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STJ - Universidade que não ministrou toda a carga horária deve ressarcir alunos

Mesmo que os alunos colem grau, eles ainda podem exigir indenização por carga horária do curso não ministrada pela instituição de ensino. Esse foi o entendimento unânime da 4ª turma do STJ, em processo movido por ex-alunos da Fundação Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina, para obter ressarcimento por horas-aula não ministradas. O relator do recurso é o ministro Luis Felipe Salomão.

Da Redação

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Atualizado em 15 de dezembro de 2010 16:18


Currículo deficiente

STJ - Universidade que não ministrou toda a carga horária deve ressarcir alunos

Mesmo que os alunos colem grau, eles ainda podem exigir indenização por carga horária do curso não ministrada pela instituição de ensino. Esse foi o entendimento unânime da 4ª turma do STJ, em processo movido por ex-alunos da Fundação Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina, para obter ressarcimento por horas-aula não ministradas. O relator do recurso é o ministro Luis Felipe Salomão.

Um grupo de alunos graduados pela Univali ajuizou ação contra a instituição, pois teriam pago o equivalente a 20 créditos em aulas do 5º período do curso de direito, mas foram ministradas aulas equivalentes a 16 créditos. Em primeira instância, decidiu-se que a Univali deveria restituir o valor em dobro pelas aulas não ministradas, além de juros de mora e correções.

A universidade recorreu e o TJ/SC considerou que os estudantes teriam aberto mão de seus direitos, já que colaram grau sem nenhuma oposição. Eles também não teriam feito nenhuma resistência sobre as aulas faltantes nos períodos seguintes do curso.

No STJ, os alunos alegaram que a Univali teria obrigação de ressarcir pagamentos indevidos, sob risco de haver enriquecimento ilícito, já que não prestou os serviços contratados. Também afirmaram que, no caso, haveria violação ao art. 42 do CDC (clique aqui), que obriga a repetição de indébito ao consumidor exposto a constrangimentos ou ameaças.

O ministro Luis Felipe Salomão destacou, em seu voto, que no processo fica claro que não foram prestadas as 3.390 horas-aula previstas para o curso e pagas pelos alunos. Também teria ficado claro que os alunos tentaram diversas vezes esclarecer os motivos da redução de horas-aula e que entraram com pedidos administrativos para elucidar a questão e pedir restituição dos valores pagos a maior. "O quê se verifica no caso é que a recorrida [Univali] se comprometeu em prestar um serviço, recebeu por ele, e não cumpriu com o avençado", apontou.

O relator observou que houve resistência dos alunos e que, em nenhum momento, abriram mão de seus direitos. Não houve remissão ou perdão da dívida, já que não se demonstrou o ânimo de se abandonar o débito - a jurisprudência do Tribunal é nesse sentido. Para o magistrado, entretanto, não houve nenhum constrangimento para os alunos, apenas a cobrança a mais, portanto não se aplicaria o art. 42 do CDC. Com essas considerações, a 4ª turma determinou o ressarcimento dos valores e suas respectivas correções.

_________________

RECURSO ESPECIAL Nº 895.480 - SC (2006/0226907-8)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

RECORRENTE : ALEXANDRA CAMINHA E OUTROS

A DVOGADOS : JOÃO GUALBERTO DE SOUZA E OUTRO(S)

GUSTAVO FURTADO SILBERNAGEL

RECORRIDO : FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ - UNIVALI

ADVOGADO : CÍNTIA CARLA FERNANDES E OUTRO(S)

EMENTA

DIREITO CIVIL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. UNIVERSIDADE. MENSALIDADE. PAGAMENTO SEM A DEVIDA CONTRAPRESTAÇÃO EM HORAS-AULA. RESTITUIÇÃO. RECURSO ESPECIAL PELAS ALÍNEAS "A" E "C". AUSÊNCIA DE VÍCIOS A CONTAMINAR O ACÓRDÃO RECORRIDO. DISSÍDIO NÃO-DEMONSTRADO. VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 964 E 965 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 971 DO MESMO DIPLOMA AO CASO DOS AUTOS. REPETIÇÃO SIMPLES. NÃO INCIDÊNCIA DO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Não há se falar em violação aos artigos 165, 458 e 535 do CPC, quando o Tribunal examinou a matéria posta na lide e declinou os fundamentos que o levaram às conclusões firmadas. À configuração do dissídio pretoriano impõe-se que se proceda ao correto cotejo analítico entre os casos confrontados o que na espécie não ocorreu.

