MIGALHAS QUENTES

  1. Home >
  2. Quentes >
  3. As razões pelas quais a Editora Planeta fechou um acordo com o cantor Roberto Carlos

As razões pelas quais a Editora Planeta fechou um acordo com o cantor Roberto Carlos

x

Da Redação

terça-feira, 8 de maio de 2007

Atualizado às 08:20


Detalhes de um acordo

As razões do acordo celebrado com o cantor Roberto Carlos

A advogada da Editora Planeta, Rosa M. B. Brandão Bicker, de Brandão e Bicker Advogados Associados, enviou o texto abaixo à redação de Migalhas esclarecendo as razões pelas quais a Editora fechou um acordo com o cantor Roberto Carlos.

As razões do acordo celebrado com o cantor Roberto Carlos

"Muitos têm perguntado porque a Editora Planeta e o autor Paulo César celebraram acordo que culminou na apreensão do livro Roberto Carlos em Detalhes. A resposta é simples: a justiça brasileira, diferentemente da justiça norte-americana, por exemplo, não privilegia a liberdade de expressão. Ambas as partes do processo judicial estavam amparadas por garantias constitucionais, sendo que ambas as garantias estão, inclusive, asseguradas pelo mesmo artigo da Constituição Federal, o quinto.

Roberto Carlos ingressou com duas ações, uma cível na comarca do Rio de Janeiro, na qual pedia a proibição da venda do livro e uma indenização por danos, e uma criminal na comarca de São Paulo, na qual também pedia a proibição da venda do livro e a condenação do autor e de dois representantes da editora no crime de difamação. Assim que o cantor ingressou com a ação no Rio de Janeiro obteve em caráter liminar uma decisão a seu favor. Nessa decisão, o juiz da causa já demonstrava que o processo estava perdido para a Editora, pois fundamentou a decisão assim :

"A biografia de uma pessoa narra fatos pessoais, íntimos, que se relacionam com o seu nome, imagem e intimidade e outros aspectos dos direitos da personalidade. Portanto, para que terceiro possa publicá-la, necessário é que obtenha a prévia autorização do biografado, interpretação que se extrai do art. 5º, inciso X, da Constituição da República, o qual dispõe serem invioláveis a intimidade, a vida privada e a imagem das pessoas. No mesmo sentido e de maneira mais específica, o art. 20, caput, do Código Civil/02, é claro ao afirmar que a publicação de obra concernente a fatos da intimidade da pessoa deve ser precedida da sua autorização, podendo, na sua falta, ser proibida se tiver idoneidade para causar prejuízo à sua honra, boa fama ou respeitabilidade. Registre-se, nesse ponto, não se desconhecer a existência de princípio constitucional afirmando ser livre a expressão da atividade intelectual e artística, independentemente de censura ou licença (inciso IX do mesmo art. 5º). Todavia, entrecruzados estes princípios, há de prevalecer o primeiro, isto é, aquele que tutela os direitos da personalidade, que garante à pessoa a sua inviolabilidade moral e de sua imagem. Além do mais, conforme mansa jurisprudência, não está compreendido dentro do direito de informar e da livre manifestação do pensamento a apropriação dos direitos de outrem para fins comerciais. Assim, presente a plausibilidade do direito alegado pelo autor da causa, ante a necessidade da sua prévia autorização para a publicação e para a exploração comercial da sua biografia. Presente, ainda, o requisito do receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I, do CPC), na medida em que, não concedida a medida ora pleiteada, permanecerá a comercialização da obra, fazendo com que novas pessoas tomem conhecimento de fatos cujo sigilo o autor quer e tem o direito de preservar. Ante o exposto, defiro a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar aos réus a interrupção da publicação, da distribuição e da comercialização do livro 'Roberto Carlos em Detalhes', em todo o território nacional, no prazo de três dias, sob pena do pagamento de multa diária de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais)".

Inicia-se aqui o primeiro ponto contra a editora e o autor. Imediatamente estes ingressaram com recurso visando a reforma dessa decisão. No recurso, pediam a imediata suspensão daquela ordem de proibição, mas o Relator do processo - Dr. Pedro Raguenet indeferiu essa suspensão imediata e a proibição valeria até o julgamento final do recurso. Outro ponto contra a editora e o autor. Apurou-se, ainda, em pesquisa realizada no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que o Dr. Pedro Raguenet não seguia, a principio, a linha da liberdade de expressão, pois havia condenado recentemente a Rede Globo a indenizar Doca Street em 250 mil reais. Foi feita ampla pesquisa de jurisprudência nos Tribunais Estaduais e também no Superior Tribunal de Justiça e apurou-se que a balança pendia para a prevalência do direito de intimidade sobre o direito de liberdade de expressão, não havendo sequer um processo envolvendo livro com jurisprudência pacificada a favor de autor, embora fossem encontradas, obviamente, diversas decisões a favor da liberdade de expressão expressas em jornais e revistas.

Mesmo com toda essa situação desfavorável, o autor e a editora estavam firmes na posição de levar adiante a luta. A gota d'água, porém, ocorreu naquela tarde fatídica de 27/4 perante a justiça criminal. O juiz da causa, juntamente com dois promotores, determinaram que as partes seriam primeiramente ouvidas sem os respectivos advogados, conforme faculta o artigo 520 do Código de Processo Penal. Nessa ocasião o autor e os representantes da editora foram diversas vezes advertidos dos riscos que corriam. O juiz chegou a dizer que fecharia a editora na segunda-feira seguinte, caso o Diretor Geral, que sequer havia sido citado para aquela audiência, não comparecesse. Os promotores enfatizaram os riscos de "carregarem um processo criminal nas costas".

Após mais de 5 horas de debates e, percebendo a Editora que o seu futuro já estava selado, achou que um acordo seria a única salvação.

No agravo de instrumento interposto (v. abaixo) o autor e a Editora lutaram pela prevalência do direito de liberdade de expressão. Na defesa da ação cível (v. abaixo) também o fizeram. Infelizmente, percebendo a tempestade se aproximando, não tiveram tempo de ver esse direito prevalecer.

Nós, defensores do autor e da editora Planeta amargamos, juntamente com todos os brasileiros defensores da liberdade, profunda frustração."

Rosa Maria B Brandão Bicker

______

Veja mais

Agravo de Instrumento - clique aqui.

Contestação - clique aqui.

Íntegra do termo de conciliação - clique aqui

Reportagem do Fantástico da Rede Globo- clique aqui

_____________