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O sapo e os escorpiões

Affonso Ghizzo Neto

O depoimento explosivo do Deputado Federal Roberto Jefferson demonstra nitidamente o proceder de parte da classe política nacional. Não importa a ideologia ou a grei partidária, como diz o brocardo popular: "É tudo farinha do mesmo saco".

sexta-feira, 17 de junho de 2005

Atualizado em 16 de junho de 2005 08:42

O sapo e os escorpiões


Affonso Ghizzo Neto*

O depoimento explosivo do Deputado Federal Roberto Jefferson demonstra n
itidamente o proceder de parte da classe política nacional. Não importa a ideologia ou a grei partidária, como diz o brocardo popular: "É tudo farinha do mesmo saco". Ou melhor, farinhas de dois sacos. De um lado, a "farinha do bem", do outro, a "farinha do mal", com políticos de diferentes partidos misturados em ambas as "farinhas".

Mentiras ou meias verdades presentes, não há como negar a veracidade latente de várias informações prestadas pelo senhor Roberto Jefferson. Para desespero de alguns, a verdade brota dos bastidores políticos, surgindo novas informações sobre a efetiva tentativa de compras de políticos para trocarem de partido, com direito "a luvas" e "mensalão". Segundo Jefferson, desde agosto de 2003, é voz corrente no Congresso Nacional, nos gabinetes, nos corredores e nos banheiros, com o conhecimento de José Genoino e José Dirceu, o repasse de dinheiro por Delúbio Soares (PT) para partidos que compõem a base de sustentação do Governo Federal, tendo como intermediário o publicitário Marcos Valério.

Nova e relevante denúncia surge a respeito do repasse de verbas destinadas ao apoio eleitoral do PT ao PTB, sendo que teria sido repasso ao arrepio da legislação eleitoral, a quantia de 4 milhões de reais em cédulas de R$ 50,00 e R$ 100,00 etiquetadas pelo Banco Rural e Banco do Brasil, acordo firmado entre José Genoíno e o próprio Jefferson, com a homologação do Ministro José Dirceu. Segundo Jefferson, José Dirceu deixou de cumprir o restante do repasse das verbas prometidas, sob o argumento de que a Polícia Federal "era meio Tucana", tendo prendido diversos doleiros que injetavam dinheiro no País.

Realidade, teatro ou ficção, o próprio Jefferson admitiu ser igual aos seus algozes, sugerindo que foi utilizado como um sapo para fazer a travessia segura dos escorpiões que não podiam transpor o rio, recebendo, em contra partida, picadas venenosas dos escorpiões que lhe acompanhavam. "Isso pode nos levar ao fundo do rio, mas levaremos junto esses escorpiões da cúpula do PT", afirmou Jefferson.

Todavia, resta fortalecido deste triste episódio* sendo evidente que as investigações criminais das polícias encontram limites na hierarquia superior*, que os Ministérios Públicos Estaduais e Federal são os únicos órgãos independentes capazes de conduzir investigações ilimitadas, imparciais e sérias a respeito de graves denúncias como as ora anunciadas. Aliás, quantas outras denúncias ainda surgirão?

O Ministério Público Federal pode e deve investigar diretamente o denvolvimento do Ministro José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares e Marcos Valério, inclusive, da Presidência da República, da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) e do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), nas graves denúncias formuladas por Jefferson que, pelo que parece, não são as únicas...

Não é suficiente, portanto, a simples requisição ministerial para instauração de inquéritos policiais pela Polícia Federal que, subordina e sujeita as interferências e ingerências do Poder Executivo, não possuí a autonomia necessária para a condução de uma investigação criminal deste patamar.

Além de constitucional, a investigação criminal presidida por promotores de Justiça e procuradores da República, quando necessária e relevante, especialmente quando relacionada com o suposto envolvimento de grandes autoridades e empresários etc; é medida que se impõe definitivamente, sob pena de consolidação da impunidade.

Caso contrário, sofreremos um grave retrocesso na luta contra a corrupção e o crime organizado, com graves conseqüências para o interesse público e para Nação, especialmente em casos como o presente, em que a polícia judiciária não possui independência e garantias suficientes para conduzir investigações criminais ilimitadas, envolvam a quem envolver.

Ao Ministério Público cabe a defesa constitucional da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, sendo o legítimo titular da ação penal, obrigando-se, inclusive, a realizar investigações criminais. Desde que comprovadas as denúncias, o que se espera é que o sapo e os escorpiões permaneçam no fundo rio!
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*Promotor de Justiça em Joinville e professor da EPAMPSC





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