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TJ/SP tranca ação penal contra advogado acusado de calúnia por juíza

A 16ª câmara de Direito Criminal do TJ/SP concedeu HC para trancamento de ação penal contra o advogado Hector Luis Borecki Carrillo por calúnia, impetrado pela OAB/SP em favor do inscrito. O processo foi movido pela juíza da 2ª vara da Família de Osasco/SP, que o acusava de afrontar sua honra ao fazer denúncia contra advogado ex-adverso, que lhe proferiu insultos durante audiência, não sendo impedido pela juíza.

Da Redação

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Atualizado às 08:50


Habeas Corpus

TJ/SP tranca ação penal contra advogado acusado de calúnia por juíza

A 16ª câmara de Direito Criminal do TJ/SP concedeu HC para trancamento de ação penal contra o advogado Hector Luis Borecki Carrillo por calúnia, impetrado pela OAB/SP em favor do inscrito. O processo foi movido pela juíza da 2ª vara da Família de Osasco/SP, que o acusava de afrontar sua honra ao fazer denúncia contra advogado ex-adverso, que lhe proferiu insultos durante audiência, não sendo impedido pela juíza.

A sustentação oral e os memoriais foram feitos pelo advogado Maurício Silva Leite, da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB/SP, que argumentou que o advogado citou o nome da magistrada apenas para narrar os fatos incontroversos entre ele e o advogado da parte contrária em processo sigiloso à Comissão de Prerrogativas da Ordem, ficando afastada, portanto, a intenção de ofender a juíza.

Para Maurício Leite, a análise das expressões tidas como ofensivas descaracteriza o crime de calúnia, que exige para sua configuração a falsa imputação de "fato definido como crime". A decisão do relator, desembargador Borges Pereira, apontou que a denúncia não preenchia os requisitos previstos no art. 41 do CPP (clique aqui) "não descrevendo, de forma clara e precisa, os fatos imputados ao ora paciente, caracterizando, portanto, constrangimento legal sanável pela via do remédio heroico".

"Mais uma vez a OAB/SP cumpre seu papel de defender as prerrogativas profissionais do colega, pedindo o trancamento da ação por falta de justa causa, uma vez que não houve intenção de ofensa, mas que buscava apenas retratar uma situação acontecida durante audiência", ressaltou o presidente da OAB/SP, Luiz Flávio Borges D'Urso.

Segundo o presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas, Antonio Ruiz Filho, a Comissão "tem atuado sempre que advogados sejam processados criminalmente apenas por exercerem seu mister regularmente. E, muitas vezes, no exercício da profissão, o advogado precisa ser severo na sua conduta, sem que isto possa ser considerado ofensa e crime".

Veja abaixo a íntegra da decisão.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus n° 0452129-68.2010.8.26.0000, da Comarca de Osasco, em que é paciente HECTOR LUIZ BORECKI CARRILLO e Impetrante DIEGO MOUTA SAMARTINO.

ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "CONCEDERAM A ORDEM IMPETRADA PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL N° 2009.047521-7, QUE TRAMITA PERANTE A 3a VARA CRIMINAL DE OSASCO.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores ALMEIDA TOLEDO (Presidente) e NEWTON NEVES.

São Paulo, 01 de março de 2011.

BORGES PEREIRA

RELATOR

16ª CÂMARA CRIMINAL

HABEAS CORPUS n° 0452129-68.2010

COMARCA: OSASCO

IMPETRANTE: DIEGO MOUTA SAMARTINO

PACIENTE: HECTOR LUÍS BORECKI CARRILLO

Voto n° 13.284

Habeas Corpus - Paciente acusado de infringir o disposto no artigo 138 do Código Penal - Alegação de falta de justa causa para a ação penal - Admissibilidade - Denúncia narra fatos que não configuram ilícito penal - Paciente que apenas redigiu representação contra advogado da parte contrária perante a Comissão de Ética e Disciplina da OAB, formulada e dirigida exclusivamente em processo sigiloso, para eventual conduta antiética, sem a intenção de ofender a honra da MM. Magistrada, ainda que as palavras referentes à sua conduta tenham sido colocadas de modo ríspido e sem parcimônia - Ausência de animus caluniandi, sendo esta a finalidade especial de ofender a honra alheia, afigurando-se em fato atípico constrangimento ilegal caracterizado - Ordem concedida para o trancamento da ação penal.

O Advogado Dr. DIEGO MOUTA SAMARTINO impetra o presente "habeas corpus", com pedido de liminar, em favor de HECTOR LUÍS BORECKI CARRILLO, qualificado nos autos, apontando como autoridade coatora a MM. Juíza de Direito da 3a Vara Criminal da Comarca de Osasco.

