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Venda de ilusão e lide temerária

"Doutor, dá pra ganhar este caso ?" Quantas vezes o Advogado ouviu essa pergunta em múltiplas formas ? O que responder quando a natureza ou situação da causa ou até mesmo a condição psicológica do cliente o mantém em estado de grande inquietação ?

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Atualizado em 17 de julho de 2007 14:12


Venda de ilusão e lide temerária

René Ariel Dotti*

"Doutor, dá pra ganhar este caso ?" Quantas vezes o advogado ouviu essa pergunta em múltiplas formas ? O que responder quando a natureza ou situação da causa ou até mesmo a condição psicológica do cliente o mantém em estado de grande inquietação ?

O profissional jamais deve dar resposta açodada ou prognóstico desvinculado do exame cuidadoso de documentos e da atenta audição. Antes de falar, o advogado precisa ouvir. Essa é uma regra elementar de prudência e um bom caminho para opinar. O escritório não é loja de variedades com identificação de qualidade, preço e durabilidade dos produtos mantidos nas prateleiras. O problema humano, social e jurídico que traz um ser humano para a entrevista pode ter complexidades que não se ajustam com avaliação sumária e assunção de riscos que podem e devem ser prevenidos. O Código de Ética Profissional tem dois dispositivos que se ajustam ao diálogo iniciado por esta crônica. É dever do causídico "aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial", além de informar, de maneira clara e inequívoca, "quanto a eventuais riscos de sua [do cliente] pretensão, e das conseqüências que poderão advir da demanda" (arts. 2º, parág. ún., VII e 8º).

É muito comum existir, entre os iniciantes, a crença de que as consultas devem ser respondidas com a mesma rapidez com que são formuladas. E pensando aliviar a carga nervosa de quem o procura, alimentar uma expectativa duvidosa ou manter a perspectiva de honorários, o profissional sucumbe à tentação de responder antes do tempo. Esse procedimento ligeiro pode torná-lo refém da ansiedade e da opressão psicológica do cliente, problemas que comprometem seriamente as relações que devem se pautar pelo bom senso, lógica e prudência.

A lide temerária é um das faces desse triângulo escaleno formado entre o advogado, o cliente e a causa. É uma das hipóteses da litigância de má fé (CPC, art. 17, inc. V).

As observações acima valem não somente para os pleitos judiciais mas, também, para as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas, modalidades de atuação previstas no Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº 8.906/94, art. 1º - clique aqui). Na chamada advocacia preventiva as cautelas para um procedimento adequado devem ser, não raro, adotadas com maior rigor que os cuidados exigidos para a defesa do interesse ou Direito quando a demanda já tiver iniciado. Há, sob essa ótica, uma diferença elementar entre o fato já passado (prática de um eventual ilícito), e o fato a ser praticado (elaboração de um contrato). No primeiro caso, o advogado não é responsável pelo que foi feito sem a sua participação; já no segundo, é possível chamá-lo a juízo em ação indenizatória quando, dolosa ou culposamente, orientou o cliente para a prática de um ato que possa ser declarado ilegal.

O equilíbrio em analisar e a prudência em orientar são virtudes essenciais na vida profissional.

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*Advogado do Escritório Professor René Dotti

 

 

 

 

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