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Cooperativas de transporte

O caos em que se transformou o trânsito da cidade de São Paulo é uma realidade, apesar de tantos especialistas, sugestões e discursos. Por acreditar que as boas idéias devam ser curtas e objetivas, sob pena de se tornarem prolixas e ineficazes, faz-se necessário propor sugestões factíveis, a partir de elementos empíricos e palpáveis.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Atualizado em 31 de março de 2008 11:43


Cooperativas de transporte - uma solução para o trânsito de São Paulo

Antônio Luís Guimarães de Álvares Otero*

O caos em que se transformou o trânsito da cidade de São Paulo é uma realidade, apesar de tantos especialistas, sugestões e discursos. Por acreditar que as boas idéias devam ser curtas e objetivas, sob pena de se tornarem prolixas e ineficazes, faz-se necessário propor sugestões factíveis, a partir de elementos empíricos e palpáveis.

É óbvio que de nada adiantam soluções meramente protelatórias, como as que pretendem retirar por mais tempo os automóveis das ruas ou distribuí-los pela vizinhança, sem o concomitante oferecimento de alternativas de transporte público. Ora, para reduzir o número de automóveis nas ruas, é incontornável que o poder público disponibilize alternativas para que a população possa se locomover, senão, em muito pouco tempo, São Paulo vai, sem dúvida nenhuma, parar.

Por mais que tentem inventar ou explicar, o fato é um só: a quantidade de automóveis nas ruas tende a aumentar caso não sejam oferecidas opções imediatas e eficazes de transporte coletivo para a população. Não se trata de falta de civilidade ou responsabilidade social. Se os cidadãos tivessem à mão algum "direito de opção", que lhes proporcionasse ao menos o mínimo de conforto que encontram em seus automóveis, é obvio que os deixariam de bom grado em casa.

Pois bem. Embora não seja do conhecimento comum, boa parte do transporte público da cidade de São Paulo é feito, atualmente, por cooperativas1, especialmente nos trajetos que não são considerados tão rentáveis pelas concessionárias de transporte público. Ou seja, sem qualquer investimento ou incentivo da Administração, as cooperativas de transporte têm prosperado e ido ao encontro da população para transportá-la, atendendo, assim, às suas necessidades básicas de locomoção, oferecendo um atendimento eficaz e atendendo a uma demanda reprimida que a ineficiência do poder público teima em perpetuar.

É o que se chama de logística reversa2, um mecanismo de planejamento que disponibiliza a solução até as portas de quem a necessita. Aplicando tal conceito ao caso (os) do trânsito de São Paulo, tem-se que a adoção do mecanismo da logística reversa permitiria que as cooperativas de transporte, que são formadas a partir da própria sociedade civil, pudessem aglutinar pessoas em grupos e suprir, de maneira social e economicamente viável, às frementes necessidades de locomoção da população.

Seria uma forma de "carona solidária" de primeiro mundo, organizada de maneira planejada, eficiente e acima de tudo, barata e rentável, que poderia ser implantada e fomentada pelas próprias Instituições com ideários cooperativistas (como a OCESP, Sindicatos ONGs e etc.) e deveria ser incentivada pelo poder público, que resolveria boa parte dos problemas de trânsito em São Paulo, sem que fosse necessário realizar quaisquer investimentos de vulto.

O que, entretanto, não excluiria a responsabilidade do estado em regular3 adequadamente o setor cooperativista, com fomento, controle e poder de polícia, tanto para que estimule o interesse do particular em aderir ao interesse coletivo4, quanto para coibir fraudes ou abusos, bastante comuns quando tratamos do transporte público.

Destaque-se que a eficiência das cooperativas de transporte, apesar de uma regulação quase inexistente, é uma realidade na cidade de São Paulo e que, com um planejamento quase singelo, estas poderiam locomover em "transbordos" localmente organizados, especialmente em lugares de grande densidade populacional, tanto para a ida ao trabalho, quanto para a volta para casa, algumas centenas de milhares de pessoas e quase igual número de automóveis, ainda que nos horários de pico.

É de se comentar também que uma solução cooperativista não retiraria lucros das empresas concessionárias de transporte público, pois estas continuariam a atender suas linhas regulares. Ao contrário, supriria suas carências, por atuar em áreas "ponto a ponto", podendo, inclusive, aproveitar os mesmos corredores, acrescentando uma grande opção para a solução dos gargalos do trânsito de São Paulo.

Espera-se, enfim, a compreensão das autoridades e técnicos, para que o cooperativismo de transporte possa, também na cidade de São Paulo, somar-se a tantas outras sugestões para a solução do caos em que se transformou o trânsito na cidade. O que é do interesse de todos nós, de maneira coletiva, e acima de tudo, cooperativa.

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1 Em notícia de 6/2/2007, a Folha de São Paulo informou que no transporte público da cidade de São Paulo, apenas durante o ano de 2006, foi arrecadado R$ 1,22 bilhão pelo sistema de cooperativas, o que corresponde a 37,08% do total angariado pelo transporte municipal da cidade (R$ 3,29 bilhões). As cooperativas transportaram 1,09 bilhão de passageiros no ano de 2006, o equivalente a 41,02% de todos os passageiros transportados na cidade.

2 Expressão brilhantemente utilizada pelo Sr. Edivaldo Del Grande (Presidente da OCESP - Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo) em recente artigo divulgado no sítio www.ocesp.com.br, ao sugerir novas soluções para a reciclagem do lixo.

3 Vide artigo publicado na Revista de Direito Público da Economia, n.o. 11 ( jul/set 2005) que versa sobre a regulação do cooperativismo no Brasil e se intitula "Cooperativas no Brasil: Regulação e Autonomia da Vontade" -(clique aqui) .

4 Vide artigo "Nash Equilibrium and Welfare Optimality" do Professor Erik Maskin e a teoria "Mechanism design theory" do mesmo Professor em co-autoria com os Professores Leonid Hurwicz e Roger Myerson, que foi aclamada com o Prêmio Nobel de Economia em 2007.

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*Presidente da Comissão do Cooperativismo da OAB/SP - Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo







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