2. Celebrado contrato de prestação de serviços entre a universidade e os recorrentes, e não tendo sido ministrado o número de créditos avençados, deve esta restituir o que recebeu a maior, indevidamente, sob pena de enriquecimento ilícito.

3. Não pode ser imputada aos recorrentes a anuência com o ilícito, pelo simples fato de ter ocorrido a colação de grau, pois.buscaram, tanto na via administrativa quanto judicial, o reconhecimento do seu direito à repetição

4. Inexistindo cobrança ofensiva ou vexatória pela universidade, de forma a expor os alunos ao ridículo, não tem aplicação a repetição em dobro, prevista no artigo 42, parágrafo único do CDC.

5. Recurso especial parcialmente conhecido e parcialmente provido.

ACÓRDÃO

A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso especial e, nessa parte, deu-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Aldir Passarinho Junior e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 16 de novembro de 2010 (Data do Julgamento)

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO:

1. Alexandra Caminha e outros alunos do curso de direito ajuizaram ação pretendendo repetição de indébito em face da Fundação Universidade do Vale do Itajaí, alegando que pagaram à requerida o equivalente a vinte (20) créditos, a serem apresentados em aulas do 5º período do curso de direito, compreendendo os meses de julho a dezembro de 1997, mas que só lhes foram ministrados dezesseis (16) daqueles créditos.

Sobreveio sentença de fls. 207/212, julgando procedente o pedido para condenar a requerida a restituir em dobro os valores indevidamente recebidos pela Universidade, corrigidos da data do ajuizamento da ação, mais juros moratórios da citação.

Interposto recurso de apelação (fls. 229/234), foi-lhe dado provimento por maioria, nos termos de acórdão (fls. 285/296), assim ementado:

AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS. CURSO JURÍDICO. CURRÍCULO PLENO. EXIGÊNCIA DE 3.390 HORAS DE ATIVIDADE. DISCIPLINAS FUNDAMENTAIS E PROFISSIONALIZANTES. DISTRIBUIÇÃO COM FIXAÇÃO EM NÚMERO DE CRÉDITOS. PRESSUPOSTO PARA COLAÇÃO DE GRAU. DISCUSSÃO AFETA AO NÃO CUMPRIMENTO DA CARGA HORÁRIA PREVISTA PARA CONCLUSÃO DO 5º PERÍODO DO CURSO DE DIREITO. PRESCRIÇÃO. INOCORRENTE. DIREITO PESSOAL. EXEGESE DO ART.177 DO CC.

CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. INGRESSO NOS SEMESTRES LETIVOS POSTERIORES E SUBSEQÜENTE COLAÇÃO DE GRAU, SEM QUALQUER RESSALVA. FATO SUPERVENIENTE EQUIPARÁVEL À RENÚNCIA DO DIREITO DE AÇÃO. FALTA DE RESISTÊNCIA À COLAÇÃO

DE GRAU QUE DESOBRIGA A UNIVERSIDADE EM COMPLEMENTAR AS HORAS-AULA FALTANTES. PRÁTICA DE ILÍCITO ADMINISTRATIVO PEDAGÓGICO QUE CONTOU COM A CONIVÊNCIA DOS AUTORES. DIREITO A REPETIÇÃO INEXISTENTE. PRESERVAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA JUSTIÇA, QUE NÃO PODE PRESTIGIAR DEMANDA FUNDADA EM CAUSA VIL. PRECEDENTE (AC N 2000013800-2). RECURSO PROVIDO.

Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para receber um benefício, aceitando-o, sem ressalva e com proveito absoluto, ao argumento de que a entrega da prestação foi ilícita. Seria o mesmo que proclamar o direito em favor daquele que se beneficiou com a prática do ilícito administrativo, autorizando, ainda, sem o desfazimento do ato, a repetição daquilo que desembolsou para obtenção desse proveito. (fl. 285).

