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Casa da suplicação

No próximo dia 10 de maio do corrente ano a Justiça brasileira comemora seu bicentenário, essencialmente pela elevação da Relação do Rio de Janeiro à condição de Casa de Suplicação do Brasil e, portanto, independência total da justiça brasileira, até então atrelada à justiça portuguesa.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Atualizado em 6 de maio de 2008 11:36


Casa da suplicação

Antonio Pessoa Cardoso*

No próximo dia 10 de maio do corrente ano a Justiça brasileira comemora seu bicentenário, essencialmente pela elevação da Relação do Rio de Janeiro à condição de Casa de Suplicação do Brasil e, portanto, independência total da justiça brasileira, até então atrelada à justiça portuguesa.

Ainda nas Ordenações Afonsinas, 1480, o Tribunal maior do Reino português era denominado de Casa da Justiça da Corte; mais tarde, por influência do direito romano, passou a ser chamado de Casa da Suplicação. Através de Carta régia, datada de 27 de julho de 1582, Filipe I de Portugal, extinguiu a Casa do Cível de Lisboa e estruturou a Casa da Suplicação. Esta era formada por um regedor, um chanceler, desembargadores dos agravos, corregedores do crime e do cível da Corte, juízes dos feitos da Coroa e Fazenda, ouvidores das apelações criminais, procurador dos feitos da Coroa, da Fazenda, da Justiça e juiz da Chancelaria; contava ainda com guarda-mor, porteiros, escrivães, solicitadores, meirinhos, carcereiros, guardas das cadeias, guarda-livros, cirurgião.

Até o século XV a Justiça Portuguesa tinha a seguinte estrutura: Casa da Suplicação, Tribunal Superior ao Desembargo do Paço, e a Mesa da Consciência e Ordens; seguia-se Tribunal da Relação, auxiliado pelo Corregedor e Provedor e depois os juízes.

Os recursos a depender da alçada iriam para o Corregedor, para o Provedor ou para o Tribunal da Relação.

A Casa da Suplicação tornou-se a Corte Suprema diante dos tribunais de Relação, em Portugal e nas colônias: Relação do Porto para Portugal, Bahia para o Brasil e Goa para a Índia.

A Relação do Rio de Janeiro, como a da Bahia, era composta por dez desembargadores, e foi criada em 1734, mas instalada somente em 1751, mais de um século depois da Relação da Bahia.

Com a invasão de Portugal pelas tropas francesas e a transferência da Corte para o Brasil criou-se condições para a estruturação de um judiciário, independente de Lisboa. D. João chega à Bahia, transfere-se logo depois para o Rio de Janeiro e cria, através de Alvará, datado de 10 de maio de 1808, a Casa de Suplicação do Rio de Janeiro com competência para julgar todos os recursos, inclusive da Casa de Relação da Bahia. É a grande data do Judiciário brasileiro, porque passamos a ter um judiciário totalmente independente de Portugal.

Este novo Tribunal do Brasil, formado por 23 desembargadores, foi instalado no dia 30 de junho de 1808, à Rua do Lavradio, centro do Rio de Janeiro, cabendo a presidência ao regedor Francisco de Assis Mascarenhas, Conde de Palma.

Instalaram outros tribunais no país a exemplo: do Conselho Supremo Militar, através de Alvará de 1 de abril de 1808; a Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, Alvará de 22 de abril de 1808; Juiz Conservador da Nação Britânica, através de Decreto de 4 de maio de 1808. Este juízo destinava-se à concessão de foro privilegiado aos súditos ingleses, residentes no Brasil, somente extinto por lei de sete de dezembro de 1831; Intendente Geral de Policia, Alvará de 10 de maio de 1808; Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas, Navegação do Estado e Domínios Ultramarinos, através de Decreto de 23 de agosto de 1808; em 1812, a Relação de São Luis do Maranhão, em 1821, a Relação de Recife, Pernambuco; em 1873, através do Decreto nº. 2.342 foram autorizados a funcionar tribunais em São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pará Ceará, Mato Grosso e Goiás.

No final do período colonial, a Justiça brasileira tinha a seguinte estrutura: juízes de vintena, ordinário e juiz de fora; de 2ª instância a Relação da Bahia, 1609/1758; Relação do Rio de Janeiro, 1751; com terceira instância a Casa da Suplicação, formada pelo Desembargo do Paço e a Mesa da Consciência e Ordens.

A Casa de Suplicação do Rio de Janeiro teve como modelo a Suplicação de Lisboa. Antes da Suplicação, Alvará de 5 de junho de 1619, criou-se a Ouvidoria do Rio de Janeiro e em 7 de novembro a do Maranhão.

A Casa de Suplicação, o Desembargo do Paço e a Mesa da Consciência e Ordens deram origem ao Supremo Tribunal de Justiça, através de Lei de 18 de setembro de 1828; era composto de 17 ministros; entretanto, só foi instalado em 20 de janeiro de 1829; já com a Constituição imperial de 1824, art. 164, determinava sua criação:

"na Capital do Império, além da relação que deve existir, assim como nas mais Províncias, haverá também um tribunal com a denominação de Supremo Tribunal de Justiça, composto de Juízes letrados, tirados das relações por suas antiguidades, e serão condecorados com título de Conselheiros".

A Constituição Provisória emanada do Decreto nº. 510 de 22.6.1890, ratificada pelo Decreto nº. 848 de 11/10 do mesmo ano, mudou a denominação para Supremo Tribunal Federal, composto por quinze juízes, e instalado em 28 de fevereiro de 1891; o Presidente da República, Floriano Peixoto escolheu dez "conselheiros" entre os dezessete que formavam o Supremo Tribunal de Justiça, órgão maior do Judiciário monárquico, criado em 1824, daí porque na composição inicial da Corte republicana conta-se setuagenários, sexagenários e apenas quatro juízes com idade inferior a 60 anos. Desde essa época, os ministros são nomeados pelo Presidente da República e o ato é submetido ao Senado Federal.

O retorno de D. João VI para Portugal provocou interesse demonstrado pela Corte portuguesa no sentido de tentar extinguir a Casa de Suplicação; a pronta e eficaz reação brasileira impediu a pretensão e logo em seguida é proclamada a independência e a certeza de manutenção de nossas instituições.

A festa anual da Justiça, na abertura do ano judicial, que até hoje acontece, já existia naqueles tempos e era organizada pela Casa da Suplicação.

Havia discriminação étnica e religiosa na formação dos tribunais. Mulatos, ciganos, cristão-novos não podiam ingressar na magistratura de então.

O Judiciário autônomo só aparece após o ano de 1789, por ocasião da Revolução Francesa, quando se questiona a origem divina dos monarcas.

"Desembargo do Paço" e "Casa da Suplicação" era denominação recebida pela Casa da Justiça no período inicial da monarquia.

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Desembargador do TJ/BA





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