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Troca de e-mails - Ministros do STF especulam sobre votação no processo do mensalão

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Da Redação

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Atualizado em 23 de agosto de 2007 14:37


Supremo chat

 

Ministros do STF especulam sobre votação no processo do mensalão

 

O jornal O Globo de ontem, 23/8, em matéria de capa, contava que no primeiro dia do julgamento do caso do mensalão no Supremo, que aconteceu no dia 22/8, uma troca de mensagens de computador entre os ministros Ricardo Lewandowski e Carmen Lúcia chamou a atenção.

 

Para entender o caso, confira abaixo:

  • Jornal O Globo do dia 23/8
  • Nota da OAB
  • Comentários do presidente da Câmara Arlindo Chinaglia
  • Nota do STF
  • Editorial: Invasão de privacidade - JB de 24/8

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Jornal O Globo do dia 23/8

 

 

 

 


Troca de e-mails

No primeiro dia do julgamento do caso do mensalão no STF, uma troca de mensagens de computador entre os ministros Ricardo Lewandowski e Carmen Lúcia revelou conversas sobre detalhes de seus votos, confidências sobre a decisão de outro colega e até um possível reflexo do julgamento na sucessão do ministro Sepúlveda Pertence (aposentado recentemente). Nas mensagens, há reclamações sobre o novo presidente da 1 ª Turma do STF, Marco Aurélio de Mello, e declarações sobre o poder de influenciar, no próximos três anos, decisões entre os distintos grupos que compõem o tribunal. É o que revela reportagem de 'O Globo' nesta quinta-feira.

O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, fazia a sustentação oral da acusação quando os dois ministros iniciariam um bate-papo pela intranet. A conversa, que durou horas e foi captada pelas lentes dos fotógrafos que acompanhavam o julgamento, contém indícios de que os dois ministros pretendem rejeitar parte da denúncia, desqualificando crimes imputados pelo Ministério Público a alguns dos acusados.

A conversa começou às 11h57. Separados por três metros, eles aprovam as palavras do procurador: "Ele está - corretamente - jogando para a platéia", escreve Lewandowsky. "É, e tentativa de mostrar os fatos e amarrar as situações para explicar o que a denúncia não explicou...", comenta Carmen. Pouco mais de 30 minutos depois, Lewandowski se rende: "Carmen: impressiona a sustentação do PGR".

A ministra sugere uma reunião com assessores dos dois gabinetes. Os ministros indicam que pretendem aceitar, em parte, a denúncia. Uma das dúvidas se refere ao crime de peculato - uso de cargo público para apropriação ilegal de recursos ou bens. Lewandowski não está seguro se o crime pode ser imputado aos que não ocupavam cargo público à época - como José Genoino (então presidente do PT) e Silvio Pereira (ex-secretário-geral do PT) - ou não eram donos do dinheiro que circulou pelo valerioduto. A denúncia pede que eles sejam processados como co-autores.

"Minha dúvida é quanto ao peculato em co-autoria ou participação, mesmo para aqueles que não são funcionários públicos ou não tinham a posse direta do dinheiro", diz ele. A dúvida é discutida em seguida com seu assessor, Davi de Paiva Costa. O assessor reafirma sua posição, mas se põe à disposição para alterar o voto do ministro. Lewandowski firma posição: "Não, vamos ficar firmes nesse aspecto. manifestei apenas uma dúvida".

"O Cupido não vai aceitar nada"

Por volta das 16h, Lewandowski fala da nomeação do substituto de Pertence. Um dos mais cotados é o ministro do Superior Tribunal de Justiça Carlos Alberto Direito. Carmen diz: "Lewandowski, uma pessoa do STJ (depois lhe nomeio) ligou e disse [...] para me dar a notícia do nomeado (não em nome dele, como é óbvio) [...] mas a resposta foi que lá estão dizendo que os atos sairiam casados (aposent. e nom.) [aposentadoria e nomeação] e que haveria uma [...] de posse na sala da Professora e, depois, uma festa formal por causa [...] Ela (a que telefonou) é casada com alguém influente".

Em seguida, Carmen conta: "[...] O Cupido (sentado ao lado da ministra estava Eros Grau) acaba de afirmar aqui do lado que não vai aceitar nada (ilegível)". Lewandowski mostra-se confuso com a mudança repentina de assunto: "Desculpe, mas estou na mesma, será que estamos falando da mesma coisa[?]", pergunta ele. Ela esclarece: "Vou repetir: me foi dito pelo Cupido que vai votar pelo não recebimento da den. [denúncia] entendeu?"

O ministro responde que compreendeu. E comenta: "Ah. Agora, sim. Isso só corrobora que houve uma troca. Isso quer dizer que o resultado desse julgamento era realmente importante [cai a conexão do computador]". Carmen diz que o alertara antecipadamente e recebeu o comentário: "Interessante, não foi a impressão que tive na semana passada. Sabia que a coisa era importante, mas não que valia tanto", escreveu Lewandowski.

