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Das inconstitucionalidades das novas contribuições PIS e COFINS sobre a importação

Fernanda D. Parisi

É notório que, não raro, o constituinte derivado imiscuí-se na competência do constituinte originário, criando normas constitucionais, que são na verdade, inconstitucionais.

terça-feira, 3 de agosto de 2004

Atualizado em 2 de agosto de 2004 11:01


Das inconstitucionalidades das novas contribuições PIS e COFINS sobre a importação


Fernanda D. Parisi*

É notório que, não raro, o constituinte derivado imiscuí-se na competência do constituinte originário, criando normas constitucionais, que são na verdade, inconstitucionais.

Outro não é o caso das novas contribuições sociais denominadas PIS- importação e COFINS- importação.

Com efeito, as contribuições em apreciação, criadas por meio da Medida Provisória nº 164/04, convertida na Lei nº 10.865/04, têm como fundamento constitucional, o previsto nos arts. 149, §2º, II e 195, IV.

Cumpre assinalarmos que os dispositivos supramencionados foram introduzidos no Texto Excelso, por meio da Emenda Constitucional nº 42/03, a qual, gerou inúmeras questões controversas em direito tributário, as quais vêm sendo discutidas desde a sua edição.

Neste diapasão, e levando-se em conta a brevidade do presente estudo, focalizamos nosso exame somente na instituição de previsão constitucional, para a incidência de contribuições de intervenção no domínio econômico sobre a importação de serviços ou de produtos estrangeiros.

Assim, existindo o permissivo constitucional como inferir a inconstitucionalidade das contribuições em exame?

A resposta engloba alguns aspectos que tornam inconteste a inconstitucionalidade das malfadadas contribuições, sobre os quais passamos a discorrer.

O primeiro deles diz respeito ao veículo utilizado para a criação das contribuições. Assunto amplamente discutido pela doutrina é o conflito entre leis complementares e ordinárias para veicular a hipótese de incidência tributária.

No entanto, no caso em testilha, tal discussão torna-se secundária, porquanto o art. 149 da Carta Magna, ao dispor acerca das chamadas contribuições sociais, dentre elas, as de intervenção no domínio econômico, como é o caso das contribuições PIS e COFINS-importação, impõe a utilização da lei complementar como diploma legal hábil a estabelecer a hipótese de incidência tributária das contribuições.

Com efeito, preconiza o art.146, III, a, do Diploma Maior, que cabe à lei complementar dispor sobre a definição de tributos, bem como, dos componentes que constituem sua hipótese tributária.

Assim, a instituição das contribuições PIS e COFINS - importação por meio da Medida Provisória nº 164/04 convertida na Lei ordinária nº 10.865/04, por si só, já torna as contribuições inconstitucionais, criadas na contramão da Constituição Federal.

Nestes lindes, escusado lembrarmos que, não obstante existam precedentes no STF aduzindo que a lei complementar é dispensável quando a norma matriz se encontra descrita na Carta Magna, a base de cálculo das novas contribuições incidentes sobre a importação de bens e serviços, não foi contemplada pelo Diploma Magno, o que, corrobora nossa assertiva de que a criação das exações por Lei ordinária é inconstitucional.

Contudo, as contribuições denominadas PIS e COFINS - importação são ultrajantes à Constituição em outros aspectos que sobrepujam a inobservância do Texto Maior, revelando a injustiça fiscal que de tão demasiada, compromete a credibilidade, há muito tempo enfraquecida, de nosso país como Estado de Direito democrático.

Cuida-se outra inconstitucionalidade das exações, a concernente à base de cálculo das contribuições fixada pela Lei nº 10.865/04 nos seguintes termos:

"Art. 7o A base de cálculo será:

I - o valor aduaneiro, assim entendido, para os efeitos desta Lei, o valor que servir ou que serviria de base para o cálculo do imposto de importação, acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso I do caput do art. 3o desta Lei; ou

II - o valor pago, creditado, entregue, empregado ou remetido para o exterior, antes da retenção do imposto de renda, acrescido do Imposto sobre Serviços de qualquer Natureza - ISS e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso II do caput do art. 3o desta Lei.

..." (grifo nosso).

De plano, verifica-se que as novas e indigitadas contribuições possuem praticamente o mesmo fato gerador e a mesma base de cálculo de outro tributo, isto é, do imposto importação, consoante previsto no Decreto-lei nº 37/66:

"Art.1º - O Imposto sobre a Importação incide sobre mercadoria estrangeira e tem como fato gerador sua entrada no Território Nacional. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1/9/1988)

...

Art.2º - A base de cálculo do imposto é: (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1/9/1988)

I - quando a alíquota for específica, a quantidade de mercadoria, expressa na unidade de medida indicada na tarifa; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01/09/1988)

II - quando a alíquota for "ad valorem", o valor aduaneiro apurado segundo as normas do art.7º do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio - GATT. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1/9/1988)"

É cediço que nosso sistema constitucional tributário não permite que existam dois tributos incidentes sobre as mesmas operações e com mesma base de cálculo, porquanto é vedada tal modalidade de bis in idem.

