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A exclusividade na relação entre médicos e operadoras de planos de saúde

A Agência Nacional de Saúde Suplementar ("ANS") e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica ("CADE") estão atuando em conjunto contra as operadoras de planos de saúde que impedem os médicos de atenderem por outras operadoras, o que vem sendo chamado de unimilitância.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Atualizado em 26 de janeiro de 2010 13:35


A exclusividade na relação entre médicos e operadoras de planos de saúde

Fabio Appendino*

Luis Gustavo Miranda*

A Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE estão atuando em conjunto contra as operadoras de planos de saúde que impedem os médicos de atenderem por outras operadoras, o que vem sendo chamado de unimilitância.

Em 9 de dezembro de 2009, o Cade aprovou a Súmula 7 estabelecendo que "constitui infração contra a ordem econômica a prática, sob qualquer forma manifestada, de impedir ou criar dificuldades a que médicos cooperados prestem serviços fora do âmbito da cooperativa, caso esta detenha posição dominante".

Por sua vez, em 15 de dezembro de 2009, a ANS informou que expediu ofícios a 85 (oitenta e cinco) operadoras de planos de saúde estabelecendo prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para que todas as cooperativas médicas e odontológicas inserissem em seus estatutos sociais artigo com a seguinte redação:

"Nenhum dispositivo deste Estatuto deverá ser interpretado no sentido de impedir os profissionais cooperados de se credenciarem ou referenciarem a outras operadoras de planos de saúde ou seguradoras especializadas em saúde, que atuam regularmente no mercado de saúde suplementar, bem como deverá ser considerado nulo de pleno direito qualquer dispositivo estatutário que possua cláusula de exclusividade ou de restrição à atividade profissional".

Segundo a ANS, essa medida tem como objetivo garantir a não ocorrência da unimilitância, o que seria vedado pela lei 9.656/1998 ("Lei de Planos de Saúde" - clique aqui) e pela lei 8.884/1994 ("Lei de Defesa da Concorrência" - clique aqui). A ANS alerta que, ao final do prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, se mantido o descumprimento, promoverá a alienação compulsória da carteira de beneficiários das operadoras em até 30 (trinta) dias.

Apesar da investida da ANS e do CADE, a questão ainda é controvertida em razão de particularidades existentes na relação entre médicos e operadoras de planos de saúde, sobretudo quando não há simples contrato de prestação de serviços e sim uma relação societária ou quando o médico exerce cargos de administração nas operadoras.

A Lei de Planos de Saúde veda às operadoras, independente de sua natureza jurídica, impor contratos de exclusividade ou restrições à atividade profissional.

Contudo, a lei não disciplina a relação societária entre o cooperado e a cooperativa. Ao vedar contratos de exclusividade ou restrições à atividade profissional, a lei não concede liberdade absoluta e irrestrita ao prestador de serviços. Pelo contrário, a Lei de Planos de Saúde deve ser compatibilizada com outras normas vigentes, incluindo o Código Civil (clique aqui) e a Lei 5.764/71 ("Lei das Cooperativas" - clique aqui).

A Lei das Cooperativas garante que o ingresso nas cooperativas é livre a todos, desde que adiram aos propósitos sociais e preencham as condições estabelecidas no estatuto. Nesse sentido, o STJ já manifestou que "o cooperado que adere a uma cooperativa médica submete-se ao seu estatuto, podendo atuar livremente no atendimento de pacientes que o procurem, mas vedada a vinculação a outra congênere, conforme disposição estatutária".

Além disso, a lei estabelece que não poderão ingressar no quadro das cooperativas os agentes de comércio e empresários que operem no mesmo campo econômico da sociedade, justamente para evitar situações de conflito de interesses que levam ao rompimento do pacto cooperativo.

Aliás, cabe lembrar que um dos propósitos históricos do pacto cooperativo é justamente garantir a força da união de cooperados para concorrer no mercado contra as sociedades empresárias. Como já bem sintetizou a Ministra Nancy Andrighi do STJ, a "finalidade do pacto cooperativo - impedir que o associado exerça 'qualquer atividade considerada prejudicial à cooperativa ou que conflite com seus objetivos' - é evidente: potencializar o sucesso econômico da união cooperativa".

A vinculação de cooperado com sociedade concorrente cria embaraços para a competitividade da cooperativa com outras operadoras de plano de saúde, já que possibilita o acesso e o uso de informações de um agente da economia pelo seu concorrente. Ora, como sócio que é, o cooperado tem direito de acesso às informações financeiras, administrativas e mercadológicas da cooperativa, sendo legítimas as disposições estatutárias que procurem afastar as situações de conflitos de interesses, especialmente quando ele exerce cargos de administração.

Deve ser observado, ainda, que a opção pela cooperativa não restringe a prestação de serviços médicos em caráter particular, impedindo apenas a contração com sociedade operadora de planos de saúde que seja concorrente.

Do ponto de vista da defesa da concorrência, a vedação só pode ser considerada uma infração quando capaz de restringir a entrada ou atuação de empresa concorrente no mercado geográfico envolvido, o que só pode ser identificado em cada caso concreto. Em outras situações, a questão foge à competência do CADE e passa a ser uma lide privada, visto que a coletividade é a titular do bem jurídico tutelado pela Lei de Defesa da Concorrência.

Outro ponto que merece análise é a determinação de alienação da carteira de clientes. Tal medida, apesar de prevista na Lei de Planos de Saúde, parece excessivamente gravosa e desproporcional quando não há demonstração cabal de grave risco à continuidade ou à qualidade do atendimento à saúde dos usuários. Ao contrário, parece-nos que os efeitos dessa medida é que colocam em risco a continuidade e a qualidade do atendimento à saúde dos usuários, além de ferir a livre iniciativa e o princípio cooperativista.

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*Sócio e advogado da área societária do Rolim, Godoi, Viotti & Leite Campos Advogados

 

 

 

 

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