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Expeça-se o necessário! Cumpra-se!

Certamente em 11 de agosto de 1955, há 50 anos, Goffredo esperava que nestes tempos a Justiça fosse ser mais rápida. Muitas coisas são, mas a Justiça ainda não! Telefone, fax, e-mail, e nós ainda estamos discutindo de quem é a culpa pela lentidão da Justiça.

sexta-feira, 12 de agosto de 2005

Atualizado em 11 de agosto de 2005 12:45


Expeça-se o necessário! Cumpra-se!

 

Gabriel da Silveira Matos*


Certamente em 11 de agosto de 1955, há 50 anos, Goffredo esperava que nestes tempos a Justiça fosse ser mais rápida. Muitas coisas são, mas a Justiça ainda não! Telefone, fax, e-mail, e nós ainda estamos discutindo de quem é a culpa pela lentidão da Justiça.


Excesso de recursos? Burocracia da lei? Nada disso! Está na hora de cada um assumir sua parcela de culpa e botar sua casa em ordem. Deixemos o Poder Legislativo cuidando das CPIs e do financiamento das campanhas. E está indo muito bem no caminho certo, ou seja, tocando no ponto nevrálgico de seus problemas. Vamos cuidar dos nossos.


Os processos não andam por vários motivos. Inclusive quanto mais parados ficam, maior a possibilidade de não andarem. Quando as partes e os advogados se mudam sem deixar o endereço ou até morrem, aí o processo cai num maraaaasmo. Não anda mesmo!


Vejamos: grande parte dos Estados ainda não têm serviço de "recorte" do Diário Oficial para os advogados. As intimações são feitas pessoalmente, inclusive pelo correio (R$ 5, cada AR). Mas será que os advogados não poderiam ser intimados por e-mail ou fax ? Ora, na Justiça Eleitoral o candidato, durante a campanha eleitoral, é obrigado a fornecer um número de fax para receber as intimações. E funciona! Em dois meses o processo já está no TSE em grau de recurso. Sabemos que em todo processo pelo menos uma das partes (normalmente o autor) tem interesse na celeridade. Será que não aceitaria ser intimado por telefone ou e-mail? Pode ter certeza que viria correndo atender!


E o sumiço das partes ou testemunhas, principalmente no processo penal ? Aí vem o MP e requer o envio de ofício ao TRE em busca do paradeiro. Mas o MP não podia realizar um convênio com os TREs, empresas de telefonia e de energia elétrica para ele mesmo ter acesso aos seus bancos de dados e aí informar nos processos os possíveis endereços? Caso contrário o processo fica parado 6 meses para localizar uma testemunha, pois até o ofício voltar com um enderecinho incompleto da testemunha lá na Caixa Prego (com todo respeito pela localidade baiana), aí ser juntado, e vai conclusos, e volta, e vai pro MP, e volta, e sai uma precatória, demora 1 ano e volta sem cumprimento; quando volta, porque já ouvi dizer de comarcas em alguns Estados que nunca mais volta e, pior, há advogados que já sabem disso...


Falando em cartas precatórias, quanto papel e quanta burocracia só para prática de um ato! Fora os desencontros que fazem com que elas voltem por falta de custas ou cópias, ou sei lá o quê. Por que não padronizar? Se às vezes até o juiz se perde naquelas gigantescas cartas, tentando achar a finalidade (a razão de existir) da carta! Vamos padronizar nacionalmente o modelo das cartas precatórias! Se o CPC e o CPP são federais, por que não padronizamos as precatórias ainda?


E nas execuções fiscais? Deve-se recolher ou não as diligências do oficial de Justiça ? (desses falamos a seguir). Por exemplo: a Fazenda Nacional ingressa cobrando impostos de um devedor em Porto Alegre e se descobre que ele está morando em Belo Horizonte. Sai a precatória para BH. Chega lá tem que recolher "diligências". Mas se cobra de quem? Da PFN de MG ou RS ? E quando é estadual ou municipal? Aí piora. Nunca se recolhe e o processo nunca acaba. Raciocinemos: é o Estado cobrando do Estado: só falta um ter que cobrar judicialmente do outro as diligências...