Interpostos embargos infringentes (fls. 303/309), receberam julgamento (fls. 403/414), assim sumulado:

ENSINO SUPERIOR. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS. HORAS DE ATIVIDADE INFERIOR À PREVISTA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.


"Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para receber um benefício, aceitando-o, sem ressalva e com proveito absoluto, ao argumento de que a entrega da prestação foi ilícita. Seria o mesmo que proclamar o direito em favor daquele que se beneficiou com a prática do ilícito administrativo, autorizando, ainda, sem o desfazimento do ato, a repetição daquilo que desembolsou para obtenção desse proveito" (AC n.º 2001009182-8, Des. Cesar Abreu).

Opostos embargos de declaração (fls. 424/430), foram rejeitados (fls. 449/453).

Irresignados, os autores interpuseram recurso especial pelas alíneas "a" e "c" da permissão constitucional, sustentando infringência aos artigos 165, 458 e 535, II do CPC; 964 e 965 do Código Civil de 1916 e 42, parágrafo único do CDC, além de divergência jurisprudencial.

Postulam a nulidade do aresto combatido por omissão e falta de fundamentação.

No mérito, afirmam que, quem recebeu indevidamente, deve restituir, nos termos dos artigos 964 e 965 do Código Civil de 1916 acima citados, encontrando-se equivocada a valoração jurídica dos fatos realizada pelo Tribunal de origem, com aplicação do artigo 971 do diploma legal em comento.

Questionam que o aresto findou por referendar o enriquecimento ilícito da recorrida, que recebeu por créditos de aula que não foram devidamente ministradas, não sendo verdade que ocorreu, por parte dos recorrentes, com a colação de grau, a aceitação passiva do ilícito praticado pela universidade e nem, tampouco, sua renúncia tácita à restituição pleiteada, como assinalado pelo acórdão recorrido.

Contra-razões às fls. 561/572.

Negado seguimento ao recurso especial (fls. 582/583) e extraordinário (fls. 585/586), foram interpostos agravos de instrumento.

Em decisão de fl. 592, foi determinada a subida do recurso especial.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2. Deve-se afastar, desde logo, a apontada infringência aos artigos 165, 458 e 535 do CPC, eis que o Tribunal de origem examinou percucientemente a matéria exposta a julgamento, assim como declinou os fundamentos nos quais apoiou as conclusões assumidas, atendendo aos requisitos formais e legais de sua validação, e não se ressente de nenhum dos vícios de que cuidam os citados preceitos legais ditos violados.

Quanto ao dissídio pretoriano apontado, não procederam os recorrentes ao correto cotejo analítico de forma a demonstrar a similitude entre as situações tratadas e a diversidade na solução encontrada.

Por outro lado, verifica-se que a matéria atinente à repetição de indébito foi implicitamente debatida no acórdão reclamado, pelo que, passo ao exame da insurgência recursal.

3. É fato incontroverso nos autos que a) a recorrida celebrou com os recorrentes contrato de prestação de serviços para ministrar 3.390 horas-aula, pelas quais seriam pagas mensalidades relacionadas à quantidade de créditos dados em cada semestre;

b) o serviço foi prestado de forma incompleta, porque lhes foram ministradas apenas 16 horas-aula;

c) no 8º período do curso, após várias tentativas junto à recorrida para esclarecer os motivos da diminuição das horas-aula, embora o valor das mensalidades continuasse o mesmo, os recorrentes ingressaram com pedido administrativo de restituição dos valores pagos a maior, relativos ao 5º período, não sendo atendidos pela recorrida.

O ponto nodal da lide gravita em torno de ser devida a repetição dos valores referentes a créditos-aula pagos e não recebidos pelos ora recorrentes.

O Tribunal de origem entendeu inexistente o direito à repetição, albergado nos seguintes fundamentos: a) o déficit no programa pedagógico não comprometeu o avanço curricular dos autores que colaram grau; b) embora configurado o '"ilícito pedagógico", na medida em que a universidade não prestou as horas-aula devidas, os recorrentes renunciaram tácita e inequivocamente ao direito perseguido na ação de repetição de indébito ao colarem grau, nos termos do artigo 971 do CC/1916.