Argumenta o d. impetrante, em síntese, que diante dos termos da representação criminal apresentada pela MM. Juíza de Direito da 2a Vara da Família de Osasco, o paciente teria afrontado a sua honra, ao narrar, em petição encaminhada ao Tribunal de Ética da OAB/SP, denúncia contra advogado ex-adverso. Assevera que o paciente apenas narrou os fatos ocorridos, em petição dirigida ao Tribunal de Ética Profissional, sem a intenção de ofender a honra de quem quer que seja, exercendo apenas seu Múnus Público, constitucionalmente garantido. Esclarece que visando defender os seus direitos, o paciente narrou fielmente os fatos, criticando a atuação da MM. Magistrada, que no entender dos subscritores da denúncia não exerceu com rigor o poder de polícia, nos termos do artigo 445 e 446, ambos do CPC. Aduz que após a Juíza ser comunicada dos termos da representação administrativa pelo Advogado denunciado, esta, entendendo presente a falsa imputação do crime de prevaricação e, por conseguinte, a suposta prática do delito previsto no artigo 138 do Código Penal, representou criminalmente contra o réu ora paciente. Argumenta que o despacho que recebeu a denúncia pela autoridade apontada como coatora representa inegável constrangimento ilegal sanável pela via do remédio heróico, eis que a conduta do paciente, evidentemente, foi atípica. Ressalta que não há justa causa para a ação penal. Culmina por pleitear a concessão da ordem para que seja determinado o trancamento da ação penal por falta de justa causa, reconhecendo-se a manifesta atipicidade dos fatos narrados.

A liminar foi indeferida (fls. 151/153), o D. Magistrado de 1º Grau prestou informações às fls. 156, e a douta Procuradoria Geral de Justiça às fls. 158/165, opinou pela denegação da ordem.

RELATADOS

O ora paciente HECTOR LUÍS BORECKI CARRILO foi denunciado como incurso no artigo 138 "caput", c.c. o artigo 141, inciso II, ambos do Código Penal, porque, de acordo comflo representante do "parquet", teria afrontado a honra da MM. Juíza de Direito da 2a Vara da Família de Osasco, ao narrar, em petição encaminhada ao Tribunal de Ética da OAB/SP, denúncia contra advogado ex-adverso.

Pretende o D. Impetrante, via o presente remédio heróico, a concessão da ordem a fim de que seja trancada a ação penal.

A impetração ressalta que o paciente apenas narrou os fatos ocorridos, em petição dirigida ao Tribunal de Ética Profissional, sem a intenção de ofender a honra de quem quer que seja, exercendo apenas seu Múnus Público, constitucionalmente garantido.

Acrescenta que visando defender os seus direitos, o paciente narrou fielmente os fatos, criticando a atuação da MM. Magistrada, que no entender dos subscritores da denúncia não exerceu com rigor o poder de polícia, nos termos do artigo 445 e 446, ambos do CPC.

A ordem merece acolhimento, assistindo razão ao impetrante.

Isto porque, evidenciou-se que o paciente ao dirigir-se ao Tribunal de Ética Profissional, não teve, em momento algum, a intenção de ofender a honra a MM. Magistrada, apenas e tãosomente criticou a conduta da MM. Magistrada, pois, no seu modo de ver, esta não tomou as devidas providências para cessar os ataqutes realizados pelo advogado da parte contrária.

Ainda que as referidas palavras constantes da representação tenham sido colocadas de modo ríspido e sem parcimônia, verifica-se ausência de dolo na conduta perpetrada pelo réu ora paciente, ou seja, não atribuiu ou responsabilizou falsamente a MM. Magistrada pela prática de algum fato definido como crime.

Com efeito, o núcleo do tipo do crime pelo qual o paciente pede o trancamento da ação penal é o verbo imputar, que significa atribuir, responsabilizar alguém pela prática de algum fato, sendo certo que a imputação deve ser falsa e o fato definido como crime.

Assim, não se vislumbra, no caso vertente, que o suposto delito de calúnia perpetrado pelo paciente consistiria na prática do delito de prevaricação pela nobre Julgadora, eis que apenas houve a notícia por meio de petição dirigida ao Presidente do Tribunal de Ética da OAB/SP, em processo siqiloso, dos insultos proferidos pelo advogado da parte contrária, constando ainda que, na peça aludida, mencionado causídico não fora impedido pela MM. Magistrada que presidiu a audiência.

Assim, é correto afirmar que houve apenas a narrativa dos fatos, sendo atípica a conduta do paciente.

Apenas sucedeu o ânimo de narrar, de defender, de criticar, não importando na intenção de ofender a honra objetiva da Magistrada, restando excluído o elemento subjetivo do tipo e, por conseguinte, a tipicidade penal.