Quanto aos famosos oficiais de Justiça, nem se fale. As tentativas de cercá-los para evitar os desmandos não têm funcionado. Ou estou delirando? O advogado que assim pensar que atire a primeira pedra? Temos de ser realistas. A facilidade com que a classe se corrompe começa com a informalidade. Se, como entendo, são eles os representantes do juiz na rua, na favela, etc., não deveriam andar uniformizados, ao menos com uma camiseta? Por que até os carteiros usam uniforme ?


E as diligências? O verdadeiro carnaval por que passam os advogados ao ter de enfrentar uma regra em cada Estado para recolher diligências é um absurdo. Uns por guia bancária, outros pelo correio, outros no balcão, outros direto para o oficial e a coisa vai. Vamos uniformizar, racionalizar! Se alguém tiver que ser mandado para o Japão ou para a Albânia pra saber como é lá, que seja. Mas vamos resolver isso!


Finalmente dois outros atos fazem travar o processo e o colocam sem saída: as citações ou intimações "por edital" e os mandados de prisão "não cumpridos". A formalidade da publicação no Diário Oficial é absolutamente inócua. Ninguém lê Diário Oficial, ainda mais os dos outros Estados. A polícia também, ao fazer uma blitz na rua, não lê os mandados de prisão que estão na Delegacia e o procurado passa incólume. Os mandados de prisão quando o réu está foragido, acabam sendo cumpridos "sem querer", quando o réu é pego em flagrante praticando outro crime, ou quando é baleado e sua "ficha" é verificada na Delegacia. Essa desorganização possibilita que num mesmo Fórum alguém que se encontre procurado num processo crime, esteja presente numa audiência cível sem sequer ser notado. Ou, por exemplo, o que é mais fácil acontecer: enquanto há um edital de citação numa ação por dívida ou um mandado de prisão numa ação penal contra uma pessoa em Aracaju, a mesma pessoa está morando feliz da vida em Campinas e ajuizando uma ação de indenização contra um supermercado naquela Comarca. Integremos logo! Deve ser criado com urgência (pelo Ministério da Justiça ou pelo próprio Judiciário com iniciativa do STF) uma espécie de CADIN nacional eletrônico (com um site na internet acessível a todos) dos citados ou intimados "por edital", bem como outro da lista dos que estão procurados por mandados de prisão em aberto. As Justiças Federal e dos Estados enviariam os dados on-line subsidiando com isso as polícias e o próprio Judiciário na localização de pessoas. São idéias aplicáveis no presente.


Penso que a mensagem já está dada.


Aos colegas juízes, um recado: se já folhamos os autos, perdemos tempo identificando os papéis até determinarmos o que fazer, que passemos mais detalhes aos despachos, evitando transferir responsabilidades aos escrivães e demais cartorários. Eles estão ali para cumprir ordens e não para decifrar enigmas. Evitemos os "j. sim, se em termos". Quem tem que decidir se está "em termos" é o juiz e não o escrivão. "Cumpra-se" o quê? "Defiro" o quê? "Expeça-se o necessário". Qual é o necessário? Deixemos estas expressões apenas para quando "o necessário" for óbvio. Mas não deleguemos o nosso trabalho, por maior que ele seja. Vamos mastigar para acelerar.


Enfim, com estas idéias e atendendo ao pedido de Migalhas na nossa semana, não posso deixar de louvar a implantação do método ORDEM na Justiça de MT. Mais que proibir a presença de ursinhos de pelúcia e carimbeiras nas mesas dos cartórios, o método tem realizado a uniformização dos trabalhos em todo o Estado, seja no layout, nos procedimentos, na infomatização, etc.. Afinal, se no Mac Donald's o hambúrguer é igual em qualquer lugar ou no Bradesco as agências têm o mesmo padrão de atendimento, por que ainda estamos na idade do "j. j. j.", "diga, diga, diga" e ousamos dizer que ninguém faz nada para melhorar a Justiça?

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*Juiz Substituto do TJ/MT





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