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Da inconstitucionalidade da base de cálculo do PIS/CONFINS importação

Javier Pereira Pena Cal

Com a alteração introduzida pela Emenda Constitucional nº 42/2003, o artigo 149, § 2º, inciso II, da Constituição Federal possibilitou à União criar nova modalidade do PIS/COFINS, incidente sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços - executados no País; ou no exterior, cujo resultado se verifique no País, por pessoa física ou pessoa jurídica residente ou domiciliada no exterior -, que chamaremos adiante de PIS/COFINS importação. O critério quantitativo (base de cálculo e alíquota) dessa exação encontra-se determinado no inciso III do § 2º do citado artigo constitucional.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2005

Atualizado em 1 de dezembro de 2005 08:22


Da inconstitucionalidade da base de cálculo do PIS/CONFINS importação

Javier Pereira Pena Cal*


Com a alteração introduzida pela Emenda Constitucional nº 42/2003, o artigo 149, § 2º, inciso II, da Constituição Federal possibilitou à União criar nova modalidade do PIS/COFINS, incidente sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços - executados no País; ou no exterior, cujo resultado se verifique no País, por pessoa física ou pessoa jurídica residente ou domiciliada no exterior -, que chamaremos adiante de PIS/COFINS importação. O critério quantitativo (base de cálculo e alíquota) dessa exação encontra-se determinado no inciso III do § 2º do citado artigo constitucional.


Como base de cálculo, o mencionado dispositivo constitucional determinou o valor aduaneiro da importação, e para a alíquota foi determinado o critério ad valorem. Quanto à alíquota, não resta maior discussão, posto que a União, ao exercer sua competência constitucional para criar efetivamente a incidência do PIS/CONFINS sobre a importação, como lhe autorizou a Emenda nº 42/2003, o fez de forma congruente com o comando constitucional.


Diferentemente da alíquota, a determinação da base de cálculo foi feita ao arrepio do comando constitucional. A base de cálculo constitucionalmente prevista dos tributos em questão, como dito acima, é o valor aduaneiro da importação, e qualquer inovação infraconstitucional nesse aspecto é inconstitucional.


Sem observar a limitação constitucional sobre a base de cálculo do PIS/COFINS importação, a Medida Provisória nº 164/2004 estabeleceu, no seu artigo 7º, a base de cálculo como o valor aduaneiro que servir de base para o cálculo do imposto de importação, acrescido do montante desse imposto, do ICMS e do valor das próprias contribuições. Ora, criou-se um novo conceito de valor aduaneiro, depois do que havia sido determinado pela Constituição, com o conceito antigo.


Sendo assim, é evidente a inconstitucionalidade dessa base de cálculo - no que extrapola a limitação constitucional de valor aduaneiro como tal - e, consequentemente, a cobrança dessa ampliação no período em que a incidência em questão foi transformada em norma pela referida Medida Provisória (1º.5.2004 até 30.7.2004).


Percebendo o equívoco cometido na Medida Provisória em questão, quando da sua conversão na Lei nº 10.865/04, inovou-se a base de cálculo, para alterar o conceito legal/constitucional de valor aduaneiro, acrescendo nesse conceito, para fins de incidência das referidas contribuições, o valor do imposto de importação, do ICMS e das próprias contribuições (artigo 7º da citada lei).


Para o Direito brasileiro, o conceito de valor aduaneiro foi determinado pelo Acordo Geral Sobre Tarifas e Comércio - GATT, acordo multilateral do qual o Brasil é signatário - promulgado pelo Decreto Legislativo nº 1.355/1994. O referido acordo conceitua o valor aduaneiro como "(...) o valor de transação, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias, em uma venda para exportação para o país de importação."1


Ressalvou-se nesse acordo a possibilidade de os países signatários incluírem no conceito de valor aduaneiro os custos necessários para a consecução da importação, como transporte, carga, descarga e seguro. Com base nesse acordo, o Brasil adotou o valor aduaneiro com a inclusão dos custos inerentes à importação. Esse conceito foi determinado pelo artigo 77 do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 4.543/2002), que prevê a inclusão dos custos como transporte da mercadoria importada até a entrada no território aduaneiro, gastos relativos a carga, descarga e manuseio associados ao transporte e o custo do seguro da mercadoria durante essas operações.


Assim, a Constituição, ao determinar a base de cálculo do PIS/COFINS importação como valor aduneiro, sem inovar o conceito já existente no sistema jurídico nacional, aceitou esse conceito, dando-lhe caráter constitucional para esse fim. Da mesma maneira como ocorreu com o conceito de 'mercadoria', 'serviços', dentre outros utilizados por normas constitucionais, o conceito de valor aduaneiro foi aquele sempre utilizado pela legislação internacional, pela legislação brasileira, usos e costumes. Não bastasse isso, o conceito de valor aduaneiro é utilizado para fins eminentemente privados, nos contratos entre particulares. Assim, valor aduaneiro é, também, um conceito de Direito Privado.


Dessa forma, não poderia lei ordinária alterar conceito constitucionalmente aceito e utilizado, alargando-lhe o espectro, como fez a Lei nº 10.865/04, sob pena de inconstitucionalidade, por violar a determinação constitucional de base de cálculo desses tributos. Da mesma forma, é ilegal porque viola o artigo 110 do Código Tributário Nacional, que veda à lei tributária alterar definição, conteúdo e alcance de institutos, conceitos e formas de Direito Privado, utilizados expressa ou implicitamente pela Constituição Federal.

Por conseguinte, a tributação do PIS/COFINS importação deve observar o conceito de valor aduaneiro constante no acordo do GATT, adotado pela Carta Constitucional brasileira, desconsiderando-se a alteração constante na Lei nº 10.865/2004. Nesse sentido, as empresas importadoras de mercadorias e serviços podem recorrer ao Poder Judiciário para não sofrer a incidência da base de cálculo inconstitucional aqui citada.

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1
Artigo 1º, § 1º, do Acordo relativo à aplicação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio de 1994.

2
Artigo 8º, § 2º, do Acordo relativo à aplicação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio de 1994: "Ao elaborar sua legislação, cada Membro deverá prever a inclusão ou a exclusão, no valor aduaneiro, no todo ou em parte, dos seguintes elementos: (a) - o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; (b) - os gastos relativos ao carregamento, descarregamento e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e (c) - o custo do seguro."

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*Advogado do escritório Trigueiro Fontes Advogados


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