Ademais, a norma contida no art. 154, I do Diploma Maior é clara, e proíbe, que sejam instituídos novos impostos ou contribuições com base de cálculo ou fato gerador próprios de outros tributos discriminados na Constituição.

Fica então, demonstrada a inconstitucionalidade das contribuições PIS e COFINS - importação ante a coincidência de seu fato gerador e base de cálculo como os mesmos componentes da hipótese tributária do Imposto Importação previsto no art. 153, I da Carta Maior.

Não obstante as inconstitucionalidades já apontadas, há ainda, que se mencionar outra, a qual consubstancia-se na inclusão na base de cálculo, dos montantes referentes ao ICMS, ISS, II e das próprias PIS e COFINS - importação.

Tamanha absurdidade chega a ser chocante, afinal, é mais que óbvio que imposto não pode incidir sobre imposto!

Outrossim, é manifesto que a lei não pode ampliar (mediante a inclusão de tributos ou por qualquer outra técnica) a base imponível fixada pela Carta Fundamental.

Neste ponto, mister asseverarmos que os tributos não são forma de sanção e, igualmente, não podem ser confiscatórios, devendo submeter-se à capacidade contributiva dos contribuintes. Logo, absolutamente inadmissível que tributo integre a base imponível de outro tributo!

Acerca do assunto, trazemos à baila, o estudo do professor Gabriel Lacerda Troianelli:

"A inconstitucionalidade parcial do inciso I do artigo 7º, acima transcrito (Lei nº 10.865/04), é flagrante, na medida em que a base de cálculo estabelecida para a importação de bens é não só o valor aduaneiro do bem, como determina o artigo 149, §2º, III, da Constituição federal, mas também os montantes pagos a título de Imposto de Importação, de ICMS e das próprias Cofins-Importação e Pis - Importação, calculadas 'por dentro', indo nesse aspecto, além da base de cálculo constitucionalmente definida.

É também, parcialmente inconstitucional o inciso II do artigo 7º, quando, para a importação de serviços, busca fazerem incidir as contribuições sobre o valor do serviço, acrescido do ISS e das próprias Cofins-Importação e PIS - Importação, calculadas 'por dentro' ...

Nossa conclusão, portanto, é no sentido de que, tanto na importação de bens quanto na importação de serviços, a base de cálculo deverá ser apenas o valor destes, sendo inconstitucional a inclusão, nessa base, de outros tributos incidentes sobre a importação" (Revista de Dialética de Direito Tributário nº 103, pág.65, editora Oliveira Rocha, São Paulo, 2004)."

Sobre o tema, vejamos ainda, as lições dos laureados juristas Aires Barreto e Roque Carrazza:

"O arsenal de opções de que dispõe o legislador ordinário para a escolha da base de cálculo, conquanto vasto, não é ilimitado. Cumpre-lhe erigir o critério dimensível consentâneo com o arquétipo desenhado pela Excelsa Lei. Essa adequação é dela mesma extraível, antes e independentemente da existência da norma legal criadora do tributo. As várias possibilidades de que dispõe o legislador ordinário para adoção da base de cálculo já se contém na Constituição" (Base de Cálculo, Alíquota e Princípios Constitucionais, 2a. edição, São Paulo: Max Limonad, 1998, pág. 52).

"Destarte - como será melhor demonstrado -, o montante de ICMS não pode integrar sua própria base de cálculo, sob pena de desnaturar-se o tributo e, o que é pior, de se infringirem maus tratos ao estatuto do contribuinte, constitucionalmente traçado."

"Na verdade, não é possível inserir, na base de cálculo do ICMS a sua própria incidência (cálculo por dentro), ensejando a cobrança de imposto sobre o imposto" ("ICMS - Inconstitucionalidade da Inclusão de seu Valor, em sua Própria Base de Cálculo", Revista Dialética de Direito Tributário n° 23, São Paulo: Dialética, pág.102).

Diante das considerações articuladas neste sucinto estudo, procuramos esboçar um panorama capaz de evidenciar as inconstitucionalidades eivadas na criação e cobrança da contribuições sociais PIS e COFINS- importação, devendo a Lei nº 10.865/04, que deverá tornar-se eficaz em 1º de agosto do corrente ano, ser declarada inconstitucional.

Por derradeiro, não sobeja aduzirmos que se a cobrança das contribuições PIS e COFINS - importação não for rechaçada por nós, operadores do direito, então, certamente, estaremos sendo cúmplices na prática da exacerbada injustiça social que assola, indene, o nosso país.
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* Advogada do escritório Nelson Wilians e Advogados






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