Destarte, o acórdão, aplicando o artigo 971 do CC/1916, estabeleceu a anuência dos recorrentes com o ilícito praticado pela universidade, pelo fato de que, não obstante reclamarem a devolução dos créditos pagos a maior, colaram grau naquela instituição de ensino.

4. O artigo 971 do Código de 1916 possui a seguinte redação:

"Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral ou proibido por lei".

Nas palavras do inesquecível Clóvis, "o que deu alguma coisa para obter um fim imoral não tem direito à repetição" (Código Civil Comentado por Clóvis Bevilácqua, 5ª edição, Livraria Francisco Alves, p. 134).

O que se verifica no caso em julgamento, contudo, é que a recorrida se comprometeu em prestar um serviço, recebeu por ele, e não cumpriu com o avençado.

Deve, portanto, devolver o que os recorrentes pagaram a maior.

Albergar tese contrária, seria chancelar a que as instituições de ensino estipulassem carga horária superior - como fez a recorrida - , àquela exigida pelo Ministério da Educação e do Desporto - (mínimo, 3.300 horas-aula), recebessem por ela, e, no final, só prestassem a carga mínima exigida.

A colação de grau, por certo, não é um fim imoral, mas a própria razão de ser do curso a que se submeteram os alunos.

5. Não merece acolhida a afirmação do aresto no sentido de que os recorrentes anuíram com a atitude ilícita da Universidade, porque não "resistiram" à colação de grau, e por isso não fazem jus ao recebimento de seus créditos.

"Remissão é a liberação graciosa de uma dívida, ou a renúncia efetuada pelo credor, que, espontaneamente, abre mão de seus direitos creditórios, colocando-se na impossibilidade de exigir-lhe o respectivo cumprimento' ("Curso de Direito Civil 4"; Washington de Barros Monteiro e Carlos Alberto Dabus Maluf, 35ª edição, Editora Saraiva, p. 354).

O próprio Tribunal a quo, citando Clóvis Bevilácqua ("Direito das Obrigações", 2ª ed. Livraria Magalhães, p. 165), esclarece: "é o perdão, liberação graciosa da dívida.

Poderá ser feita pela entrega, ao devedor, do título constitutivo da obrigação ou por outro qualquer modo capaz e traduzir a verdade de desobrigar o devedor, por se despir o credor dos atributos que lhe davam direito a exigir o cumprimento da obrigação".

Portanto, à caracterização da remissão, é necessário o ânimo de perdoar, o que, sem dúvida, não se pode cogitar na hipótese vertente, pois os estudantes não concordaram com a atitude da recorrida.

Ao contrário, buscaram administrativamente e, agora, judicialmente, o reconhecimento do seu direito à repetição.

Soa como absurdo que não pudessem colar grau, sob pena de, nessa condição, estarem a "liberar graciosamente" a recorrida de sua dívida.

Neste particular, oportuna a manifestação do voto-vencido, de cujo teor extraio o seguinte excerto:

Com efeito, os recorrentes, como comprova o documento de fls. 68/75, demonstraram que não permaneceram inertes à cobrança reputada indevida, solicitando ao presidente da entidade representativa estudantil que apurasse tais irregularidades.

Ademais, não se pode argumentar que sua colação de grau implicaria renúncia ao direito à repetição. O fato é que lhes fora cobrados créditos excedentes às aulas prestadas, situação que fora por eles contestada, esperando os acadêmicos que a universidade tomasse as providências necessárias, quais sejam, devolvesse os respectivos valores ou fornecesse as aulas. Seria inconcebível cogitar que os autores, para ajuizarem a presente actio, não pudessem colar grau; com isto, estar-se-ia, na verdade, punindo-os duplamente, porquanto, mesmo efetuando pagamento superior ao efetivamente devido, estariam - salvo se renunciassem ao direito à repetição - impossibilitados de colar grau, não adquirindo, assim, o título de bacharel em direito a que reconhecidamente faziam jus. (fls. 410/411).

