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Censura eleitoral

Leio nos jornais que no Mato Grosso a Justiça Eleitoral censurou a veiculação de programas políticos por entender que serviam de ferramenta para campanha eleitoral.

segunda-feira, 7 de junho de 2004

Atualizado em 27 de maio de 2004 09:05

Censura eleitoral


Sérgio Roxo da Fonseca*

Leio nos jornais que no Mato Grosso a Justiça Eleitoral censurou a veiculação de programas políticos por entender que serviam de ferramenta para campanha eleitoral.

A notícia merece pelo menos três destaques. O primeiro registra que cabe ao Poder Judiciário o controle do processo eleitoral no Brasil. O segundo revela que o Poder Judiciário tem poder de censura sobre a veiculação do pensamento político em nossa terra. O terceiro, muito grave, que, que ainda hoje é permitido proibir que se faça política, como nos idos da ditadura de 1964.

Questiona-se a administração do processo eleitoral no Brasil pelo Poder Judiciário. Tirando conhecidas exceções, o serviço é eficiente. No entanto, argumenta-se que o juiz de Direito, ao administrar o processo eleitoral, quase sempre, mas nem sempre, acaba por revelar a inclinação de seu pensamento político, o que é ruim para ele, para a boa distribuição da Justiça e até mesmo para os candidatos envolvidos no pleito. Os estudiosos lecionam que o juiz eleitoral e o do trabalho muito dificilmente conseguem ocultar suas visões políticas. Por isso que em vários países, o processo eleitoral é administrado por uma comissão da sociedade civil, com recurso para o Poder Judiciário, o que, se não elimina riscos, pelo menos reduzem-se ao mínimo.

Veja-se que há um processo iniciado pela Promotoria de Justiça pendente de julgamento no fórum de Ribeirão Preto sobre abuso do poder econômico na última eleição municipal. No passado, o Juiz Nilton Messias de Almeida decidiu questão semelhante em menos de mês, dando uma notável lição de democracia. Depois disso foi colocada em vigor uma lei que determina que tais processos devem ser decididos em três dias. Reversamente, o processo existente no fórum local arrasta-se há mais de três anos. O vereador processado escarnece da Justiça, arrolando testemunhas nunca encontradas, inclusive na Amazônia, o que autoriza prever que a decisão judicial somente será proferida depois de vencido o seu mandato. Há um profundo abismo procedimental entre a orientação empregada pelo Juiz Nilton Messias de Almeida e a atual. A diferença de tratamento não é boa para todos os envolvidos.

A censura ao pensamento é proibida por norma constitucional. No processo eleitoral, o juiz de Direito preside um julgamento popular semelhante ao do júri. Preside mas não decide. Quem decide é o povo, num representado pelos jurados, no outro diretamente pelo voto. A censura na divulgação do pensamento político é um círculo vicioso no Brasil. Não um círculo virtuoso.

Quanto ao terceiro tópico, deve ser lembrado que temos pouca atividade política no Brasil. É muito triste ler que os políticos não podem fazer política no horário político por ordem de um juiz de Direito. Castra-se a cidadania e viola-se a Constituição que deve ter no Poder Judiciário o seu último e mais digno defensor.


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* Advogado, professor da UNESP e Procurador de Justiça de São Paulo, aposentado






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