A conversa segue com uma avaliação de Carmen: "Não sei, Lewandowski, temos ainda três anos de 'domínio possível do grupo', estamos com problema na turma por causa do novo chefe[o novo chefe da primeira turma do STF, da qual os dois fazem parte, é o ministro Marco Aurélio Melo], vai ficar (ilegível) e não apenas para mim e para v. [você] principalmente para mim, mas também acho, para os outros (Carlos e J.)[Carlos Ayres Brito e Joaquim Barbosa, este pertencente à segunda turma]. Esse [Joaquim Barbosa, relator do caso] vai dar um salto social agora com esse julgamento e o Carlinhos está em lua de mel com os dois aqui do lado".

Carmen pede ao assessor Franke José Soares Rosa cópias de outras decisões para, se possível, recusar a acusação de formação de quadrilha contra um dos acusados. Enquanto os dois ministros trocavam confidências, Joaquim Barbosa lia notícias e artigos na internet. Um deles na Rádio do Moreno, do jornalista Jorge Bastos Moreno, no Globo On line.

Os advogados de defesa dos acusados de participação no esquema que ficou conhecido como mensalão repetiram no STF os argumentos usados anteriormente para defender seus clientes. Eles procuraram desqualificar a denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, sob o argumento de que não há provas para que seus clientes sejam acusados de crimes como formação de quadrilha, corrupção e peculato.

Antes dos advogados, falaram o ministro do STF Joaquim Barbosa, relator do processo, e o procurador-geral da República. Antonio Fernando defendeu que o processo seja transformado em ação penal no STF e reiterou todas as 40 denúncias apresentadas. Segundo ele, os denunciados tiveram conduta "típica do submundo do crime".

Jefferson: procurador 'joga com o governo'

De longe, mas atento, o deputado federal cassado Roberto Jefferson acompanha lance a lance a apreciação, pelo STF, da denúncia contra os envolvidos no esquema do mensalão. Em seu blog, o ex-deputado, pivô do escândalo, acusa o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, de se aliar ao PT. Jefferson reclama da inclusão de seu nome na denúncia.

- Embora tenha incluído o nome de ministros e da cúpula do partido na denúncia do mensalão, pois não havia como deixar de fazê-lo, o procurador-geral, Antonio Fernando de Souza, joga com o governo do PT. Deixou isso claro quando incluiu meu nome, me descredenciando, impedindo-me de avançar, mesmo reconhecendo que tudo que eu dissera tinha sido comprovado - diz o ex-deputado, no blog.

Um dia depois de tratar do tema em seu blog, o ex-deputado José Dirceu vagueou por outras áreas. Comemorou, por exemplo, a proposta feita pelo pré-candidato democrata à Casa Branca Barack Obama, de mudar a política norte-americana em relação a Cuba. Em um artigo no jornal "Miami Herald", Obama defende, entre outra propostas, a autorização de um número maior de visitas de americanos a Cuba, restrita hoje a uma vez a cada três anos. Dirceu também reclama do arquivamento de uma investigação na Assembléia Legislativa de São Paulo.

Nota da OAB

O presidente nacional da OAB, Cezar Britto, afirmou que "o Brasil não pode virar um imenso Big Brother, em que a privacidade seja banida". Veja íntegra da nota divulgada pela OAB.

"O Brasil não pode virar um imenso Big Brother, em que a privacidade seja banida. Sem privacidade, não há liberdade. Ela é uma de suas manifestações mais elementares.

A rede Intranet é recurso mundialmente adotado para facilitar a comunicação interna - nas empresas e nas instituições. Como o telefone, é ferramenta de uso privado.

O Supremo Tribunal Federal a adota para que os ministros possam, em âmbito estrito e pessoal, trocar impressões reservadas a respeito do processo em julgamento. Não há ilegalidade nisso.

Ilegal - e chocante - é o fato de tais conversas serem violadas por meio de fotografias à tela dos computadores, algo tão inaceitável quanto colocar grampo entre os magistrados e advogados para capturar o teor de suas conversas.

Não bastasse a truculência policial de colocar grampos ambientais em escritórios de advocacia, violando a lei do sigilo profissional, concebida para proteger o cliente, viola-se agora a intimidade do próprio juiz e do julgamento.

Não será surpresa se, em breve, começarem a colocar grampos nos confessionários católicos para violar o segredo religioso da confissão. É preciso prudência para que tais anomalias não se transformem em prática corriqueira e adquiram contornos de legitimidade.

Não podemos cair num Estado de bisbilhotagem, cujo desdobramento inevitável é o Estado Policial, ambos incompatíveis não apenas com o Estado democrático de Direito, mas com os próprios fundamentos da civilização."

Comentários do presidente da Câmara Arlindo Chinaglia

Ao fazer uma analogia com a Medicina, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, considerou normal a troca de mensagens pela intranet feita por ministros do STF.

"Faço uma comparação com a Medicina. É normal que dois médicos troquem opiniões a respeito do que chamam de 'caso', com todo o respeito ao paciente. Ali [no STF], por analogia, imagino que eles estavam trocando idéias a respeito do que está sendo analisado a partir da representação feita pelo procurador-geral da República. Sob esse aspecto, acho mais que normal que ministros troquem opiniões sobre o mérito da matéria", afirmou Chinaglia.

