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A Convenção Nº. 158 da OIT

A Convenção nº. 158 da Organização Internacional do Trabalho se refere a possibilidade de dispensa de trabalhadores na iniciativa privada apenas nas seguintes condições: a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço. Dessa forma, veda a dispensa imotivada de trabalhadores permeando uma estabilidade infinita no trabalho.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Atualizado em 29 de fevereiro de 2008 08:52


A Convenção nº. 158 da OIT

Denize de Souza Carvalho do Val*


José Fagundes do Val**

A Convenção nº. 158 da Organização Internacional do Trabalho (clique aqui) se refere a possibilidade de dispensa de trabalhadores na iniciativa privada apenas nas seguintes condições: a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço. Dessa forma, veda a dispensa imotivada de trabalhadores permeando uma estabilidade infinita no trabalho.

O conceito estabelecido é irrestrito, vez que se trata de Convenção internacional que deverá ser adaptada às peculiaridades de cada país signatário, o que para o Brasil, representaria um absoluto caos, além de um convite à informalidade.

Isso porque, o Brasil adota o sistema positivista do Direito, onde leis regulamentam senão todas, a grande maioria das atividades, o que significaria a extensão da garantia de emprego desde o trabalho doméstico até o do Diretor - empregado de uma sociedade anônima, que, dessa forma, jamais poderiam ser dispensados fora dos parâmetros convencionais. É de se imaginar como se daria a discussão com os Sindicatos sobre os problemas domésticos ou das companhias e ainda depender de sua aprovação para efetivação das dispensas.

Resta clara a impraticabilidade de tal situação que desprestigia o mérito e a dedicação criando uma situação insustentável de ingerência dentro da atividade privada e até mesmo familiar, além da óbvia violência o princípio da livre iniciativa, expresso no parágrafo único do artigo 170 da Constituição Brasileira (clique aqui), alcançando o campo da inconstitucionalidade material.

Por outro lado, a imposição da manutenção do emprego a qualquer custo, impedindo a dispensa à critério da gestão empresarial ou da gestão da economia familiar, denota a intenção de mais uma vez transferir encargos públicos à iniciativa privada. Os empregadores - pessoas jurídicas já arcam com pesados pagamentos indenizatórios e compensatórios, a saber: 30 dias de aviso-prévio, férias e 13º. salário proporcionais e da multa de 40% sobre o total dos depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, tendo ainda o ex-empregado o direito ao seguro desemprego enquanto se dedica a procura de um novo trabalho. Denota-se que o legislador pátrio substituiu, com propriedade o texto convencional criando compensações financeiras que igualmente coíbem dispensas imotivadas pelo volume de encargos financeiros ao empregador.

Na eventual ratificação da Convenção deveria ocorrer concomitantemente a extinção do FGTS, eis que os depósitos destinam-se a garantir a subsistência do trabalhador por ocasião de dispensa sem justa causa. Seria incongruente a manutenção desse encargo, já que inexistiriam razões para o saque.

De qualquer modo o texto convencional já foi discutido no Congresso durante o governo do então Presidente Itamar Franco, quando a mensagem chegou ao legislativo, que a aprovou em 1996, durante o mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso.

Logo após a sua aprovação, a CNT (Confederação Nacional do Transporte) e pela CNI (Confederação Nacional da Indústria), distribuiu ADI - Ação Direta de Inconstitucionalidade embasada em conflito entre os termos convencionais e o artigo 7º., inciso I da Constituição Federal, alegando que tal aprovação só poderia se dar através de Lei Complementar, entre outros aspectos. Antes que se ocorresse o necessário período de 1 ano para que a Convenção entrasse em vigor (como determinam as normas da própria OIT), o presidente em exercício, Fernando Henrique Cardoso, a denunciou através do Decreto nº. 2.100/96 (clique aqui).

Por conta desse ato presidencial, o Relator da ação, Ministro Celso de Mello, encerrou o feito conforme segue:"...vê-se, portanto, que a convenção nº. 158/OIT não mais se acha incorporada ao sistema de direito positivo brasileiro, eis que, com a denúncia, deixou de existir o próprio objeto sobre o qual incidiram os atos estatais - Dec. Legisl. 68/92 e 1855/96 - questionados nesta sede de controle concentrado de constitucionalidade, não mais se justificando, por isso mesmo, a subsistência deste processo de fiscalização abstrata, independentemente da existência, ou não, no caso, de efeitos residuais concretos gerados por aquelas espécies normativas. (...) sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, julgo extinto este processo de controle abstrato de constitucionalidade, em virtude de perda superveniente de seu objeto."

Posteriormente, aos 19 de junho de 1997, foi distribuída Ação Direta de Inconstitucionalidade de nº. 1625-3, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG - tramitando no Supremo Tribunal Federal, na qual se discute o poder do Chefe de Governo de denunciar Tratados Internacionais, independentemente de manifestação ou oitiva do Congresso Nacional.

Aguarda-se a finalização do julgamento pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal. O atual Ministro da Defesa, Nelson Jobim, pronunciou voto considerando a ação improcedente, ou seja, declarando adequada à atual legislação brasileira a denúncia da ratificação da convenção. Seria interessante que ele se reunisse com o Sr. Presidente da República e com a Sra. Chefe da Casa Civil, para esclarecimentos sobre a questão. Os demais votos se deram no sentido de que a denúncia deveria ser ratificada pelo Congresso. Em momento algum foi considerado que a denúncia seria imprestável.

O que se observa em primeiro plano, é que enquanto a constitucionalidade do ato de denúncia está sendo analisada e discutida no nosso mais importante órgão do Poder Judiciário, o Executivo, sem amparo legal, deseja novamente colocar em pauta a vigência da Convenção Nº. 158 da Organização Internacional do Trabalho no território brasileiro.

Ora, parece que desrespeitando as regras que norteiam o princípio constitucional da segurança jurídica e do respeito aos 3 poderes, o atual governo pretende garantir boa propaganda política em ano eleitoral ou talvez pense em reeditar o sistema usual de aprovação de leis atualmente em vigor desde o famigerado "Mensalão", para criar na esfera privada a estabilidade absurda que emperra o serviço público.

Interessante será se ocorrer votação no Congresso ratificando a Convenção, ato já denunciado e posteriormente decisão do STF declarando que a denúncia seguiu os ditames legais sendo válida para todos os fins. Haverá um período nebuloso sem que se saiba qual a norma a ser seguida. E mais uma vez, a segurança jurídica será deslocada para o canto mais escuro da sala, onde não possa ser vista e tampouco utilizada.

Podemos finalizar, citando Norberto Bobbio: "Com efeito, o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados." ("A Era dos Direitos" ed. Campus, 1992, p.25)

Seria ato de bom senso, razoabilidade e moralidade, a retirada do pedido de nova ratificação da Convenção até decisão final do STF sobre o ato presidencial da denúncia, demonstrando o devido respeito à ordem jurídica vigente.

E seria ainda de maior bom senso, razoabilidade e moralidade, a análise adequada das nefastas conseqüências que tal ratificação traria à realidade brasileira.

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*Sócia do escritório Do Val, Pereira de Almeida, Sitzer e Gregolin Advogados

**Associado do escritório Do Val, Pereira de Almeida, Sitzer e Gregolin Advogados











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