senhores: Sou engenheiro estrutural e não deveria dar palpites num boletim para advogados. Minha filha é estudante de Direito e, sabendo-me leitor compulsivo, inscreveu-me no Migalhas. Usualmente, leio-o com prazer e concordo com quase todo o material apresentado. Mas entrei em parafuso quando li o parágrafo abaixo:

Nas mãos de Deus

A situação das empresas aéreas torna os passageiros cada vez mais temerários. A julgar verdadeira a frase do já saudoso Fernando Sabino de que "os homens se dividem em duas espécies: os que têm medo de viajar de avião e os que fingem que não têm" (Migalhas 984 - 10/8/04), a coisa vai piorar ainda mais a partir de domingo, data em que entra em vigor a Lei do Abate.

Perguntaram certa vez a um lorde inglês: "O senhor não acha um despropósito que se enforque um homem por ter roubado um cavalo?" A resposta que o autor do parágrafo acima deveria conhecer foi: "Existe um grave equívoco na sua pergunta. Não se enforca um homem por ter roubado um cavalo. Enforca-se um homem que roubou um cavalo para que cavalos não sejam roubados." Admitindo que os traficantes sejam suficientemente ousados para desobedecer duas ou três ordens, é bem provável que "os cavalos parem de ser roubados" a partir do terceiro abate. E, nesse caso, cessam também os abates. Parece-me que o redator subverte completamente a situação ao afirmar que "a coisa vai piorar ainda mais a partir de domingo, data em que entra em vigor a Lei do Abate" Ora, ninguém vai atirar num avião que segue instruções. A "Lei do Abate" só será letal para os ocupantes de aeronaves que se recusarem a seguir os caças interceptadores. Atenciosamente,"

Paulo Sérgio Pinto

Nota da Redação - Caro migalheiro, é uma honra tê-lo como leitor. Fazemos (pelo menos tentamos fazer) um trabalho eclético, para atingir uma gama de leitores e atrair pessoas interessadas em discussões com fundo jurídico. Ademais, o Direito é feito para a população, e não apenas para os profissionais que o operam. Quanto a você ter dito que entrou em parafuso (coisa típica de engenheiro mesmo), a análise é simples. Nosso ordenamento jurídico (e nesse ponto não é possível mudar, a não ser que se faça uma revolução constitucional) proíbe a pena de morte. E, pelo que se vê, a famigerada lei do abate é, às escancaras, uma de pena de morte com julgamento via radioamador.

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