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Mudanças em estudo para alterar a estrutura do direito concorrencial brasileiro

A atual lei de concorrência brasileira, em vigor, é a lei nº 8884, de 11 de junho de 1994. Entretanto, um enforcement dessa lei tem sido obstaculizado por algumas razões.

terça-feira, 19 de julho de 2005

Atualizado em 18 de julho de 2005 14:34


Mudanças em estudo para alterar a estrutura do direito concorrencial brasileiro


Jayme Vita Roso*

A atual lei de concorrência brasileira, em vigor, é a lei nº 8884, de 11 de junho de 1994. Entretanto, um enforcement dessa lei tem sido obstaculizado por algumas razões: a) falta de recursos financeiros para contratação de pessoal capacitado para atuar na área; b) ausência de vontade política de efetivamente conceder ao país os meios e condições para um enforcement efetivo da lei atual; c) recursos abusivos que são admitidos contra procedimento do CADE ou da Secretaria de Direito Econômico, que postergam as decisões, sobretudo envolvendo mergers e take over e, finalmente, d) a ausência de uma verdadeira cultura brasileira anticoncorrencial.

Ao longo desses onze anos da vigência da lei, ela recebeu muitas críticas, a maioria delas injustas, pois o esforço que tem sido dedicado pelos funcionários das SDE e pelos conselheiros do CADE não tem sido reconhecido.

Através de grandes pressões, procura-se mudar a lei, como se a mudança da lei, quando não acompanhada de medidas do governo para que ela seja implementada, com pessoal preparado, com a possibilidade do enforcement ocorrer em prazos razoáveis, dentro da complexidade de cada caso, fosse fazer milagres.

Procura-se, agora, transformar a estrutura do CADE através de um projeto de lei em discussão, que altera e acrescenta vários tópicos da lei atual acima citado.

Várias dessas alterações e sugestões já existiam quando elaborei a pedido do então Presidente da República, Itamar Franco, um projeto de lei que resultou na lei nº 8884/94, sem, todavia, aceitar ou introduzi as medidas que eu havia proposto.

As questões em discussão são as seguintes: (i) criação do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), que passa a ser formado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, unicamente, reduzindo-se uma Secretaria; (ii) tentando acolher o que sugerimos em nosso projeto, anterior à atual lei, dessa vez, o CADE passa a ser considerado como Tribunal Administrativo de Defesa Econômica (Tribunal), constante de uma Diretoria Geral, uma Procuradoria Federal e um Departamento de Estudos Econômicos.

Quanto à competência do Tribunal, ela praticamente mantém as atuais previsões legais e pouca coisa é alterada, inclusive as competências do Presidente do Tribunal e dos seus Conselheiros. O importante foi a criação, dentro do CADE, do Departamento de Estudos Econômicos, que obrigatoriamente será dirigido por um economista-chefe e terá como função elaborar estudos e pareceres econômicos, que entenda necessários ou por solicitação de Conselheiro encarregado de um determinado caso ou do Diretor Geral do próprio CADE. Sua missão é zelar pelo rigor e atualização técnica e científica das decisões do CADE, sendo certo que ele vai participar das reuniões do Tribunal, sem direito a voto. Esse projeto de lei muda radicalmente a SEAE na sua competência, tendo o projeto em discussão atribuído treze atos que são de competência da SEAE, que vão desde a promoção cultural do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência até a celebração de acordos e convênios com entidades públicas ou privadas nacionais ou internacionais relacionadas à sua área de atuação dentro do direito que estará em vigor no Brasil à época.

Também cria-se uma Diretoria Geral, que dará a estrutura administrativa e será composta por cinco Diretores, com atribuições específicas para cada um, que serão detalhadas posteriormente se for convertido em lei o projeto. Essa parte burocrática é extensamente cuidada no projeto e efetivamente poderá dar nova estrutura organizacional ao CADE.

A propósito, esse projeto, sempre dentro da linha da lei atual e das anteriores, considera como espécies de processo administrativo aqueles que foram instaurados para prevenção, apuração e repressão às infrações de ordem econômica, começando desde o procedimento preparatório até o processo administrativo para imposição de sanções processuais. O processo administrativo no controle de atos de concentração econômica está sendo bastante apurado e foi organizada uma sistemática legal, de modo a permitir que os processos sejam mais céleres, inclusive considerando, sobretudo, nos julgamentos do pedido de aprovação de ato de concentração econômica, algumas condições e restrições cabíveis no sentido de evitar ou diminuir eventuais efeitos nocivos do ato de concentração sobre os mercados relevantes afetados.

A fase processual de natureza econômico-penal, dentro do inquérito administrativo, para apuração das infrações de ordem econômica é bastante simplificada. Permitem-se duas inovações nesse projeto: a primeira, é que durante qualquer fase do projeto administrativo, a Diretoria Geral ou o Conselheiro que está encarregado de votar o caso adotar medida preventiva, "quando houver indício ou fundado receio de que a empresa representada, direta ou indiretamente, cause ou possa causar ao mercado lesão irreparável ou de difícil reparação ou torne eficaz o resultado do processo"; a segunda, é estruturado um processo de programa de leniência através do qual poderá haver acordo para extinção punitiva desde que o acusado colabore efetivamente com as investigações e com o andamento do processo e que essa colaboração resulte eficácia na identificação de co-participantes em atos considerados lesivos à concorrência e que, também possam obter informações e documentos que comprovem a infração apontada ou esteja em fase de investigação.

O controle das concentrações é bastante bem elaborado, mudando radicalmente a legislação atual e prevê também acordos em controle da concentração.

Como dissemos no intróito, não adianta mudar a lei se outras atitudes e comportamentos não forem observados e seguidos e, sobretudo, exista vontade política que isso ocorra, inclusive promovendo os meios financeiros necessários para a implantação de um sistema de concorrência que seja respeitado e obedecido pelos agentes do mercado.
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* Advogado do escritório Jayme Vita Roso Advogados e Consultores Jurídicos














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