Ao ser perguntado sobre o resultado do julgamento, o presidente da Câmara respondeu não ter expectativas. "A matéria de O Globo, inclusive, retrata que mesmo os ministros, com conhecimento e experiência, ao fazerem indagações a si próprios, a outros ministros ou até mesmo à assessoria, mostra que eles estão refletindo", avaliou.

Chinaglia afirmou não estar acompanhando esse julgamento, por não ter tempo. Disse que, no máximo, faz uma leitura da resenhas dos jornais sobre o assunto. "Esse não é o nosso papel. O papel de julgar é do STF", declarou.

Nota do STF

NOTA DE ESCLARECIMENTO

A Secretaria de Comunicação Social do Supremo Tribunal Federal esclarece que a informação publicada na página de notícias do STF na noite de quarta-feira (22/8) a respeito do acesso dos fotógrafos ao Plenário da Corte foi um equívoco. Ao final do primeiro dia de julgamento do Inquérito 2245, cogitou-se restringir a entrada desses profissionais, uma vez que os intensos disparos dos flashes ao longo de todo o dia causaram incômodos aos ministros.

Enquanto o assunto era levado à avaliação da presidente do STF, ministra Ellen Gracie, um assessor da Coordenadoria de Imprensa publicou a nota precipitadamente. A decisão da ministra Ellen Gracie foi a de não autorizar nenhum tipo de restrição ao trabalho dos jornalistas e garantir o livre acesso dos fotógrafos, mantendo a transparência com que se realizam todas as sessões do Supremo Tribunal Federal.

Brasília, 23 de agosto de 2007.

D. Kaiser

Secretário de Comunicação Social do Supremo Tribunal Federal

Editorial: Invasão de privacidade - JB de 24/8

Editorial: Invasão de privacidade

"Assim como a sociedade não tolera qualquer tipo de censura, tampouco aceita excessos da parte de veículos de comunicação. A violação do conteúdo de mensagens particulares trocadas entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), estampada ontem na primeira página de um jornal carioca, é um desses exageros que ultrapassam os limites éticos do jornalismo.

Enquanto ouviam os argumentos dos advogados de defesa na primeira sessão de julgamento dos 40 denunciados pela formação do esquema do mensalão, na quarta-feira, dois integrantes da Suprema Corte - o ministro Ricardo Lewandowski e a ministra Carmen Lúcia - tiveram a tela de seus computadores devassada pelas lentes de um repórter-fotográfico. Por meio de correio eletrônico instantâneo, trocavam mensagens de cunho profissional, acerca da audiência em questão e sobre outros temas pertinentes ao STF. Atitude trivial e rotineira em qualquer ambiente de trabalho - seja um escritório, uma redação de jornal ou mesmo um tribunal.

Supunham os ministros que a intimidade de suas conversas estaria preservada - senão pela distância obsequiosa dos presentes à sessão, ao menos pelos mais elementares direitos do homem, o livre pensar. Estavam enganados. O conteúdo dos textos privados tornou-se público e ganhou as manchetes, carregadas em tintas sensacionalistas. O ato, imediatamente, despertou o repúdio da sociedade. Faz pensar numa reedição, generalizada, do odioso macarthismo - que assombrou a sociedade americana no auge da Guerra Fria.

Como sintetizou o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, a violação das conversas dos ministros por meio de fotografias é ilegal e chocante. "Algo tão inaceitável quanto colocar grampo entre os magistrados e advogados para capturar o teor de suas conversas", acrescentou.

O advogado lembra que o dispositivo de troca de mensagens (intranet) foi adotado pelo STF para que os ministros possam compartilhar impressões reservadas a respeito do processo em julgamento - portanto, não há ilegalidade na troca de informações. E adverte: "Não podemos cair num Estado de bisbilhotagem, cujo desdobramento inevitável é o Estado Policial, ambos incompatíveis não apenas com o Estado democrático de direito, mas com os próprios fundamentos da civilização".

Homens da estatura moral e de comprovado saber jurídico como o ex-ministro da Justiça Célio Borja chegam a sugerir o fim do livre acesso de fotógrafos à sala do júri, durante as sessões. Tudo para evitar a repetição de cenas (e manchetes) como as apresentadas ontem.

A fim de que se evite chegar a uma situação extrema e indesejável - que configure a volta dos tempos de cerceamento ao trabalho da imprensa - é necessário que os meios de comunicação social reflitam sobre os limites da liberdade de que dispõem no Estado democrático em que vivemos. E não ultrapassem a linha (cada vez mais tênue ante o avanço das tecnologias) que divide o público do privado.

O mais importante agora é que os magistrados da Suprema Corte mantenham a serenidade exigida pelo cargo e não desviem o foco da questão central: o julgamento do que se acredita ser um dos mais bem articulados esquemas montados para assaltar os cofres públicos. Este, sim, merecedor de acompanhamento contínuo e implacável dos meios de comunicação."

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