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Política & Economia NA REAL n° 188

terça-feira, 6 de março de 2012

Atualizado em 27 de fevereiro de 2012 09:34

Dilma, tensão, choro e lulodependência

A quaresma trouxe pesadas cinzas políticas para a presidente Dilma, refletidas no choro por ela exibido sexta-feira no Palácio do Planalto. Não há que se imaginar que ela, durona como é tida, tenha soltado lágrimas por causa da dispensa do ex-ministro Luis Sérgio, político petista fluminense que humilhou duas vezes. Menos ainda se deve supor que a emoção tenha sido pela aquisição para o ministério da Pesca do senador e bispo licenciado Marcelo Crivella. Seria muita vela para pouco santo. A razão, segundo bons observadores políticos de Brasília, seria outra : o alto grau de tensão a que Dilma está submetida em razão das confusões no campo governamental, nada especificamente a ver com a economia, que é um outro departamento. Vê-se a presidente assolada por :

1. Rebelião na base aliada e as desavenças explicitadas publicamente entre o PT e o PMDB. A insatisfação é grande e é diretamente com a presidente e a forma como ele se conduz politicamente.

2. O documento dos militares da reserva com críticas indiretas à presidente e diretas do ministro Celso Amorim. Nasceu pequeno, cresceu e merece uma resposta dura do governo. Porém, isto pode acender um rastilho de pólvora, pois junta insatisfações com a Comissão da verba com desencantos salariais e com a falta de recursos para reaparelhar as Forças Armadas.

3. A disputa pelo poder dentro do BB; uma queda de braço entre petistas, com reflexos no meio ambiente da equipe econômica.

4. A inesperada (para quem não lê bem a política) entrada de José Serra na corrida eleitoral pela prefeitura de SP, criando dificuldades para a montagem de uma coligação governista ampla para apoiar a candidatura petista de Fernando Haddad. Com isto, Dilma vai ter de mostrar mais sua cara na sucessão paulistana, coisa que não estava em seus planos. E que já começou a fazer dando a Crivella o ministério da Pesca.

Em consequência dessa confusão, Dilma teve de correr para os braços de seu criador, reacendendo a velha conversa da "lulodependência" coisa que ela vinha tentando apagar, até com algum sucesso, nos últimos tempos.

Sistema esgotado

Toda essa confusão demonstra que o sistema de coalizão partidária amplo, que sustenta o governo Dilma, montado milimetricamente pelo ex-presidente Lula, está se esvaindo. É gato demais no balaio para uma pessoa com pouca experiência e pouco apetite político como Dilma. Quando o partido do vice-presidente da República, Michel Temer, que é também seu presidente licenciado, faz circular um manifesto como o assinado pela maior parte de sua bancada na Câmara, dá para ver o tamanho da encrenca que Dilma tem pela frente. De agora em diante, a tendência é aumentar as cobranças dos aliados e as concessões por parte do Palácio.

Não é esse o problema

A questão preocupante não é o fato de o bispo-senador Marcelo Crivella não entender de pesca, nem ao menos colocar uma minhoca no anzol. Não tem importância. Os ministros que o antecederam na Pesca também não sabiam e o ministério não tem razão de existir. Qualquer coisa, ou nada, é a mesma coisa. O problema é o modo como ele foi escolhido e as credenciais que o levaram ao posto - apenas razões eleitorais e partidárias.

Ainda é cedo

O PSDB está exultante com a entrada de Serra na eleição paulistana, principalmente depois que o DataFolha já o colocou em primeiro lugar na pesquisa da intenção de votos. Por outro lado, baixou um mal estar no PT e no Palácio do Planalto, com as dificuldades que agora se apresentam para Fernando Haddad. O PT, Lula e Dilma já davam nas mãos a prefeitura de SP. E mais : um passo decisivo para a tomada do Palácio dos Bandeirantes, em 2014. É cedo para tudo isso. A eleição pode virar. O cacife dos eleitores de Haddad, do ex-presidente Lula e da presidente Dilma, é pesado. E tanto para Lula quanto agora também para Dilma ganhar a eleição na capital paulista virou ponto de honra.

Espertinho demais

Kassab está atirando em tantas direções que está com grandes possibilidades de terminar o seu mandato falando sozinho e com um partido natimorto nas mãos. Se o PDB não conseguir mais tempo no horário obrigatório no rádio e na televisão deixará de ser uma noiva cobiçada em qualquer lugar do Brasil. E o despacho do ministro Lewandowski, negando ao PSD o direito de ocupar presidências das Comissões permanentes da Câmara, pode ser um indício de como os tribunais decidirão quando chegar o momento de definir se ele terá direito a mais tempo na mídia. A tese é que o partido ainda não passou pelo "teste das urnas" e esse teste que define os direitos partidários.

