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A penhora on line nas execuções fiscais

Luiz Gustavo Bichara e Manuella Falcão

Em 9 de fevereiro de 2005, foi publicada a Lei Complementar nº 118, que introduziu o artigo 185-A ao Código Tributário Nacional (CTN) para autorizar, no processo de execução fiscal, a indisponibilidade de bens e direitos do devedor através de notificação por meio eletrônico.

terça-feira, 12 de abril de 2005

Atualizado em 11 de abril de 2005 11:06

A penhora on line nas execuções fiscais


Luiz Gustavo Bichara*

Manuella Falcão*

Em 9 de fevereiro de 2005, foi publicada a Lei Complementar nº 118, que introduziu o artigo 185-A ao Código Tributário Nacional (CTN) para autorizar, no processo de execução fiscal, a indisponibilidade de bens e direitos do devedor através de notificação por meio eletrônico. Doravante, em determinadas hipóteses, o juiz da execução fiscal decidirá pela indisponibilidade dos bens e direitos por intermédio do envio de mensagem eletrônica aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente às instituições do sistema financeiro nacional. Em outras palavras, resta introduzido, no âmbito tributário, o sistema de penhora on line.

Verdadeiro pesadelo para o empresariado pátrio, essa é uma prática que vem sendo experimentada pela Justiça do Trabalho para coagir ao pagamento de dívidas trabalhistas que, embora tenha beneficiado o credor com maior segurança na solvência do crédito, trouxe para o devedor inconvenientes que poderão vir a ser amargurados também pelos contribuintes com dívidas tributárias.

Como é cediço, a experiência vivida até hoje com este tipo de penhora é a pior possível. Na Justiça do Trabalho, determina-se freqüentemente o bloqueio e penhora on line de um mesmo valor em inúmeras contas. O resultado, é claro, é uma constrição patrimonial muitas vezes maior do que o crédito em si.

A propósito, rege a Lei nº 6.830, de 1980 - que disciplina a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública -, em seu artigo 11, que não ocorrendo o pagamento da dívida ou a garantia da execução, a penhora poderá recair sobre parcela do patrimônio do devedor, obedecida uma ordem predeterminada (dinheiro, títulos da dívida pública, pedras e metais preciosos etc.). Em consonância com o dispositivo, encontra-se também o artigo 620 do Código de Processo Civil, que dispõe que o processo de execução deve se proceder da forma menos gravosa ao devedor.

A despeito disso, hoje é muito comum que a Fazenda Pública requeira a penhora de faturamento, o que, na maioria dos casos, é deferida pelo juiz, apesar de a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) colecionar precedentes no sentido de que esta é uma medida excepcionalíssima, que deve ser adotada somente quando o débito não puder ser satisfeito de outra forma menos gravosa.

No caso de pessoas jurídicas, a situação assume contornos ainda mais dramáticos, na medida que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), por exemplo, tem, sistematicamente, perseguido a constrição patrimonial também dos sócios destas. Não raros serão os casos onde o sócio da empresa será surpreendido com a penhora on line de recursos seus, mesmo tendo a empresa patrimônio para garantir o crédito tributário.

Em última análise, a penhora on line representa a penhora da própria empresa, e resultará em gravame sobre suas contas bancárias, podendo inviabilizar o pagamento de fornecedores e empregados e ameaçar a própria continuidade de suas atividades.

Ora, como é de pleno conhecimento, nem todos os valores cobrados pelo fisco são, em verdade, devidos. Isso ocorre, muitas vezes, até mesmo em razão da falta de integração do sistema de controle de pagamentos dos órgãos públicos que gera a cobrança em duplicidade ou a cobrança de débitos prescritos ou daquilo que já foi pago.

A título exemplificativo, registre-se que de 40% dos autos de infração que chegam ao Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda são reformados total ou parcialmente. Ou seja, já não se pode falar com tanta firmeza em liquidez e certeza do crédito tributário.

Imagine-se, então, a hipótese em que o contribuinte informa, através de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF), que deixou de pagar determinado tributo. A considerar o procedimento padrão da Receita Federal, é certo que o referido débito será diretamente inscrito em dívida ativa, sem, contudo, ser necessário o prévio lançamento.

Independentemente do fato de ter havido erro na declaração do contribuinte - o que é comum - ou mesmo de ter sido posteriormente pago o débito, a execução seguirá o seu curso, com risco de penhora on line. Com efeito, em casos como este, onde o contribuinte sequer pôde se manifestar na esfera administrativa, a penhora on line se revela manifestamente inadmissível.

Infelizmente, é de se cogitar também que essa triste novidade poderá provocar sérios danos ao patrimônio do particular, seja pelo excesso da garantia da execução (que se verificará tempos depois quando se puder constatar que o montante reunido com a indisponibilidade dos bens ultrapassou o valor efetivamente devido), seja em decorrência do fato de que a penhora precede a apresentação da defesa (embargos).

Parece-nos que a Fazenda Pública e o Poder Judiciário não estão munidos de meios eficientes para assegurar que essa penhora on line não se transformará em apenas mais um instrumento de coerção do particular. E levando-se em consideração a fúria arrecadatória do fisco federal, podemos afirmar, conscientemente, que a penhora on line se traduz em medida atentatória da ordem jurídica, subversiva do conceito de justiça e do próprio Estado democrático de direito.
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*Artigo publicado no jornal Valor Econômico, edição do dia 7 de abril
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*Advogados do escritório
Bichara, Barata, Costa & Rocha Advogados









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