Tampouco se cogita, no caso, em renúncia da dívida - ato unilateral mediante o qual o titular de um direito declara sua vontade de dele se desfazer - , ou conforme a doutrina de Clóvis Bevilácqua "ato pelo qual o credor abre mão de seu direito, ou substituindo-o por outro, e, neste caso, será um contrato oneroso, ou sem indenização alguma, e, então, será um ato de liberalidade" ("Direito das Obrigações", 2ª ed. Livraria Magalhães, p. 165).

6. Verifica-se, portanto, o direito dos recorrentes à repetição dos valores que foram pagos a maior, nos termos do artigo 964, caput, do Código Civil de 1916, que dispõe:

Art. 964. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir.

Pagamento indevido é uma das formas do enriquecimento ilegítimo; é, conforme Clóvis Bevilácqua " o pagamento que se faz sem uma obrigação que o justifique" (Código Civil Comentado, 5ª edição, Livraria Francisco Alves, p. 126).

Caracterizado o pagamento indevido, impõe-se a obrigação de restituir, sob pena de locupletamento ilícito daquele que recebeu indevidamente, conforme doutrina de J. M. de Carvalho Santos, que, comentando o artigo 964 ("in" Código Civil Brasileiro Interpretado, Vol. XII, ps. 389), afirma: "Operando-se o locupletamento à custa alheia, o corolário natural será a restituição ou indenização do valor ou da coisa que se adquiriu injustamente ou sem causa".

Com efeito, a Universidade recorrida, tendo recebido por serviço que não foi prestado, tem o dever de restituir os valores aos ora recorrentes.

Aliás, esse é o entendimento deste STJ, que em caso semelhante decidiu que:

Civil e Processual civil. Recurso especial. Vícios no acórdão recorrido. Inexistência. Dissídio jurisprudencial. Não comprovação. Art. 971 do CC/1916. Inaplicabilidade. Art. 964 do CC/1916. Obrigação de restituição dos valores não devidos recebidos. Restituição em dobro. CDC. Não aplicável à espécie.

- Para comprovação do dissídio jurisprudencial é necessário que os acórdãos tidos por paradigmas tenham sido proferidos por outros tribunais e possuam hipóteses fáticas que se assemelhem ao acórdão recorrido;

- Não há que se falar em concordância tácita dos recorrentes com a cobrança a maior realizada pela universidade. A exigência de resistir à colação de grau, imposta pelo acórdão recorrido, implicaria em severos ônus para os alunos;

- De acordo com as provas juntadas aos autos, a recorrida recebeu, de cada recorrente, 24 créditos de aulas-hora a mais do que efetivamente ministrou aos alunos, devendo restituir tais valores;

- O parágrafo único do art. 42 do CDC deve ser interpretado sistematicamente. Na espécie, não há cobrança de dívida nem qualquer espécie de cobrança ofensiva, devendo ser aplicado o Código Civil, que prevê a restituição na forma simples e não em dobro.

Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido.

(REsp 893.648/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/10/2008, DJe 15/10/2008)

6.1. Pleiteiam os recorrentes a restituição em dobro de que trata o artigo 42, parágrafo único do CDC. Ocorre que na esteira da jurisprudência deste STJ, o referido preceito legal não tem aplicação ao caso tratado na presente lide, uma vez que o preceito inserto no artigo 42 do CDC cuida de cobrança de dívida, dispondo que:

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

A Universidade recorrida apenas recebeu a maior. Não fez nenhuma cobrança indevida ou ofensiva aos recorrentes de forma a expô-los ao ridículo. E a intenção da citada norma legal é proteger o consumidor de situações vexatórias, o que não se configura na hipótese tratada nos presentes autos, devendo se aplicar o Código Civil que prevê a repetição simples.