Lula em repouso

Não há nenhuma indicação de que a saúde do presidente Lula, em relação ao câncer do qual ainda está se tratando, piorou. É efeito do tratamento a que foi submetido, agravado, segundo bons especialistas, com alguns "descuidos" do presidente. Por seu estilo, por exigências de seu partido e também de demandas da presidente Dilma em alguns momentos de dificuldades, Lula se expôs mais do que o aconselhável. E como diagnosticam seus médicos, ficou com a imunidade comprometida. Agora, terá de ser mais obediente e se submeter a um repouso para valer, mais prolongado, mesmo depois que sair do hospital. O que para a presidente Dilma, com os pepinos que está vivendo, não é nada bom. E menos bom ainda é para os candidatos petistas às prefeituras, especialmente Haddad, politicamente ainda incapaz de andar sem as duas muletas de Lula a escorá-lo.

Economia em marcha lenta I

Há poucos anos discutia-se muito entre os economistas que o crescimento não era sustentável em função das restrições cambiais que o país historicamente tinha. No governo FHC, o crescimento per capita gravitou ao redor de zero. Na era Lula, regada pela bonança internacional, o crescimento per capita pulou para algo em torno de 3%. De todo o modo, este crescimento é substancialmente inferior aos países mais importantes dentre os emergentes, os chamados BRICs, e menor que os principais países da América Latina, excetuando-se o México. Esta constatação se repete neste primeiro ano da presidente Dilma : o Brasil continua patinando, a despeito do grande prestígio que tem perante o mundo desenvolvido em crise. Note-se que estamos analisando em termos relativos o que retira o argumento de que este baixo crescimento se deve a crise externa.

Economia em marcha lenta II

Há muitas possibilidades para se justificar este crescimento medíocre. O mais aparente é que a taxa de investimento instável, ao redor de 20% do PIB, ainda é baixa em comparação aos outros países com características semelhantes às do Brasil. Logo, chegamos à taxa de juros básica e de crédito aberradamente desequilibradas. De outro lado, a inflação brasileira acumula perdas importantes em termos de poder de compra. Ademais, a taxa de câmbio está supervalorizada, basta se verificar o desempenho dos preços do segmento de serviços. Por fim, temos um resultado fiscal equilibrado, mas que onera em excesso os segmentos mais produtivos da economia em favor de um obeso Estado. Menor produtividade, menor crescimento.

Economia em marcha lenta III

Como se vê nas notas acima, a economia brasileira não parece tão saudável quanto se apregoa mundo afora. Ocorre que quem está muito adoentado são os países centrais do capitalismo. Nesta comparação, o Brasil brilha e talvez aí resida a negligência generalizada em torno de reformas essenciais para dotar a economia brasileira da vitalidade necessária que justifique os excessos verbais quando se comenta sobre a economia brasileira por aqui e lá fora. A economia, neste ritmo lento, de fato, e "atraente", na aparência, faz jus ao desempenho político da presidente Dilma, e vice-versa. A presidente gosta de ser conhecida pelo seu caráter de "gerente". Uma imagem bem discrepante com a realpolitik da coalizão partidária que preside, onde cabe tudo, de comunistas errantes pelo mundo, no ministério dos Esportes até a vanguarda do atraso, nas Minas e Energia. De Sarney às políticas da condição feminina. De Dilma à Lula. A economia imita a política. E vice-versa. Não há reformas relevantes e não há gerência competente. O que se vê é um Brasil muito melhor perante um mundo muito ruim.

BC cheio de dúvidas

Se fosse pelo crescimento frágil da demanda no final de 2011 e o fraco desempenho da atividade destes dois meses iniciais do ano, bem como o comportamento bem mais moderado da inflação, o BC poderia ser mais agressivo em reduzir a taxa de juros básica, bem mais rápido que se espera. Há quem aposte nisso. A nosso ver, a questão não é quem ganha esta aposta, mas o quanto isto é possível num momento em que uma boa parte dos resultados positivos da inflação se deve ao câmbio valorizado e, de outro lado, o quanto o petróleo em alta lá fora pode contaminar a dinâmica de preços por aqui. Alguém poderia chamar a atenção para os riscos chineses, mas vamos combinar que, por enquanto, chega a ser uma grande pretensão tentar adivinhar o que seria uma crise da China a estas alturas dos acontecimentos. A crise pode (deve ?) até acontecer, mas não há possibilidade de se prever quando. O que nos parece, por ora, é que Alexandre Tombini e sua turma vai continuar reduzindo o juro básico obedecendo a máxima de que "quando não se sabe exatamente o que se está fazendo, faça devagar". Se o BC apertar o passo e for mais rápido na redução dos juros, é possível que tenha de voltar a aumentar os juros mais cedo. A opção pela segurança nos parece mais óbvia.

