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Euclides da Cunha: a cidade da Campanha, os amigos e o direito

Como revela a biografia de Euclides da Cunha era ele um itinerante, tendo cruzado o Brasil de leste a oeste, norte a sul, quer como jornalista, quer como engenheiro. No Estado de São Paulo, por exemplo, residiu em várias localidades, como a capital, Lorena, São José do Rio Pardo, Catanduva, Caçapava, Descalvado.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Atualizado em 15 de fevereiro de 2021 10:34

Euclides da Cunha: a cidade da Campanha, os amigos e o direito

Antonio Claret Maciel Santos*

Como revela a biografia de Euclides da Cunha era ele um itinerante, tendo cruzado o Brasil de leste a oeste, norte a sul, quer como jornalista, quer como engenheiro. No Estado de São Paulo, por exemplo, residiu em várias localidades, como a capital, Lorena, São José do Rio Pardo, Catanduva, Caçapava, Descalvado. Em Minas Gerais, residiu na Campanha, cidade setecentista localizada no sul do Estado, onde, aliás, nasceu um de seus filhos, o "Quindinho". Campanha integra a história mineira, desde os tempos da colônia, cujo arraial primitivo era denominado "Santo Antonio da Piedade do Vale do Rio Verde da Campanha da Princesa da Beira", alcunhada, em passado recente, de "Atenas Sul Mineira", pela excelência de seus estabelecimentos de ensino (Colégio Sion, Ginásio São João, Seminário Diocesano) e intensa vida cultural. É berço de famílias ligadas ao mundo jurídico, como Veiga, Brandão, Nogueira, Vilhena, Valadão, sendo campanhenses, dentre outros, o cientista Vital Brazil, cujo nome de batismo era "Vital Brazil Mineiro da Campanha", juristas como Alfredo Valadão, Perdigão Malheiro. Nela residiram Alvarenga Peixoto e Bárbara Heliodora, herois da Inconfidência Mineira; João Luis Alves, (1865-1930) Promotor, Juiz de Direito, Prefeito, Ministro da Justiça no Governo da Arthur Bernardes e do STF. Pela excepcionalidade de seu clima, abrigou, por temporadas de saúde, o poeta maranhense Raimundo Correia que ali escreveu "As Pombas" e em meados do século XX, Manoel Bandeira, Silvio Romero.

Euclides, durante o tempo em que viveu na Campanha - 1894, cumprindo punição imposta pelo Exército Nacional, como não poderia deixar de ocorrer, se ambientou muito bem na sociedade local, participando de seleta comunidade de letrados, integrada por Dr. Brandão, Comendador Bernardo da Veiga, Coronel Chiquito e o Juiz de Direito João Luis Alves. Em carta a este datada de 18/6/1895 diz "a Campanha avultará sempre no meu passado como a paragem mais formosa e santa da minha existência de árabe." Em outra disse que Campanha era a "Tebaida Mineira".

Quando se transferiu para a capital de São Paulo manteve intensa correspondência com os amigos campanhenses, onde se pode verificar que as amizades ali construídas não foram superficiais, mas profundas, sinceras e perenes, missivas próprias de compadres, onde indagações sobre esposas, filhos, vizinhos, trocas de gentilezas, são frequentes, conforme atestam Walnice Nogueira Galvão e Oswaldo Galotti (Ed. EDUSP) que compilaram parte da vasta correspondência euclidiana.

Em carta datada de 23/4/1896, de São Paulo, endereçada a João Luiz Alves, notícia que já enviara ao compadre o livro Direito das Obrigações do qual fora incumbido de adquirir, assim como anunciou que o livro Direito das Famílias (sic) "atualmente não existe aqui", razão pela qual pedira ao amigo carioca Alfredo Chaves que providenciasse sua aquisição e de lá o mandasse à Campanha. Na mesma carta, após justificar a demora no atendimento da encomenda, por estar "absorvido pelo estudo da mineralogia" indaga a João Luiz Alves "quando pretende vir até cá, a fim de defender a tese como, a propósito, devo comunicar que vão abrir diversos concursos na Escola de Direito, sendo candidato a um deles o ultra-eminente Pujol", ou seja, Alfredo Pujol, jurista e político republicano (1865-1930).

Em carta datada de 27/2/1903, escrita de Lorena ao amigo Araripe Junior, jurista cearense (1848-1911), demonstra que lia artigos jurídicos nos periódicos de então, "na véspera havia lido o seu último artigo sobre os "Comentários" da nossa CF/88, do dr. João Barbalho, e, francamente, ali notei, sob um aspecto inteiramente novo, ajustado ao destino dos povos americanos, a doutrina, sem números de vezes, discutida e falseada de Monroe." Tal doutrina foi formulada pelo Presidente norteamericano James Monroe (1758-1831) e teve por bandeira a frase "a América para os americanos" com o escopo de impedir o avanço da Europa contra os países do continente americano.

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*Secretário Adjunto da Secretaria Municipal dos Negócios Jurídicos de SP

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