De acordo com o entendimento doutrinário de ÁLVARO MAYRINK DA COSTA, "... O crime de calúnia é punível a título de dolo (animus calumniandi) direto (consciência da falsidade) ou eventual (dúvida de falsidade), em relação ao tipo básico, e apenas direto nas formas de propalar e divulgar. Exige-se na figura fundamental o especial fim de agir, não sendo admitida a modalidade culposa. Há possibilidade da configuração típica pela presença do dolo eventual, que não se confunde com a razoável suspeita, desde que ocorra dúvida, incerteza; atua assumindo o risco de criar condições à lesividade da honra alheia. (Direito Penal - Parte Especial - pág.277 5a Edição)...

Confira-se, na mesma linha, em casos análogos, o entendimento jurisprudencial ora colacionado:

Trata-se de habeas corpus impetrado pela OAB em favor de advogado, objetivando o trancamento da ação penal contra ele movida, por crime de calúnia (artigo 138 c/c o artigo 141, III, do CP). A Turma concedeu a ordem, por entender que ficou evidenciada, de pronto, a ausência do intuito do paciente, no exercício da defesa de seu cliente em juízo, em ofender a honra do querelante. Assim, mister se faz o trancamento da ação penal ante a falta do elemento subjetivo imprescindível para a caracterização do delito de calúnia. No cumprimento do seu dever de ofício, ou seja, na ação restrita à causa de seu patrocínio, o advogado tem a cobertura de imunidade profissional, em se tratando de crimes contra a honra (Lei n° 8.906/1994, artigo 7o, parágrafo segundo). Precedente citado: RHC 11.474- MT, DJ 4/2/2002.(STJ - HC n° 34.606 - SP - Rei. Min. Paulo Medina - J. 01.06.2006).

Deve ser concedida a Ordem de Habeas Corpus para o trancamento, por falta de justa causa, de Ação Penal que imputa ao acusado o crime de calúnia quando as expressões dirigidas ao querelante, Promotor de Justiça, tidas por ofensivas, ainda que deselegantes e impróprias, apenas representam um compreensível desabafo do querelado contra a atitude do Representante Ministerial que, após ter excedido em muito o prazo para manifestar-se em outra Queixa-Crime ajuizada pelo ora acusado, permitiu que o prazo decadencial se expirasse, opinando depois pela rejeição da queixa por vício formal que entendia não poder ser sanado exatamente pela ocorrência da decadência, pois o momento era de justificável indignação.(TACrimSP - HC n° 360.732/0 - Guaratinguetá - 13a Câm. - Rei. Roberto Mortari - J. 9.5.2000 - v.u).

Por falta de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para determinar o trancamento de inquérito policial militar instaurado contra o paciente pela suposta prática dos crimes de calúnia e injúria em face de militares da Academia da Força Aérea.

Tratava-se, na espécie, de aluno da Escola de Cadetes da Força Aérea que tivera seu pedido de readmissão em curso de formação denegado, havendo ajuizado, por meio de advogado, medida cautelar, a qual servira de base para a instauração do mencionado inquérito policial. A Turma considerou que o advogado apenas narrou os fatos para proceder à defesa de seu cliente, não havendo utilizado expressões atentatórias contra a honra dos militares da força aérea, salientando, ainda, que, ao paciente não pode ser imputada ofensa que, se existente, teria sido praticada por seu advogado no exercício profissional.(STF - HC n° 81.482-SP - Rei. Min. limar Galvão - J. 16.4.2002).

Ausente, desse modo, a finalidade especial de ofender a honra alheia (elemento subjetivo do tipo), afigurando-se em fato atípico.

Como bem salientou o percuciente representante da OAB/SP, nos memoriais apresentados:

"...Ora, Excelência, se a representação foi formulada e dirigida exclusivamente em processo sigiloso à Comissão de Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil, em que o paciente cita o nome da Nobre Magistrada apenas para narrar os fatos incontroversos entre ele e o advogado da parte contrária, fica afastada a intenção de ofender a Nobre Magistrada. Por outro lado, a análise das expressões tidas como ofensivas descaracteriza o crime de calúnia, que exige, para sua configuração, a falsa imputação de "fato definido como crime". O texto atribuído ao advogado paciente pode ser tido, em tese, como deselegante ou até desrespeitoso, porém tais circunstâncias não o tornam passível de enquadramento na figura jurídica de calúnia, cuja adequação típica exige inequívoca imputação de fato definido como crime...."...."

Depreende-se, portanto, que a denúncia não preenche os requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal, não descrevendo, de forma clara e precisa, os fatos imputados ao ora paciente, caracterizando, portanto, constrangimento ilegal sanável pela via do remédio heróico.

Isto posto, CONCEDE-SE A ORDEM de habeas corpus impetrada em favor de HECTOR LUÍS BORECKI CARRILLO, para trancar a Ação Penal n° 2009.047521-7, que tramita perante a 3ª Vara Criminal de Osasco.

BORGES PEREIRA

Relator

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