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Retenção de tributos pela fonte pagadora: Quem pagará a conta?

Richard Edward Dotoli

Em uma reunião de trabalho, relacionada à nova legislação do ISS da cidade de São Paulo, lá pelas tantas, fui surpreendido com o seguinte questionamento: você conhece um bom advogado trabalhista para eu propor uma reclamação contra o Estado? Ora, disse o meu interlocutor, vou cobrar dele o meu salário, pois a única coisa que eu tenho feito nos últimos tempos foi trabalhar para o Estado. É obrigação de reter, de pagar, de declarar, de controlar, e mais, se não cumprir, a empresa vai pagar mais multa que o verdadeiro devedor.

segunda-feira, 23 de outubro de 2006

Atualizado em 20 de outubro de 2006 13:51


Retenção de tributos pela fonte pagadora: Quem pagará a conta?

 

Richard Edward Dotoli*

 

Em uma reunião de trabalho, relacionada à nova legislação do ISS da cidade de São Paulo, lá pelas tantas, fui surpreendido com o seguinte questionamento: você conhece um bom advogado trabalhista para eu propor uma reclamação contra o Estado? Ora, disse o meu interlocutor, vou cobrar dele o meu salário, pois a única coisa que eu tenho feito nos últimos tempos foi trabalhar para o Estado. É obrigação de reter, de pagar, de declarar, de controlar, e mais, se não cumprir, a empresa vai pagar mais multa que o verdadeiro devedor.

 

De fato, essa pergunta simples traduz o sentimento daqueles profissionais que, nas empresas, são os responsáveis pela área fiscal: sob o argumento de garantir e facilitar a arrecadação transfere-se todo o ônus do controle, arrecadação e fiscalização para a fonte pagadora. E se não cumprir a obrigação imposta? Não tenham dúvidas, receberá multas das mais pesadas.

 

Enganam-se os empresários que acreditam que o procedimento tributário restringe-se à operação aritmética de multiplicar a base de cálculo pela alíquota, preencher a guia e pagá-la no banco. Quem ainda pensar que isso basta para satisfazer o Fisco vai se dar muito mal! As penalidades para aquele contribuinte que não cumpre as chamadas obrigações acessórias são altíssimas. Por exemplo, pagar o PIS e a COFINS e deixar de preencher a DACON - Declaração de Contribuições Sociais, pode custar até 20% do valor devido a título das contribuições (Instrução Normativa nº 590/05, art. 9º).

 

Lembram-se daquele tempo em que a cobrança do fornecedor era a única preocupação da empresa? Acabou. Caso a empresa efetue o pagamento ao fornecedor e deixe de reter o INSS, o PIS, a COFINS, a CSLL e o Imposto de Renda e mais o ISS, como quer a maioria das Prefeituras, vai arcar com o ônus de todos esses tributos. Vocês acreditam que a retenção e pagamento das guias será o suficiente? De jeito nenhum... a empresa também terá que suportar o ônus de preencher os formulários correspondentes a cada um desses tributos, apenas para os exemplos acima, seriam 3 (três), cada qual com seus detalhes e, por favor, não erre o preenchimento senão receberá uma multa por isso.

 

Numa conta bem rápida, o valor pago ao fornecedor, caso não seja cumprida a legislação de cada tributo, será acrescido de aproximadamente 18% dos tributos e mais multa de 75%, ao final teremos um acréscimo aproximado de 31,5%.

 

Existe um princípio implícito na Constituição Federal chamado Princípio da Praticidade ou Praticabilidade, esse princípio norteia a atuação do legislador no sentido de escolher sempre o procedimento mais simples para impor o comportamento que se deseja dos participantes da sociedade. Trazido esse princípio para o direito tributário, verificamos que o legislador deve sempre escolher a opção que seja mais simples para a arrecadação dos tributos, viabilizando a exeqüibilidade da norma.

 

Essa enorme sobrecarga de atribuições para a fonte pagadora, que à toda evidência extrapola o razoável, fere o Princípio da Praticidade e alcança o Princípio da Capacidade Contributiva, pois impõe ao contribuinte, na qualidade de fonte pagadora, suportar todos os custos administrativos para o cumprimento das obrigações principais de substituição tributária e das acessórias de preenchimento de declarações.

  

O próprio Governo Federal possui exemplos de sucesso na simplificação e na busca da tributação justa, tal como o SIMPLES, o lucro presumido e o desconto padrão do imposto de renda da pessoa física. Fixar hipóteses de substituição tributária para mercados pulverizados ou capilares, promove o Princípio da Praticidade, mas não parece legítimo impor à fonte pagadora o ônus de pagar, controlar, fiscalizar e informar para todos os tributos existentes.

 

Esse abuso se reflete diretamente nas legislações municipais que, a reboque de São Paulo, determinam às fontes pagadoras a responsabilidade pela retenção de tributos de quaisquer fornecedores não instalados no município. Outros ainda criam regras para alcançar os tomadores de serviços, estes que não possuem qualquer vínculo com aquele município, ficam obrigados a pagar e controlar o imposto.

 

As legislações dos municípios estão ferindo o Princípio da Praticidade e da Capacidade Contributiva, sob o argumento de se protegerem da guerra fiscal. A nova legislação do município de São Paulo, por exemplo, cria um verdadeiro emaranhado de regras, declarações, responsabilidades tributárias e sistemas informatizados que, feitas as contas, melhor mesmo é mudar-se. Será que ninguém percebe que fica mais barato alugar um imóvel em outra cidade do que manter um exército de funcionários para controlar toda essa burocracia? Não seria mais simples os prefeitos se unirem e enfrentarem o tema em conjunto?

 

No meio disso fica o contribuinte, especialmente o empresário, buscando ser competitivo, buscando agregar valor ao seu serviço ou mercadoria, tendo que, além de suas atribuições, pensar que o simples pagamento de um fornecedor pode criar uma grande dor de cabeça.

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* Advogado do escritório Siqueira Castro Advogados










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