Neste sentido, além do precedente acima citado, os seguintes escólios:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. OBRIGAÇÃO DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES NÃO DEVIDOS RECEBIDOS. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. CDC. PRECEDENTE DESTA CORTE EM CASO IDÊNTICO, RESP Nº 893.648/SC. O parágrafo único do art. 42 do CDC deve ser interpretado sistematicamente. Na espécie, não há cobrança de dívida nem qualquer espécie de cobrança ofensiva, devendo ser aplicado o Código Civil, que prevê a restituição na forma simples e não em dobro. Agravo de instrumento desprovido. (Ag 925130/SC, Relator Ministro VASCO DELLA GIUSTINA(Desembargado Convocado do TJ/RS) DJ 19/03/2009).

DIREITO CIVIL. PLANO DE SAÚDE. REAJUSTE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA.RESTITUIÇÃO EM DOBRO COM BASE NO CDC. IMPOSSIBILIDADE.

I - A jurisprudência das Turmas que compõem a Segunda Seção do STJ é firme no sentido de que a repetição em dobro do indébito, prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, pressupõe tanto a existência de pagamento indevido quanto a má-fé do credor.

II - No caso, a iniciativa da empresa ré de reajustar as prestações do seguro saúde, com base na alteração da faixa etária, encontra-se amparada em cláusula contratual - presumidamente aceita pelas partes -, que até ser declarada nula, gozava de presunção de legalidade, não havendo razão, portanto, para se concluir que a conduta da administradora do plano de saúde foi motivada por má-fé.

Recurso Especial provido.

(REsp 871.825/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/08/2010, DJe 23/08/2010)

Civil. Processo civil. Recurso especial. Ação de repetição de indébito. Duplo pagamento de insumos adquiridos por grande produtor rural. Pretensão veiculada com fundamento no CDC. Aplicação do direito à espécie.Possibilidade. Devolução simples do valor indevidamente pago. Aplicação dos arts. 964 e 965 do CC/16. Alegação de mora do credor. Inexistência. Juros moratórios contratuais. Data de início da incidência dos juros moratórios. Multa em face do alegado caráter protelatório dos embargos de declaração. Necessidade de fundamentação.

- De acordo com o decidido no CC nº 64.524/MT, 2ª Seção, de minha relatoria, DJ de 09.10.2006, só há relação de consumo quando ocorre destinação final do produto ou serviço, e não na hipótese em que estes são alocados na prática de outra atividade produtiva. Ressalva pessoal.

- Seja qual for o entendimento a respeito da existência ou não de relação de consumo, na presente hipótese, o próprio Tribunal de Justiça reconheceu a inocorrência de cobrança extrajudicial indevida, o que afasta a incidência do art. 42, par. ún., do CDC.

- Vencida a base jurídica do acórdão recorrido, cabe ao STJ aplicar o direito à espécie, porque não há como limitar as funções deste Tribunal aos termos de um modelo restritivo de prestação jurisdicional que seria aplicável, tão-somente, a uma eventual Corte de Cassação. Aplicação do art. 257 do RISTJ e da Súmula nº 456 do STF.

- Não é cabível a aplicação do art. 1.531 do CC/16, atual art. 940 do CC/02, porque aquele exige a cobrança injustificada por meio de 'demanda', ou seja, por ação judicial, além da ocorrência de má-fé do pretenso credor.

- Como ambas as circunstâncias estão ausentes na presente hipótese, autoriza-se, apenas, a restituição simples do pagamento indevido, com fundamento nos arts. 964 e 965 do CC/16.

- Não é possível o reexame de fatos e provas em recurso especial.

- Não se conhece de recurso especial na parte em que este se encontra deficientemente fundamentado.

- O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico de acórdãos que versem sobre situações fáticas similares.

- Afasta-se a incidência da multa do art. 538, par. único, do CPC, quando o Tribunal de Justiça não fundamenta adequadamente seu cabimento à hipótese.

Recurso especial parcialmente conhecido e provido.

(REsp 872.666/AL, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/12/2006, DJ 05/02/2007, p. 235)

7. Ante o exposto, conheço parcialmente do recurso especial e dou-lhe parcial provimento para determinar a repetição simples dos valores indevidamente pagos à Universidade recorrida, montante a ser apurado por mero cálculo aritmético.

Inversão dos ônus da sucumbência e honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação.

É como voto.

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