Palpites e apostas

Hoje, o IBGE divulga os resultados oficiais do PIB do ano passado. Até os mais empedernidos governistas, aqueles que há pouco mais de um ano imaginavam que a economia nacional poderia crescer até 5% em 2011, estão conformados com uma elevação do PIB entre 2,7% e 2,9%. O discurso oficial será que isto é o que mostra o "retrovisor", o importante é que está em andamento. Um PIB para fechar 2012 crescendo ao ritmo de 5%. Esse dado de baixo desempenho, porém, poderá ser útil para o Copom, cuja reunião para definir a nova taxa básica de juros começa hoje e termina na quarta-feira. Alguns analistas acham que o BC pode cortar a Selic com mais força, algo entre 0,75 e 1%, sob a alegação de que é necessário incentivar o crescimento da economia. Segundo eles, o presidente do BC, Alexandre Tombini, deu a senha quando, na semana passada, em depoimento no Congresso, fez questão de enfatizar que a economia brasileira está crescendo há três trimestres abaixo de seu potencial. Faça-se o jogo.

Juros da poupança

Semana passada, discretamente, o ministério da Fazenda negou que esteja estudando rever a forma de remuneração da caderneta de poupança. Como se sabe, eis um assunto delicado, sobretudo porque envolve uma multidão de famílias das classes mais pobres do país. Não tenhamos ilusões : qualquer baixa consistente dos juros no patamar de um dígito requererá uma nova forma de remuneração da caderneta de poupança. A combinação de uma remuneração fixa com um "índice" é incompatível com um cenário de juros mais baixos. Resta o imenso problema político a ser gerido pelo governo de plantão. Só para lembrar : num dado momento do governo Lula esse assunto aflorou, mas foi logo descartado, tais as reações que provocou. A memória de Fernando Collor, Zélia Cardoso de Mello e seu plano econômico ainda é muito presente. Antes de mexer na poupança, Dilma e Mantega terão de fazer uma demorada catequese. E em ano eleitoral, nem os mais fiéis aliados se sentirão com vontade de meter a mão nessa arapuca.

A "guerra cambial"

A presidente Dilma adotou a terminologia do ministro Mantega e passou a apregoar contra a "guerra cambial". Há muitas coisas desconhecidas no mundo atual a despeito do avanço científico que vivenciamos. Definir uma "guerra cambial" é complicado, mas aparentemente devemos acreditar na presidente e seu ministro com muita boa vontade. Todavia, talvez seja o caso de acreditarmos mais na guerra comercial, marcada pelas barreiras alfandegárias e não-alfandegárias que rodeiam a Terra. Nossos hermanos do sul, por exemplo, estão fazendo acrobacias de todo tipo para evitar déficits comerciais crescentes. Os EUA estão tentando de tudo para barrar os produtos chineses que campeiam pelo país e os europeus tentam se resguardar dentro do próprio Velho Continente contra os produtos mais baratos do Leste Europeu. No que diz respeito às moedas a coisa parece comportada. As moedas flutuam de lá para cá sem grandes efeitos propriamente "cambiais". Os chineses, por exemplo, estão onde sempre estiveram : com a moeda desvalorizada para bancar as suas exportações que inundam o mundo. O Brasil, por sua vez, tem de desatar o histórico e problemático mundo dos juros altos. Não é à toa que o real é o campeão de valorização.

Eleições e crise internacional

Os olhos inundados de lágrimas de Vladimir Putin, vencedor da eleição deste fim de semana na Rússia, inauguram o período de eleições em países importantes. Até o meio do ano teremos eleições na França, país mais importante na estratégia alemã de colocar ordem na eurolândia. A Grécia se encontra com as urnas em meio a sua tragédia, em abril. A Itália continua com um cenário instável para o governo "tecnocrático" do professor Mario Monti. Por fim, temos a corrida eleitoral norte-americana, marcada pelo desacreditado Obama e pela oposição estridente dos "napoleões perdidos" republicanos. Neste ano haverá enorme rebuliço político no hemisfério norte. A sustentação para os planos reformistas e salvacionistas dos países centrais dependerá destes resultados. Olhada pela política, a economia será volátil.

Radar NA REAL

2/3/12 TENDÊNCIA
SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo
Juros ¹
- Pré-fixados NA estável estável/alta
- Pós-Fixados NA baixa baixa
Câmbio ²
- EURO 1,3221 baixa baixa
- REAL 1,7353 estável/baixa estável/baixa
Mercado Acionário
- Ibovespa 67.781,60 estável/alta estável
- S&P 500 1.369,63 estável/alta alta
- NASDAQ 2.976,17 estável/alta alta

(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável

Mendes, um militante ?

Chega parecer coisa de militante partidário a "cruzada" do ministro do STF, Gilmar Mendes, contra a chamada Lei da Ficha Limpa. Na sessão do STF que confirmou a validade da norma, usou argumentos um tanto canhestros, bem rebatidos por colegas como a ministra Carmem Lúcia, e deu a nítida impressão, pelo estilo e tom de voz, de querer constranger (e influenciar) a nova ministra Rosa Weber. Neste domingo, voltou ao ataque no "Estadão" preconizando a alteração da lei pelo Congresso, alegando que ela é uma roleta russa. Mas não fica claro, na entrevista, porque ela seria essa ameaça.

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