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O STF e o Executivo

O Poder Judiciário sempre foi buscado para acomodar os projetos demagógicos dos governantes de plantão; se os julgamentos lhes desagradam não se intimidam na prática da denúncia, da crítica e da desmoralização, tão comum no mundo político.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2005

Atualizado em 21 de fevereiro de 2005 11:23

O STF e o Executivo


Antonio Pessoa Cardoso*

O Poder Judiciário sempre foi buscado para acomodar os projetos demagógicos dos governantes de plantão; se os julgamentos lhes desagradam não se intimidam na prática da denúncia, da crítica e da desmoralização, tão comum no mundo político. Atacam, por cima, o STF, para atingir toda a estrutura judicial.

Os golpes de 1937 e 1964 seguiram por este caminho. As ameaças, logo após o golpe militar, mereceram do então Presidente do STF, ministro Ribeiro da Costa, a advertência ao marechal presidente Castello Branco de que se houvesse qualquer intervenção no Judiciário, como se programava, as chaves da Casa seriam entregues e imediatamente concedida entrevista aos correspondentes estrangeiros.

O governo Vargas interferiu até mesmo na indicação de Presidente e Vice-Presidente do STF, através do Decreto-lei n°. 2.770 de 11.11.1940. A nomeação e o tempo de permanência dependia do livre arbítrio do governante. Eduardo Espínola permaneceu como presidente da Corte entre os anos de 1940 e 1945; José Linhares, também nomeado pelo Presidente da República, tornou-se dirigente do mais alto tribunal do País no período 26.5.1945 a 29.10.1945. Linhares foi um dos presidentes do STF que assumiu a presidência da República e, nesta condição, restaurou a prerrogativa institucional da Corte, através do Decreto n. 8.561 de 4.1.1946.

O Ato Institucional n°. 2, de 27 de outubro de 1965, suspendeu as garantias constitucionais da magistratura e ampliou o número de ministros do STF de 11 para 16, de novo reduzido para 11, através do ato institucional n°. 6, de 1o de fevereiro de 1969, que também ampliou a competência da Justiça Militar.

A desfiguração da lei maior deu-se de tal forma que não se tinha outro caminho se não editar nova Constituição. Assim, veio a Carta outorgada pelos militares, através do Ato Institucional n°. 4, bastante influenciada pela Carta de 1937, esta responsável pela criação do Estado Novo. Foram mantidas as restrições ao funcionamento do Judiciário introduzidas anteriormente.

O Ato Institucional n°. 5, de 13 de dezembro de 1968, com a promessa de solucionar a morosidade da justiça, rompeu com a ordem constitucional e tornou-se o instrumento mais autoritário da história política do Brasil. A ação de interpretação de lei ou ato normativo federal concedido ao STF, órgão sensível às ponderações do governante, art. 119, I, letra "I" CF de 1969, significou fuga dos militares aos julgamentos do Judiciário. Atos praticados pelo Executivo, embasados nos atos institucionais e complementares, não podiam ser submetidos à apreciação do Judiciário.

Abriu-se a porta para intervenção no tribunal mais elevado da República. A influência americana manifestava-se em todo o governo. O então secretário de Estado da administração Johnson, Dean Rusk, agrediu o STF, quando disse que "as dificuldades de relacionamento com o Brasil estão no ministro Evandro Lins e Silva. Ele é antiamericano".

Em 1969, o incômodo pela concessão de hábeas corpus a presos sem culpa formada, vítimas de tortura e processados por não comungarem com a cartilha dos militares, juntamente com a antipatia americana, causaram afastamento arbitrário Evandro Lins e Silva, mais os ministros Hermes Lima e Victor Nunes Leal.

Simples manutenção de decisão que reconheceu inelegibilidade de um sargento eleito para a Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul provocou rebelião militar e detenção do ministro Vitor Nunes Leal. A violência cometida contra os três ministros fez com que o então presidente do STF, ministro Lafayette de Andrade, renunciasse à chefia do Judiciário e se aposentasse. Gonçalves de Oliveira em solidariedade aos colegas injustiçados também se retirou. Outros juizes afastaram-se da magistratura diante da prepotência do regime militar.

Os governos que se seguiram à democratização do País não mudaram muito o tratamento dispensado ao Judiciário e à Constituição. Emendaram-na 45 vezes, além das violações através das inúmeras medidas provisórias.

No atual governo cria-se a Súmula Vinculante e o Conselho Nacional de Justiça, trazendo tristes recordações vividas pelo Judiciário nos tempos escuros da ditadura. A motivação é a de sempre: morosidade da justiça.

A Súmula Vinculante confere ao STF a função de legislar e decidir, retirando encargo específico do Legislativo, além de bloquear a criatividade dos juizes de todo o País. Tudo em benefício da agilização do judiciário.

A lerdeza dos serviços judiciários, todos sabem, é facilmente localizada: falta de estrutura da primeira instância, número insuficiente de juizes e burocracia exigida pelos códigos. Os magistrados continuam com a máquina de escrever, sem local adequado para o trabalho, com funcionários maus remunerados e sem reciclagem.

O Conselho Nacional de Justiça é ingerência indevida e não se sabe quem controlará este Conselho.
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Juiz em Salvador





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